«Embuste» proposto pelo Governo ajuda patrões e trava salários
NEGOCIAÇÃO No próprio nome do aventado acordo há «uma mudança de perspectiva» relativamente ao Programa do Governo, afirma a CGTP-IN, sobre o documento apresentado na Concertação Social.
Serão atingidos em 2019 os 3,2 por cento preconizados para 2023
A CGTP-IN divulgou na segunda-feira, dia 2, a sua posição sobre o texto entregue pelo Governo no dia 27, na reunião da CPCS (Comissão Permanente da Concertação Social) e que visa fixar o enquadramento, os princípios orientadores da negociação e as áreas de intervenção para um «Acordo de médio prazo sobre competitividade e rendimentos».
O documento, observa a confederação, é «muito genérico e abstracto, em todas as áreas que respeitam aos interesses dos trabalhadores, e bastante mais detalhado, objectivo e concreto, na resposta às reivindicações das organizações patronais», as quais ficam «integralmente reflectidas» na proposta do Governo.
Logo na designação, a CGTP-IN verifica «uma mudança de perspectiva, uma vez que o que está inscrito no Programa do Governo é um acordo de médio prazo sobre salários e rendimentos, o que é bastante diferente de um acordo sobre competitividade e rendimentos».
«O que está verdadeiramente em marcha», protesta a Intersindical Nacional é, «a pretexto da promoção da competitividade, a concessão de um amplo leque de benesses às empresas, que funcionarão como contrapartidas para uma moderada evolução dos salários».
Já relativamente aos rendimentos, «o que temos é a pretensão de fixar um referencial para a actualização dos salários, que funcionará como uma espécie de tecto».
Assim, «depois da cartelização dos preços dos serviços, para pôr os portugueses a pagar mais, temos agora a cartelização dos salários, para pôr os patrões a pagar menos».
A evolução dos salários deve ser «o núcleo de qualquer acordo de rendimentos de médio prazo, conforme aliás o Governo assumiu no seu Programa». Ora, no documento do Governo, defende-se aumentos salariais nominais de 2,7 por cento, em 2020, de 2,9 por cento, em 2021, de 2,9 por cento, em 2022, e de 3,2 por cento, em 2023. Nestes valores são contabilizados o índice de inflação e os ganhos de produtividade.
Para a CGTP-IN, «fica claro que há uma proposta de contenção salarial orientadora para a contratação colectiva», pois «o próprio documento não deixa de reconhecer que as previsões actualmente disponíveis já apontam para aumentos salariais ligeiramente superiores».
Segundo as remunerações médias mensais declaradas à Segurança Social e à Caixa Geral de Aposentações, o aumento de 3,2 por cento poderá ser atingido já em 2019. Idêntico valor é apontado pela Comissão Europeia no documento de trabalho sobre o esboço do Orçamento do Estado para 2020.
Nas estimativas de crescimento do PIB (Produto Interno Bruto) e da massa salarial, com base nestes dados, o peso dos salários em 2023 não chegaria a 45 por cento, muito abaixo do valor de 2010 (47,2 por cento).
A Inter nota que «no período de 1999 a 2019, a produtividade aumentou 17 por cento, enquanto os salários reais cresceram apenas 3 por cento».
O essencial não consta
«Este projectado Acordo de Competitividade e Rendimentos, tal como aqui apresentado, constitui um embuste», afirma a CGTP-IN.
O Governo «parte de uma base incompleta, na medida em que recusa abordar questões fundamentais quer para a discussão de acordos salariais, quer para a própria existência de diálogo social, como sejam a liberdade sindical, a dinamização da contratação colectiva, a estabilidade e segurança do emprego e o inerente combate à precariedade dos vínculos laborais».
«Sem a plena afirmação e concretização destes princípios fundamentais – liberdade sindical, direito de contratação de colectiva e segurança no emprego –, não há possibilidade real de firmar, aplicar e monitorizar quaisquer acordos, nomeadamente em matéria salarial», salienta a Inter.