Catalunha

Albano Nunes

A questão ca­talã tem pro­fundas raízes his­tó­ricas que a re­pressão só pode agravar

Nem com­pete ao PCP nem o PCP tem a pre­tensão de­saber quais os con­cretos ca­mi­nhos a se­guir para re­solver o pro­blema na­ci­onal da Ca­ta­lunha. Mas há prin­cí­pios e va­lores que o PCP sempre afirma com cla­reza sejam quais forem as si­tu­a­ções e por maior ala­rido an­ti­co­mu­nista que possam sus­citar. Foi o que acon­teceu com a po­sição to­mada pelo Par­tido no pas­sado dia 15 a pro­pó­sito da con­de­nação a prisão de di­ri­gentes po­lí­ticos e so­ciais ca­ta­lães em que, de­nun­ci­ando a ju­di­ci­a­li­zação de uma questão emi­nen­te­mente po­lí­tica e de­fen­dendo a sua li­ber­tação, uma vez mais lem­brou que a questão ca­talã é uma questão na­ci­onal com pro­fundas raízes his­tó­ricas que a re­pressão só pode com­plicar e agravar ainda mais.

As ma­ni­fes­ta­ções po­pu­lares que ti­veram o seu ponto alto em Bar­ce­lona na pas­sada sexta-feira ex­primem a pro­fun­di­dade de sen­ti­mentos na­ci­o­nais que não podem con­ti­nuar a ser ne­gados em nome de uma Cons­ti­tuição e de um or­de­na­mento ju­rí­dico que, ao con­trário do corte com o fas­cismo que a Cons­ti­tuição por­tu­guesa saída de uma re­vo­lução sig­ni­ficou, foi pro­duto de uma «tran­sição pac­tuada» com o fran­quismo. Cons­ti­tuem si­mul­ta­ne­a­mente uma ex­plosão de in­dig­nação pelas con­de­na­ções po­lí­ticas e pela res­posta au­to­ri­tária do go­verno do PSOE fa­zendo suas po­si­ções e dores da di­reita «es­pa­nho­lista».

A so­li­da­ri­e­dade do PCP com a causa na­ci­onal do povo ca­talão, in­de­pen­den­te­mente da con­fi­gu­ração con­creta que venha a ad­quirir a sua ar­qui­tec­tura ins­ti­tu­ci­onal, é uma po­sição de prin­cípio. E é por isso mesmo que não acom­pa­nhamos po­si­ções que, ju­rando de­sin­te­res­sada so­li­da­ri­e­dade, cons­ti­tuem afinal apro­vei­ta­mento para me­di­a­ti­za­ções opor­tu­nistas. Nem fe­chamos os olhos a ac­ções ditas «ra­di­cais» e «ex­tre­mistas», em geral in­fil­tradas pelas po­lí­cias, que visam apagar e de­sa­cre­ditar a luta de massas, dar pre­textos à re­pressão e que ali­mentam a ex­trema-di­reita e o fas­cismo.

Além do mais não se ig­nora que sob a ban­deira do «in­de­pen­den­tismo ca­talão» existem cor­rentes po­lí­ticas di­versas e di­fe­rentes po­si­ções de classe. O mo­vi­mento ope­rário ca­talão tem uma his­tória com­plexa mas com­ba­tiva e fir­me­mente an­ti­fas­cista em que os co­mu­nistas ocu­param um lugar hon­roso. Mas é também bem co­nhe­cida a tra­di­ci­onal in­fluência da grande bur­guesia ca­talã, de que foi ex­po­ente no­tório Jordi Pujol e a sua Con­ver­gência De­mo­crá­tica da Ca­ta­lunha, e a ca­pa­ci­dade de­mons­trada na ins­tru­men­ta­li­zação dos sen­ti­mentos na­ci­o­nais do povo da Ca­ta­lunha para ali­mentar o seu poder, pros­se­guir po­lí­ticas an­ti­po­pu­lares e for­ta­lecer o seu papel no Es­tado es­pa­nhol e na União Eu­ro­peia. UE de que a di­reita ca­talã têm sido acér­rima par­ti­dária, não obs­tante tratar-se de uma en­ti­dade su­pra­na­ci­onal que pa­ra­do­xal­mente (ou talvez não) é con­trária à so­be­rania dos povos.

A Es­panha vai ser cha­mada a novas elei­ções em 10 de No­vembro. O pe­rigo de os acon­te­ci­mentos na Ca­ta­lunha serem ins­tru­men­ta­li­zados para re­forçar a pior re­acção

é uma re­a­li­dade. Em qual­quer caso a ex­trema-di­reita só pode ser efi­caz­mente com­ba­tida com mé­todos de­mo­crá­ticos e no res­peito pelos di­reitos das na­ções que in­te­gram o Es­tado es­pa­nhol.

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Cor­recção: Esta co­luna apa­receu na se­mana pas­sada as­si­nada por Ale­xandre Alves, quando a au­toria do mesmo é de Ângelo Alves. Ao vi­sado e aos lei­tores as nossas des­culpas.




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