Duas horas depois

Vasco Cardoso

Sabemos de antemão que o escrutínio que é feito a uns nem sempre se aplica a outros. Há os que podem dizer tudo e o seu contrário, fazer uma coisa lá e outra cá, sem que ninguém – diga-se os principais órgãos de comunicação social – procure destapar o embuste. Foi isso que ainda recentemente aconteceu (5 de Julho) com o PSD. Duas horas depois de rejeitar na Assembleia da República uma proposta vinda da Assembleia Legislativa Regional da Madeira para a redução do IVA sobre a electricidade de 23% para 6%, Rui Rio apresentou-se perante as televisões a propor, nem mais nem menos, do que a mesma redução do IVA que duas horas antes tinha, juntamente com o PS e o PSD, chumbado no Parlamento.

Esta atitude diz muito do tipo de credibilidade das promessas que abundam por esta altura em vésperas de eleições. Aquilo que aliás se vai conhecendo do programa eleitoral do PSD é bem prova disso. «Baixar» impostos, diga-se, reduzir impostos ao grande capital, reduzir a dívida, aumentar muito o investimento público e uma projecção de crescimento económico para os próximos anos, muito acima daquilo que nunca se verificou desde a submissão de Portugal ao Euro. Ah, se a trafulhice pagasse imposto?!

Do lado do PS, aquilo que se vai conhecendo, não andará muito longe daquelas promessas que o vento costuma levar. As ditas contas certas pressupõem a mesma submissão ao défice e mãos largas para o capital que tem, nestes dois partidos (sem esquecer o CDS), o seu escudo protector face a uma justa tributação fiscal, a rejeição das PPP’s ou a necessidade de recuperar para o Estado empresas e sectores estratégicos. Não se questionam os muitos milhões de euros de recursos públicos para os juros da dívida, os generosos benefícios fiscais ou os apoios para encobrir a corrupção na banca privada. E com isto prometem emprego, serviços públicos, crescimento económico, etc. A tal quadratura do círculo que assegura serem possíveis resultados diferentes mantendo a receita do costume. Mas como as coisas estão, duas horas depois, já ninguém se lembra, nem que se tenha que entreter as massas com um qualquer assunto de ocasião.

 



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