Dois carrinhos?
Nas jornadas parlamentares do PS Carlos César disse o que lhe vai na alma. Está cansado dos «bloqueios», «constantes dificuldades» e «inércias» com que a actual solução de governo atrapalha o seu partido. Não se queixa do mesmo de cada vez que se entende com o PSD. E esse discurso oriundo do PS da direita teve também o mérito de ressuscitar a já mítica «ala esquerda do PS».
Uma das vantagens da vida política portuguesa é praticamente todos os intervenientes serem conhecidos de ginjeira. Sabe-se portanto o que é o PS e o respectivo currículo de muitas décadas, no qual os últimos quatro anos introduziram alguns elementos contraditórios. Não serão muitos, mas têm a vantagem de ir em sentido contrário àquilo que sempre fez.
Em contrapartida terão dado ao PS o que considerará um precioso trunfo: julga que lavou a cara «de esquerda». E para o PS de sempre, tomando como adquirida essa lavagem, do que se trata agora é de ocupar espaço à direita, trazer para primeiro plano o discurso e o posicionamento político e ideológico do PS partido central da política de direita. O objectivo de maioria absoluta com que o presidente da CIP há mais de um ano simpatiza: «O governo e o PS […] tem condições para melhorar. Não sei se obtendo a maioria absoluta ou ficando perto dela. Se assim for, liberta-se ou de um ou de dois pesos. Talvez o país ganhe com isso» (v. Agostinho Lopes, https://jornaleconomico.sapo.pt/noticias/a-maioria-absoluta-da-cip-378160).
Algumas das personalidades de que se fala a propósito da «ala esquerda» do PS merecem respeito. Mas o principal papel dessa ala tem sido o de cortina de fumo sobre cada nova viragem à direita. Pode o PS querer jogar a dois carrinhos. Muito dificilmente o conseguirá.