Incorrigíveis
Assunção Cristas, esperançada de que à força de sabonária mediática se há-de branquear as nódoas que o CDS carrega dos anos em que governou, deixou em demorada entrevista a um canal de televisão essa ameaçadora perspectiva de um regresso ao poder. Porque o espaço não consente e o conteúdo a comentar não justifica, registemos apenas duas afirmações que apesar da eloquência a que arriba não cobrem a nudez de fraqueza argumentativa que encerram.
Disse Cristas que «se o centro-direita tiver 116 deputados somos nós que governamos». Condescenda-se: o alcance da asserção é demolidor. Não tanto pela dimensão óbvia da tese exposta, desde logo decorrente do que aritmeticamente se pode concluir pela simples divisão a meio do número de deputados – 230 – e do cardinal necessário e suficiente para, somado àquela metade, redundar em maioria absoluta. Indescortinável, essa sim, é a percepção do que designa por «centro-direita». Lendo a definição do seu líder parlamentar de que «o CDS é um partido de centro-direita que não tem medo de se dizer de direita, mas que se assume como democrata cristão com inspiração de correntes liberais e conservadoras», grassará alguma confusão quanto ao lugar político da coisa. Talvez o Congresso, entre o lavar, enxaguar e pôr a corar, tenha ajudado nessa obra de monta de encontrar o Norte.
Notável é a descoberta de Cristas segundo a qual «a prática constitucional mudou em 2015». Entusiasmada com esse embuste de candidatos a primeiro-ministro e inconformada que estará com a Constituição (em coerência com a originária oposição do seu partido à Lei fundamental), não terá tido tempo para a abrir e ver o que ela prescreve na relação entre composição da Assembleia da República e formação do governo. Desatenções incorrigíveis.