A luta de classes continua a ser o motor da História

ORGANIZAÇÃO SOCIAL As classes sociais, a luta de classes e as alianças sociais e políticas nas várias fases e etapas da luta pela transformação social foram temas em destaque na tarde de sábado.

A centralidade da luta de classes é evidente na actualidade

Não é possível falar de Marx (e Engels) sem referir questões maiores da sua elaboração teórica como são as classes e a luta de classes. Se é certo que os fundadores do socialismo científico não descobriram umas nem outra, foram eles quem desvendou o seu papel decisivo na evolução da sociedade, realçado no primeiro capítulo do Manifesto do Partido Comunista: «A história de toda a sociedade até hoje é a história de lutas de classes.»

Das classes falou Graciete Cruz, do Comité Central, que foi ao Manifesto para sublinhar aquelas que Marx e Engels identificaram como sendo as duas fundamentais, em confronto: a burguesia e o proletariado. Mais tarde, Engels precisaria: «Por burguesia entende-se a classe dos capitalistas modernos, proprietários dos meios de produção social e empregadores de trabalho assalariado. Por proletariado, a classe dos trabalhadores assalariados modernos, os quais, não tendo meios próprios de produção, estão reduzidos a vender a sua força de trabalho para poderem viver.»

Hoje o proletariado e a burguesia não são exactamente os mesmos da época em que foi escrito o Manifesto do Partido Comunista, mas a «essência das relações de produção capitalistas, a que é inerente a exploração do trabalho assalariado», não se alterou. Para o PCP, prosseguiu, a actual estrutura de classes da sociedade portuguesa é composta por duas classes – as mesmas identificadas por Marx e Engels – e «dois grupos intermédios, as camadas intermédias assalariadas e as camadas intermédias não assalariadas». Mantêm-se actuais o «carácter essencial da luta de classes na transformação revolucionária da sociedade» e o «sistema das alianças básicas da classe operária».

Luta e alianças

João Frazão, da Comissão Política, debruçou-se sobre a luta de classes (tema já aflorado pela oradora que o antecedeu), começando por destacar que «no combate pela transformação revolucionária da sociedade, a luta reivindicativa – nas suas componentes económica, social e política – determinou sempre os desenvolvimentos e os andamentos dessa transformação, o que ainda continua a acontecer». É, pois, a questão concreta, o problema específico, que se torna em primeiro lugar no «elemento mobilizador da intervenção, da acção e do protesto dos trabalhadores».

Esta luta por objectivos concretos e imediatos, realçou João Frazão, é fundamental para que os trabalhadores ganhem consciência política e de classe, ganhando as reivindicações económicas tradicionais um crescente significado político. É nesta luta, portanto, que os trabalhadores compreendem que, no capitalismo, «os governos mais não são, regra geral, do que conselhos de administração dos interesses da burguesia, que tudo faz para assegurar a perpetuação no poder dos seus representantes».

O membro da Comissão Política realçou ainda a actualidade da tese de Marx e Engels, segundo a qual a classe operária, libertando-se, liberta toda a sociedade. Mas para tal necessita de ganhar para o seu lado todas as classes e camadas objectivamente interessadas na revolução.

Ofensiva e resistência

O constante revolucionamento científico e técnico da produção e os ataques do capital ao movimento sindical de classe e revolucionário, duas vertentes que marcam a actual fase da luta de classes, estiveram também em destaque na conferência.

No primeiro caso, João Ferreira, do Comité Central e deputado do PCP no Parlamento Europeu chamou a atenção para uma contradição: se, por um lado, a introdução permanente de novas tecnologias visa, em cada uma das empresas, o aumento da produtividade e o abaixamento de custos e preços, por outro, a sua generalização tende a «baixar a lucratividade» de todas elas. A solução passa, então, pelo aumento da exploração por via da elevação dos ritmos de trabalho e do prolongamento dos horários: em consequência, «diminui a parte da jornada de trabalho em que os operários produzem o equivalente aos seus salários e aumenta a parte em que produzem o excedente (a mais-valia) que fica com o patronato»; ou seja, «aumenta o grau de exploração».

Só na sociedade socialista, garantiu João Ferreira, «não há limite para o aproveitamento das potencialidades da ciência e da técnica». As descobertas científicas e aplicações tecnológicas não serão mais instrumentos de exploração, mas de emancipação humana.

Da segunda questão falou Paulo Raimundo, do Secretariado, realçando que a «burguesia não menospreza Marx, apesar de procurar passar a ideia de que o desvaloriza». Pelo contrário, «estuda-o em pormenor e procura identificar as formas mais eficazes de lhe dar combate». Uma delas é procurar «impedir a unidade entre o conjunto dos trabalhadores, estimular a concorrência entre eles, quebrar os laços de solidariedade, em suma, dividir para reinar».

Sendo o número um dos grandes trunfos dos trabalhadores, o próprio Marx afirmou em tempos que este factor «só pesa na balança se unido pela combinação e guiado pelo saber». Assim se compreende que a imposição de obstáculo à acção do movimento sindical de classe e a promoção de um sindicalismo colaborante sejam traços da ofensiva do capital a que urge dar combate. 


Ambiente e igualdade

são questões do nosso tempo

Vladimiro Vale, da Comissão Política, começou por citar algumas das referências de Marx e Engels a questões ambientais, relacionadas com o esgotamento dos solos, a poluição atmosférica e o aumento súbito da população urbana, bem como as suas consequências na saúde dos operários, Vladimiro Vale acusou o sistema de produção capitalista de ser responsável tanto pela exploração do trabalho como pela exploração da natureza.

Mantendo-se o objectivo estratégico de transformação da sociedade, é também necessário lutar no imediato pela defesa do ambiente, que passa pela «exigência de reforço dos meios do Estado para desenvolver uma verdadeira política de defesa do equilíbrio da natureza» e pela propriedade e responsabilidade públicas em matérias como a água, a energia, os recursos ou a biodiversidade.

Sobre as mulheres e a sua luta emancipadora, Fernanda Mateus, também ela da Comissão Política, lembrou as palavras de Marx: «só o proletariado é a classe revolucionária que fundando a ordem social socialista está em condições de criar as premissas sociais indispensáveis para a completa solução do problema feminino». A luta organizada das mulheres centra-se, hoje, em dois vectores convergentes: «os problemas da mulher enquanto problema comum a todos os que estão submetidos à dominação do grande capital que deve unir a luta de todos e os problemas específicos das mulheres que exigem igualmente a sua organização e luta específica.»

Realçando a forte ofensiva ideológica em curso relativamente a estas questões, Fernanda Mateus recolocou a questão central na natureza de classe do poder e não no género de quem o exerce. O PCP não subestima a importância da alteração das mentalidades, mas confere-lhe um «conteúdo de classe bem preciso», concluiu.

 



Mais artigos de: Em Foco

Interpretar o mundo para melhor o transformar

MARXISMO-LENINISMO A conferência do PCP comemorativa do II centenário do nascimento de Karl Marx, realizada no sábado e domingo no salão da Voz do Operário, em Lisboa, constituiu um momento alto de reflexão sobre o mundo contemporâneo e os caminhos para a sua transformação.

Agir e intervir sobre o real

Intervindo antes do encerramento, José Barata-Moura fez uma viagem por diversas expressões do «utopismo» – de Thomas More a Charles Fourier, Robert Owen ou Saint-Simon –, desembocando no socialismo científico de Marx e Engels. Ao contrário...

Exposição destaca importância e actualidade de Karl Marx

No patamar do andar inferior àquele em que decorria a conferência esteve patente durante os dois dias uma exposição evocativa do II centenário do nascimento de Karl Marx, composta por 15 painéis. Várias cópias circularão pelo País, suportando...

Difusor do Marxismo

A divulgação, em Portugal, do pensamento de Marx e Engels deve muito à Editorial Avante!. Como se podia verificar na banca instalada junto às portas de entrada do salão onde se realizava a conferência, são imensos os títulos de Marx e Engels (e também de...