Contradições?

Ângelo Alves

Trump não está preocupado com os iranianos ou os seus direitos

Os recentes desenvolvimentos da situação internacional são muito elucidativos da sua volatilidade e complexidade. As principais potências ou blocos imperialistas (EUA; Japão e União Europeia) prosseguem as linhas de ameaça, agressão, ingerência, pressão e chantagem que conduzem o Mundo a uma desestabilização crescente. Tais tendências desenvolvem-se num quadro de imensas contradições e são elas próprias geradoras de outras contradições numa cada vez mais complexa situação internacional.

Os mais recentes desenvolvimentos na Península coreana expressam exactamente essa volatilidade e contradições. Num quadro em que os EUA apostaram em elevar ao máximo a tensão, ameaçando com «fogo e fúria» a República Popular Democrática da Coreia, a viragem do ano é marcada pela decisão das duas Coreias de darem sinais mútuos de diálogo e de encetarem conversações directas bilaterais. Os exercícios militares EUA/Coreia do Sul são adiados e a inefável Nikki Haley1 faz uma declaração, zangada, tentando desvalorizar os passos positivos e mantendo todas as ameaças sobre a RPDC. Veremos como a situação evolui, mas caso esta distensão entre as Coreias surta efeitos, essa será mais uma derrota diplomática dos EUA e uma vitória de outros países que fora da ribalta têm trabalhado para diminuir a tensão na região.

Já os desenvolvimentos no Irão dão-nos uma outra visão da volatilidade e contradições da situação. Tudo indica que os protestos populares radicam numa situação social marcada por grandes desigualdades e alto desemprego, nomeadamente entre os jovens, onde atinge a taxa de 24%. É significativo que os protestos irrompam nos sectores mais pobres da sociedade, e também entre trabalhadores organizados, ou seja, surgem daqueles que estão a ser mais fustigados com as consequências de políticas de liberalização económica e das sanções impostas pelo imperialismo ao Irão.

É também significativo que surjam no momento em que é conhecido um novo Orçamento da República Islâmica que, perante as ameaças dos EUA de rompimento do Acordo Nuclear, aponta para novos e consideráveis aumentos de preços, nomeadamente no gás e bens essenciais. Não é de espantar que, nestas condições, e num País com tradições enraizadas do movimento operário e que viveu há cerca de 40 anos uma revolução popular, democrática e progressista, se desenvolvam movimentos de contestação social. Tal como não é propriamente inédita a reacção das autoridades iranianas, num país em que a Revolução de 1979 foi capturada por um regime teocrático onde o histórico Partido Tudeh do Irão, comunista, continua ilegalizado até aos dias de hoje.

Mas porque apoia Trump os manifestantes? Porque forçou uma reunião do Conselho de Segurança? A resposta está na já velhinha estratégia das Primaveras árabes: instrumentalizar problemas reais, ou criados pelo próprio imperialismo, para tentar operações de ingerência e de «mudança de regime» como na Líbia ou na Síria. Trump não está preocupado com os iranianos ou os seus direitos. Está preocupado em asfixiar aquele povo para poder neutralizar o Irão e a sua oposição aos planos imperialistas no Médio Oriente. O PCP está solidário com o povo iraniano na luta pelos seus direitos e condições de vida, e é exactamente por isso que denuncia as renovadas tentativas de ingerência dos EUA e defende o respeito pela soberania e independência daquele País.

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1 Embaixadora dos EUA na ONU




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