A cultura da mercantilização

Vasco Cardoso

A recente realização de um jantar que juntou a nata desse «evento» a que chamam de Web Summit no Panteão Nacional é só mais um exemplo da política que ao longo de anos tem atirado os monumentos e o património nacional, ou para o abandono, ou para a mais abjecta mercantilização. Esta tétrica iniciativa é apenas, e só, uma consequência das alterações que foram sendo desenhadas ao longo dos anos na política cultural do País em que assistimos à degradação do edificado, à gritante falta de trabalhadores, à venda ou cedência imóveis e outros bens, ao empobrecimento dos profissionais da cultura, ao agravamento dos preços e elitização do acesso a monumentos ou espectáculos.

Nas últimas décadas a política de direita não poupou nenhum sector. Tal como as florestas que arderam com o rasto de destruição e morte que se conhece, tal como nas infra-estruturas públicas de saúde que se foram degradando facilitando o aparecimento de surtos bacteriológicos como o da Legionella, também a cultura não deixou de sentir as brutais consequências de opções que reduziram substancialmente o número de trabalhadores e os níveis de investimento no sector. A mercantilização deste património, sobretudo daquele que é mais apetecível para os interesses do grande capital foi, e é, a consequência lógica deste percurso. E se é verdade que algumas das mais perversas malfeitorias foram sendo travadas pela luta e pela acção decisiva do PCP – onde estaria hoje a fortaleza de Peniche, a colecção Miró, ou a gratuitidade do acesso aos museus ao domingo só para citar alguns exemplos?! – também não podemos esquecer que o governo minoritário do PS não interrompeu, nem inverteu, as opções que estiveram na origem deste triste episódio.

Cuidar do património nacional requer muito mais do que aquilo que tem sido feito. Exige desde logo a mobilização de meios – financeiros e humanos – para a preservação e valorização da nossa memória histórica, não apenas para receber a visita dos muitos turistas que escolhem Portugal, mas também para possibilitar o acesso e fruição democrática por parte do nosso povo.

 



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