Gleisi Hoffmann, presidente do Partido dos Trabalhadores do Brasil

“Para a elite brasileira o povo é um detalhe”

Quais os objectivos da condenação do ex-presidente e recandidato Lula da Silva, visto que o Partido dos Trabalhadores tem denunciado o processo judicial movido contra ele como parte da consolidação do golpe de Estado no Brasil?

O golpe no Brasil teve como primeiro objectivo acabar com o governo progressista liderado por Dilma Rousseff. Para que se consolide é necessário afastar o PT, e em particular Lula da Silva, como alternativa.

Os governos liderados por Lula da Silva foram e são reconhecidos pela maioria dos brasileiros como dos mais avançados em termos sociais. Tanto assim é que o Lula surge à frente de todas as pesquisas de opinião e intenção de voto.

O sistema judicial está a ser utilizado para impedir que Lula chegue sequer a candidatar-se, quando, na verdade, foi condenado sem qualquer prova factual.

Essa manipulação da Justiça já tinha sucedido na destituição da presidente Dilma Rousseff...

Os casos de Dilma e Lula violam os mais básicos pressupostos do Direito. Realizar presidenciais sem Lula da Silva representa uma fraude.

Ao tentarem travar qualquer possibilidade de vitória de um projecto progressista, os golpistas e os interesses que representam visam recolocar o país no lugar que ocupava antes do primeiro governo liderado por Lula da Silva. E eventualmente até recuar mais, algo que começa a ser claro, por exemplo, através do desmantelamento da Constituição de 1988, na qual os cidadãos viram reconhecidos na lei direitos mínimos; ou através da ofensiva a parcelas da legislação laboral que vêm da década de 40 do século XX.

Os golpistas assumiram o poder em nome da elite brasileira, para quem o povo é um detalhe. A prová-lo está a limitação, por 20 anos, do investimento público e dos gastos na Saúde e Educação, o ataque ao sistema de previdência, as privatizações ou a abertura da Amazónia à exploração mineira.

Antes durante e depois do golpe de Estado no Brasil assistimos a grandes movimentações de massas e ao surgimento de frentes unitárias de luta. É por aqui que continua a passar a defesa da democracia e do progresso no Brasil?

Organizações unitárias como as que referes são embriões importantes num projecto alternativo. O processo do golpe e a luta contra este ensinou-nos muito, designadamente quanto à necessidade de implementar reformas estruturais mais profundas. Na área da comunicação, mais concretamente na conquista da pluralidade, ou na organização do Estado, só para citar dois casos.

E a questão da terra?

Continua a ser um grande desafio. Nos governos liderados por Lula e por Dilma ocorreram o maior número de expropriações e assentamentos de trabalhadores sem-terra. Não foi possível avançar mais porque a legislação em vigor protege os latifúndios improdutivos. Temos de assegurar condições para a alterar, para prosseguir com a Reforma Agrária.

Esses aspectos que refere são já bandeiras de um programa de governo da esquerda?

O PT está a trabalhar não apenas num programa para 2018, mas, sobretudo, num projecto alternativo para o Brasil. Uma coisa é certa: a proposta será seguramente mais radical do que aquela que tínhamos até agora.

 



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