Apague-se o rasto
«O Estado falhou!», gritam eles. Gritam os que clamaram pelos cortes na despesa pública. Os que diziam que havia funcionários públicos a mais. Os que defenderam as parcerias público privadas. Os que abriram garrafas de champanhe por cada privatização. Os que chamaram a troika. Os que se embebedaram com a União Europeia e o euro. Os que têm ódio à Constituição de Abril.
É um «grito» para o microfone, para o ecrã, para a primeira página do jornal. Um «grito» que se propaga à velocidade de um incêndio e com o estrondo de uma granada. Um «grito» que sai da boca de Passos e Cristas e se multiplica por comentadores, analistas, economistas todos eles muito sabedores e independentes.
Querem limpar as mãos à parede. Querem apagar as marcas da governação recente, mas sobretudo apagar o rasto de décadas de política de direita em que o Estado e os recursos públicos foram estando cada vez mais ao serviço dos interesses dos grupos monopolistas e cada vez menos orientados para servir o povo e o País. Querem fazer crer que anos e anos de ataque às funções do Estado, aos direitos dos trabalhadores, à soberania nacional, nada têm a ver com tragédias recentes e futuras. É tudo e só uma questão de competência, de responsabilidade individual deste ou daquele. Querem esconder as verdadeiras causas e absolver os verdadeiros responsáveis. Colocar no banco dos réus a política de direita e os partidos que a promovem colocaria em causa os superiores interesses do capital. Por isso alguém dirá: somos todos culpados! Talvez a culpa morra solteira. Até porque o silenciamento dos que sempre denunciaram e combateram este rumo, e tantas foram as vezes, é certo. Metendo tudo no mesmo saco é sempre mais fácil pois «os políticos são todos iguais!», ou não!?
E que muito se grite e se fale, para que no meio da confusão e dos directos, por entre pedidos de demissão e de comissões independentes, explorando genuínos sentimentos de perplexidade e revolta, tudo se faça para que tudo fique na mesma.