Direito a desligar

João Frazão

A notícia caiu como uma bomba. Fora descoberta a pólvora da defesa dos direitos dos trabalhadores. Em França, o governo do Partido Socialista Francês, que será lembrado como o que afrontou os direitos dos trabalhadores e, particularmente dos mais jovens, aquele que suscitou a mobilização de milhões de trabalhadores contra as alterações à legislação laboral para desregular o mercado de trabalho, colocando nas mãos do patronato a faca e o queijo das relações com os trabalhadores, o governo de Hollande desencantou uma iniciativa legislativa que desobriga os trabalhadores de atenderem o telemóvel e de lerem os e-mails emanados da entidade patronal durante a noite, o chamado direito a desligar.

Em Portugal, os do costume, apressaram-se a anunciar que avançariam também com iniciativas nesse sentido.

«Boa ideia», pensarão os mais incautos, multiplicando-se em publicações e gostos no facebook e comentários «tu já viste que boa ideia, já era tempo de alguém se lembrar disto», e outros do género.

Ainda que, apesar do estrondo com que apareceu, dois dias tenham bastado para que se deixasse de falar disso, nós não queremos deixar passar o assunto, até porque, na rádio pública, numa rubrica diária, eminente fazedor de opinião decidiu fazer o louvor da iniciativa citando até o exemplo de uma empresa francesa que já determinou que entre as 21h e as 7h estão os seus trabalhadores dispensados de dar atenção ao correio electrónico e ao aparelho móvel de telefone, num acto de auto-regulação que foi saudado efusivamente.

Com este exemplo fico dispensado de explicar mais. Então não se está mesmo a ver que aqueles que pela lei portuguesa têm hoje um horário de 8h diárias (em França são 7h), passariam, de uma penada, a ter um horário de 14h ao serviço do patrão? É que se entre as 21h e as 7h os trabalhadores estão dispensados de responder ao chefe, tal significa que entre as 7h e as 21h não estariam dispensados.

Não se precipitem os que apenas têm como objectivo aparecer na primeira página do jornal ou a abrir o Telejornal da noite. O que é preciso é que se cumpra a lei que consagra a jornada de 8 horas, enquanto não conseguirmos a jornada de 7h por que lutamos. Tudo o resto faz parte da luta de classes!




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