Barrosadas II
Em Maio passado, Durão Barroso ocupou este espaço por causa de uma trafulhice com a «cimeira das Lages» em 2003, que decidiu a guerra contra o Iraque e que o ex-primeiro-ministro de então, no papel de mordomo deste encontro imperial, insistia que para a realização de tal cimeira havia obtido o apoio do então Presidente da República, Jorge Sampaio, coisa que o próprio desmentiu formalmente.
Hoje, Barroso volta à ribalta por más e piores razões: saindo do cargo de presidente da Comissão Europeia, que exerceu durante 10 anos contínuos, para presidente da empresa financeira norte-americana Goldman Sachs (GS), o homem protagonizou mais um escândalo de amplitude internacional – o que é ligeiramente diferente da «carreira internacional» com que sempre sonhou.
Recordemos que a Goldman Sachs é um das principais responsáveis pela monstruosa bolha financeira mundial que, ao rebentar em pleno no ano de 2008, desencadearia uma crise capitalista que continua a devastar o mundo.
Além disso, a GS foi responsável por «esconder» cerca de cinco mil milhões de euros da dívida externa grega, mergulhando este país (e outros, como Portugal, Irlanda, Espanha ou Itália) no buraco negro das dívidas públicas, enquanto os países «credores do ajustamento», com a Alemanha à cabeça, se locupletavam com as dezenas de milhares de milhões de euros que os PIGS (Portugal, Itália, Grécia e Spain) iam pagando em juros pelos empréstimos.
Barroso teve uma reacção de jardim-escola («eu fiz o que aqueles meninos também fizeram»), denunciando que trilhara os mesmos passos de «congéneres», como o seu próprio substituto na presidência da UE, Jean-Claude Juncker (o decisor que lhe retirou a «passadeira vermelha» de ex-presidente).
Depois, no que julgou um contra-ataque, afirmou que «desminto categoricamente qualquer contacto ou relação especial com qualquer entidade financeira durante o exercício dos meus mandatos na Comissão». E eis que surge uma investigação do Público, onde se demonstra, com acervo de várias provas documentais da própria Comissão, que não só houve relações regulares entre Barroso e os dirigentes de topo da Goldman Sachs durante os seus dois mandatos, com agradecimentos destes últimos por visitas ou convites de Barroso, como estes lhe faziam chegar, «confidencialmente», sugestões de alterações às políticas da União Europeia.
Ou seja: parece que o ex-presidente da UE, Durão Barroso, não se limitou a aceitar a presidência de uma entidade bancária quase proscrita na banca internacional, mas andou a prepará-la nos dez anos em que esteve à frente da União Europeia, incluindo a produzir legislação que, apesar de muito o orgulhar, procurava acomodar as «sugestões confidenciais» dos norte-americanos.
Chamar «barrosada» a isto já parece pouco...