Pena máxima

Henrique Custódio

Cum­prindo o «cir­cuito da carne as­sada», Passos Co­elho es­co­lheu a Fre­guesia de Fer­men­telos para bor­bu­lhar o ra­ci­o­cínio de que «a mul­ti­pli­cação de ci­meiras, de grupos de países dentro da União Eu­ro­peia, não é pro­pri­a­mente um bom sinal».

O homem «re­por­tava-se» (um verbo que, em Passos, serve para tudo) ao en­contro ocor­rido em Atenas entre o pri­meiro-mi­nistro An­tónio Costa e ou­tros altos di­ri­gentes de Grécia, França, Itália e Es­panha (em­bora esta com re­pre­sen­tante de se­gunda linha, a mando do PP).

«Como já tive oca­sião de dizer» acres­centou Passos pela ené­sima oca­sião «não vejo ne­nhum in­te­resse em estar nesta al­tura a cavar uma di­fe­rença entre o que são os países do Sul e os países do Norte, os países do centro, os países fun­da­dores e os países que che­garam de­pois».

E ex­plicou-se, con­cluindo: «Acho que quando se mul­ti­plicam estas ci­meiras e estas reu­niões fica sempre uma ideia de maior de­su­nião, de pul­ve­ri­zação, de seg­men­tação e, por­tanto, de di­visão».

O homem, que ne­ces­sita de quatro vo­cá­bulos para falar de «di­visão», não uti­liza um único para as­si­nalar as múl­ti­plas «ci­meiras» e/​ou «reu­niões» re­a­li­zadas ao longo dos anos pelos «países do Norte», pelos países «do Norte e do centro» – tantas, que deram origem à for­mação de um «Eu­ro­grupo» que, tudo man­dando na UE, por acaso não tem um grama de le­gi­ti­mi­dade de­mo­crá­tica para o fazer.

Disso, Co­elho não deu por nada nem se apo­quentou que a Ale­manha da Sra. Merkel – sua di­vina ins­pi­ração – não es­teja ela pró­pria a «cum­prir os tra­tados», no­me­a­da­mente o que de­ter­mina que os países da UE com su­pe­ravit (lucro nas contas pú­blicas) devem com­par­ti­cipar mais na UE.

A Sra. Merkel não abriu boca sobre o as­sunto, o sr. Schauble, ra­pace nas Fi­nanças alemãs, muito menos e as va­ri­adas reu­niões da UE «a Norte e ao centro» (e sem pe­direm li­cença a Co­elho) têm pas­sado pelo caso como cão por vinha vin­di­mada.

Esta tropa fan­danga, que pas­seia o que julga a in­vul­ne­ra­bi­li­dade do seu poder pelos cor­re­dores de Bru­xelas e C.ª, dis­pensa estas me­suras de Passos Co­elho que, to­davia, não se cansa de ti­tilar vas­sa­la­gens pelos re­cantos de Por­tugal, ainda e sempre avi­da­mente à es­pera que lhe re­tri­buam a fi­de­li­dade às «po­lí­ticas do ajus­ta­mento» com «um aperto» ao Go­verno do PS Costa, que o atire borda fora.

Cego à crise pro­funda que ar­rasta a União Eu­ro­peia para o abismo, in­di­fe­rente à tra­paça que os seus tí­teres «do Norte e do centro» da Eu­ropa cons­piram há anos (em «reu­niões» e «en­con­tros» que nunca in­co­mo­daram Co­elho), para manter toda a UE sob o jugo dos seus di­tames, este homem desce à ver­gonha de clas­si­ficar reu­niões dos países do Sul para de­bater o seu fu­turo como um crime de «di­visão da UE».

Se hou­vesse crimes por des­ca­ra­mento e falta de ver­gonha, Passos Co­elho seria con­de­nado a pena má­xima.

 



Mais artigos de: Opinião

Na Festa, o pulsar do mundo…

A Festa do Avante! cons­ti­tuiu uma va­liosa ma­ni­fes­tação de so­li­da­ri­e­dade anti-im­pe­ri­a­lista. A luta dos tra­ba­lha­dores e do povo por­tu­guês é parte in­te­grante da luta dos tra­ba­lha­dores e dos povos de todo o mundo.

 

Lobistas

Como é sabido, Durão Barroso foi presidente da Comissão Europeia durante 10 anos. Também é do domínio público que mister Durão Barroso, deixada a cadeira da presidência da CE, foi convidado para funções na Goldman Sachs, ao que se sabe, como...

O centro do mundo

Num artigo sugestivamente titulado de «jornalismo panegírico e a economia dos factos» Francisco Louçã reagiu, indignado, a uma jornalista que se atreveu, a propósito da actual solução política, a questionar a entronização habitual com que a...

Sanções e dominação

Merece a pena reflectir sobre o significado da política de sanções na natureza da UE. Uma entidade insuspeita, o Conselho Europeu de Relações Internacionais (European Council on Foreign Relations, ecfr.ue), explicita a questão de forma lapidar: «A arma preferencial da...

O mais importante

Em tempos de grande instabilidade e incerteza, perante a violência da ofensiva exploradora e agressiva do imperialismo e as imensas destruições e dramas humanos que provoca no Médio Oriente, Norte de África e noutros pontos do mundo; perante o avanço do fascismo na Ucrânia...