Jerónimo de Sousa critica ingerências externas e exige

Respeitem a nossa soberania!

Jerónimo de Sousa voltou a repudiar as ingerências das instituições europeias nas opções políticas nacionais, exigindo que respeitem a nossa soberania, e defendeu a necessidade de ser prosseguida a correcção das injustiças geradas pelo governo do PSD e do CDS.

A ingerência sistemática de entidades europeias é afronta inaceitável

LUSA

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«Não acha que é inaceitável esta ingerência desestabilizadora sistemática? Delegou no BCE alguma responsabilidade ou competência do Governo?», inquiriu o Secretário-geral do PCP no debate quinzenal de sexta-feira, 27, dirigindo-se a António Costa, a quem transmitiu a posição clara de quem acha que «é tempo de lhes dizer [às instituições europeias] que se concentrem nas suas tarefas e atribuições e respeitem a nossa soberania».

O líder comunista aludia às declarações de um dos seis membros executivos do BCE que, presente em Lisboa na passada semana, questionou o País acerca de um suposto recuo nas chamadas «reformas estruturais» e resolveu voltar à carga com a questão das 35 horas semanais.

Jerónimo de Sousa deu ainda como exemplo declarações do presidente do BCE no mês passado sugerindo a Portugal a revisão das leis eleitorais e da sua Constituição, «além das sempre eternas reformas estruturais e de mostrar desacordo em relação ao aumento do salário mínimo nacional».

O líder comunista defendeu, por outro lado, a correcção das injustiças criadas pelo anterior governo e a necessidade de se «avançar no caminho do desenvolvimento e da justiça social». E a este propósito, depois de assinalar que na véspera tivera lugar a reposição dos feriados cortados, sustentou que é preciso prosseguir designadamente com a reposição e fixação das 35 horas, «corrigindo também essa injustiça que foi criada pelo governo do PSD/CDS».

Antes, e perante o jorrar de críticas feitas por PSD e CDS até esse momento do debate às opções do actual Governo, Jerónimo de Sousa acusou aqueles partidos de terem um discurso «moralista» quando o que deveriam era pedir desculpa aos portugueses pelo mal que fizeram.

«Ouvir PSD e CDS a fazer balanços críticos, branqueando as suas graves responsabilidades durante quatro anos, pelos quais deveriam ter pedido desculpa aos portugueses, porque levaram centenas de milhares a comer o pão que o diabo amassou... Que venham agora aqui armar-se em moralistas...», deplorou, em jeito de desabafo.

 Duplicidade

 «Uma coisa é o respeito dos tratados outra coisa é admitir que haja uma intromissão política para além dos tratados, em nome de pura opção ideológica», esclareceu, na resposta, o primeiro-ministro.

E depois de lembrar que os «tratados impõem o equilíbrio entre a despesa e a receita mas não nos impõem qualquer regra sobre o conteúdo da despesa e sobre o conteúdo da receita», considerou «chocante» que quem aplaudiu durante quatro anos a política seguida pelo anterior governo e que o «andou a exibir por toda a Europa como um modelo exemplar», fracassada que foi essa estratégia – porque o défice foi de 3,2 por cento e não o pretendido objectivo de 2,7 por cento – «venha agora dizer que afinal não foram tão empenhados como aquilo que deviam ter sido».

Para António Costa esta é uma «duplicidade politicamente inaceitável» e disse «não querer acreditar» que essa posição da União Europeia resulte do facto de «alguém ter prometido» (numa alusão a responsáveis do anterior governo e tendo na memória a promessa por este feita a Bruxelas de que cortaria 600 milhões nas pensões) que «era assim por se tratar de ano de eleições mas que tudo passaria a ser assado depois destas e de forma a compensar os excessos de 2015».

O primeiro-ministro assegurou, entretanto, de forma assertiva, que o programa do Governo «é o programa que iremos executar». «E mesmo quando há dificuldades de execução, trabalharemos para o poder executar», enfatizou, dizendo que é isso que o Executivo está a fazer na questão das 35 horas.

Ponham-se no lugar deles....

Abordados por Jerónimo de Sousa foram também os problemas do sector portuário, em plena agudização por altura deste debate quinzenal. E a propósito deste conflito laboral, agora que se comemora os 40 anos da Constituição, recordou a opção então assumida pelos constituintes quando tiveram de escolher entre os interesses económicos e os interesses e direitos dos trabalhadores.

Acolheram o «tratamento mais favorável ao trabalhador, o apoio à parte mais fragilizada», sublinhou, lembrando que «é isso que está inscrito na nossa Constituição». Pôs assim em evidência a linha de separação que vai entre essa concepção e as preocupações expressas no debate por Passos Coelho, centradas exclusivamente nos «interesses da competitividade, nos interesses económicos», ignorando por completo o mundo laboral.

Não deixando de anotar tal omissão – «repare-se que nunca referiu a palavra trabalhadores», observou –, Jerónimo de Sousa, virando-se para as bancadas do PSD e do CDS, desafiou os seus deputados a porem-se no lugar dos estivadores, hoje sujeitos a propostas de «precariedade absoluta, ao rebaixamento dos salários, sem futuro e sem direitos».

«O que é que os senhores fariam?», interrogou, admitindo ser-lhes difícil porem-se na pele daqueles trabalhadores, já que «defendem outros interesses».

Daí ter inquirido António Costa sobre a disponibilidade do Governo para agir e assumir as suas responsabilidades, promovendo o diálogo entre as partes, com o objectivo da defesa do emprego com direitos, a estabilidade e a segurança da operação portuária e a actividade dos sectores produtivos.

«O Governo está disposto a intervir no sentido do respeito pela legislação laboral, da procura de uma solução política para o conflito, atendendo aos interesses que estão em causa, sem nunca esquecer os direitos dos trabalhadores?», foi a pergunta deixada ao primeiro-ministro.

Por estar nesse preciso momento a decorrer uma reunião que juntou à mesa a ministra do Mar, sindicato dos estivadores e operadores, na resposta, António Costa foi parco em palavras, apenas adiantando o empenho da sua equipa em encontrar uma solução, «a contento das partes e da economia nacional».

Desenvolvimentos ulteriores, designadamente o desfecho daquela reunião longas horas depois, vieram confirmar e dar razão à posição do PCP de que era precisa a pronta intervenção do Governo no processo negocial em curso.

António Costa não deixou, entretanto, referindo-se ainda às «relações laborais», de considerar que este é «ponto fundamental» do programa do Governo, e que este se propõe «agir nesta matéria», designadamente no combate à precariedade, sem o qual «não é possível termos maior qualificação dos recursos humanos» e, consequentemente, «maior produtividade da economia».

Jerónimo de Sousa voltou ao assunto para considerar como princípio «estruturante» o «respeito pelos direitos dos trabalhadores», asseverando que sem respeito «não há desenvolvimento económico e social».

Defender a contratação colectiva

Colocada por Jerónimo de Sousa no centro do debate foi também a questão da contratação colectiva. E o exemplo que trouxe a lume foi o da dura luta dos trabalhadores têxteis em defesa do seu CCT negociado 2012 e contra a pretensão da Associação patronal de impor a sua caducidade, pondo em causa o conjunto dos direitos dos trabalhadores do sector.

«O que querem é retirar o feriado municipal e o feriado de carnaval, que estes trabalhadores sempre gozaram. Mas querem mais. Querem acabar com o direito ao chamado subsídio de amas, uma pequena ajuda para os trabalhadores que têm crianças de tenra idade», denunciou o líder comunista, acusando as entidades patronais de quererem reduzir mais o rendimento dos trabalhadores por via do corte no valor pago pelas horas extraordinárias, com a possibilidade da semana de 60 horas.

«Como é que se entende uma proposta desta natureza, como é que se procura recuar quase um século em termos de horário de trabalho? Como é possível pensar em reduzir ainda mais os rendimentos a quem recebe apenas o salário mínimo nacional?», perguntou, não escondendo a sua indignação perante este caso que ilustra bem a forma como funciona a caducidade, «não para modernizar» mas para «destruir direitos».

E por isso reafirmou que o direito à contratação colectiva deve ser a «pedra de toque de qualquer governo, de qualquer política que pretenda a justiça social e o desenvolvimento económico».

«Acompanhamo-lo na preocupação que tem quanto à necessidade de repor a contratação colectiva», respondeu António Costa, salientando que a economia moderna não pode ser «uma economia sem regras, de exploração, tem de ser economia assente na qualidade e esta só se obtém com relações de trabalho justas».

Assegurando que a «destruição da contratação colectiva é algo que preocupa o Governo», reconheceu que se tem verificado de facto um «abuso em muitos sectores das situações de caducidade da contratação colectiva que vinha de há 40 anos». E disse ter conhecimento, inclusive, de «situações em que a própria associação da entidade patronal se extinguiu para fazer caducar o contrato anteriormente assinado» e, dessa forma, destruir esse contrato.

E por achar que «estas situações são absolutamente insustentáveis», lembrou que o Governo já interveio em empresas do Estado (designadamente no Metropolitano de Lisboa), afiançando que está apostado em «desbloquear o quadro da contratação colectiva». Porque, defendeu, «é a melhor forma de estabilizar uma relação saudável».

 



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