A balançar

Henrique Custódio

Há que fazer ba­lanços sobre esta gente que, do po­leiro na­ci­onal a que as­cen­deram con­jun­tu­ral­mente, fi­zeram o País re­cuar mais de uma dé­cada no seu de­sen­vol­vi­mento eco­nó­mico e vá­rias dé­cadas (até mesmo ao fas­cismo) na ex­pressão de de­veres e di­reitos dos ci­da­dãos e nas suas inter-re­la­ções na so­ci­e­dade.

Foi uma de­cla­ração de guerra ao Por­tugal de Abril, pré-anun­ciada por Passos Co­elho quando ga­rantiu ir impor «um novo pa­ra­digma» ao País, pondo em marcha uma des­go­ver­nação sempre ei­vada pela in­cons­ti­tu­ci­o­na­li­dade.

O fa­moso «ir além da troika» foi a pedra de toque da acção do go­verno PSD/​CDS que, com ar­ro­gância re­van­chista, atacou não apenas os sa­lá­rios, sub­sí­dios so­ciais e pen­sões, re­du­zindo-os ou cor­tando-os, não de­fe­nes­trou so­mente a pedra ba­silar do Có­digo do Tra­balho nas re­la­ções la­bo­rais do País, não se li­mitou a lesar gra­ve­mente os ser­viços pú­blicos na Saúde, na Edu­cação ou na Se­gu­rança So­cial. Também levou à ruína muitos mi­lhares de pe­quenas e mé­dias em­presas, elevou o de­sem­prego a ní­veis obs­cenos – um mi­lhão e meio de postos de tra­balho anu­lados – li­quidou a con­fi­ança no Es­tado como pessoa de bem e foi alas­trando por Por­tugal a pe­çonha dos con­flitos so­ciais – novos contra ve­lhos (apon­tando estes como «um fardo»), em­pre­gados contra de­sem­pre­gados (acu­sando estes úl­timos de «falta de ini­ci­a­tiva» ou, mesmo, de «pre­gui­çosos»).

A fe­char os elos do res­tau­ra­ci­o­nismo re­van­chista, o go­verno PSD/​CDS contou com o opor­tuno ca­deado do Pre­si­dente da Re­pú­blica, Ca­vaco Silva, que pôs o seu pre­si­den­cial exer­cício a manter coesa a ge­rin­gonça que sempre foi (essa sim) a «co­li­gação Pedro e Paulo».

Aliás, foi o tenaz apoio de Ca­vaco – usando as prer­ro­ga­tivas pre­si­den­ciais –, que ma­ni­fes­ta­mente man­teve quatro anos e meio no poder esta clique. O ponto alto do co­núbio re­velou-se com a «crise do ir­re­vo­gável» de­sen­ca­deada por Paulo Portas, onde ficou tão ex­posta a fra­gi­li­dade po­lí­tica da co­li­gação, que le­varia Ca­vaco a abusar das com­pe­tên­cias ao pro­curar impor um com­pro­misso a longo prazo entre o PS e a co­li­gação PSD/​CDS, com todos a com­pro­meter-se a cum­prir ad ae­ternum as me­didas de aus­te­ri­dade im­postas pela União Eu­ro­peia. Desde então, essa ten­ta­tiva de im­po­sição tornou-se ob­ses­siva, em Ca­vaco.

À hora a que es­cre­vemos chegou a no­tícia de que o Pre­si­dente da Re­pú­blica acabou de «in­dicar» An­tónio Costa para Pri­meiro-Mi­nistro (com o por­menor de subs­ti­tuir o ha­bi­tual «in­di­gi­tado» por «in­di­cado», uma es­pécie de si­nó­nimo a marcar a po­sição re­lu­tante do Pre­si­dente). Foi pre­ciso es­perar 50 dias para se cum­prir a norma cons­ti­tu­ci­onal ta­xa­tiva de se dar posse ao Go­verno que se apre­sente na As­sem­bleia da Re­pú­blica com apoio mai­o­ri­tário.

Ca­vaco Silva levou quase dois meses a per­cebê-lo, tal como a per­ceber que não tinha outro re­médio.




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