Sem mudar de política nada feito
Na comissão de Saúde, para onde baixaram sem votação por 30 dias, estão sete projectos de resolução do PCP relacionados com a natalidade, de um conjunto de 12 diplomas que formalizou no quadro do recente debate parlamentar sobre esta matéria.
O Governo tem políticas anti-natalidade que desmentem a sua «preocupação» com a baixa natalidade
Dos restantes cinco textos legislativos, um foi aprovado na generalidade, com a abstenção da maioria PSD/CDS-PP e do PS (o projecto de lei pelo reforço dos direitos de maternidade e paternidade), sendo os outros quatro rejeitados pela maioria governamental, e, num deles – o que alargava as condições de acesso e atribuição do abono pré-natal e do abono de família, assegurando a universalidade desta prestação social a todas as crianças e jovens –, também pelo PS, que se absteve nos outros três.
A par do projecto de lei comunista foram ainda aprovados, na generalidade, dia 17 de Abril, seis projectos da maioria PSD/CDS, um do BE e outro do PEV, todos integrados no pacote de medidas para estimular o aumento da natalidade no País.
Entre as medidas propostas pelos partidos do Governo e que mereceu um particular realce do líder parlamentar do PSD, Luís Montenegro, estava uma alteração legislativa consagrando a possibilidade de meia jornada de trabalho dos pais funcionários públicos, recebendo 60 por cento do vencimento.
«Propor aos trabalhadores que prescindam de 40 por cento do seu salário é um incentivo à natalidade? Mas quem é que pode prescindir de uma parte do seu salário?», inquiriu a deputada comunista Paula Santos, pondo em evidência a dissonância completa entre a preocupação quanto à baixa natalidade com que as bancadas da maioria se apresentaram no debate e aquela que é a acção governativa.
Sempre a descer«As políticas concretas que implementaram nos últimos quatro anos não promoveram a natalidade, muito pelo contrário, conduziram à sua redução de uma forma mais acentuada, passando de cerca de 100 mil nascimentos anuais para pouco mais de 80 mil», sublinhou a deputada do PCP, que não esqueceu a circunstância de essa ser também uma consequência destes anos terríveis que ficam marcados por cortes nos salários, pela destruição de postos de trabalho, precariedade, desemprego, emigração, brutal carga fiscal sobre os rendimentos do trabalho, retirada do abono de família e do rendimento social de inserção a milhares de crianças e jovens.
«É assim que pretendem incentivar a natalidade, agravando as já difíceis condições de vida dos trabalhadores e das famílias?», foi a pergunta de Paula Santos, que não obteve resposta da maioria.
Antes, o presidente do Grupo comunista, João Oliveira, reagira já à intervenção de Luís Montenegro, fazendo-lhe notar que as intenções do PSD não resistem ao confronto com as suas próprias opções e com a prática do Governo.
E indagou sobre as razões de adiar o incremento de medidas como as que o PCP propõe ou sobre a razão que leva o PSD a colocar as questões da natalidade em alternativa a outros direitos.
«Porquê adiar a opção relativamente ao abono de família? Porquê adiar a reposição do abono de família no 4.º, 5.º e 6.º escalões, quando esta é uma das medidas centrais para dar uma ideia, um sentido de incentivo à natalidade aos portugueses em termos de políticas sociais», questionou-se João Oliveira.
E quanto à opção entre ter filhos ou ter salário por inteiro preconizada pela maioria PSD/CDS-PP, admitiu que a medida se arrisca a «não ser um verdadeiro incentivo à natalidade mas sim um obstáculo a que os trabalhadores e o povo possam ter filhos de acordo com as suas próprias opções e projecto de constituição de família, assumindo a maternidade e a natalidade com a importância e a função social que ambas têm».
Soluções integradas e concretas
Foi tendo presente os fortes constrangimentos que condicionam a decisão das famílias sobre o momento e o número de filhos a ter, visando eliminá-los, que o PCP redigiu as suas propostas em matéria de natalidade, num todo articulado e coerente, que abrange 12 áreas distintas, em outros tantos diplomas. São eles:
– Um programa nacional de combate à precariedade;
– O reforço dos direitos de maternidade e paternidade, designadamente quanto à livre escolha do casal no gozo da licença de maternidade e paternidade de 150 ou 180 dias, assegurando o seu pagamento a 100 por cento da remuneração de referência; o alargamento de licença obrigatória da mulher de seis para nove semanas e da licença de paternidade de 10 para 20 dias; a criação da licença de prematuridade paga a 100 por cento e o combate ao despedimento ilegal de trabalhadoras grávidas, puérperas e lactantes;
– Uma efectiva fiscalização do cumprimento dos direitos de maternidade e paternidade através do reforço dos meios da ACT;
– O alargamento dos critérios de atribuição do abono de família, assegurando a sua universalidade, através da reposição dos 4.º, 5.º e 6.º escalões e da majoração em 25 por cento dos 1.º e 2.º escalões;
– O alargamento dos critérios de atribuição do abono pré-natal;
– A criação de uma rede pública de equipamentos para a infância a preços acessíveis;
– A atribuição de médico de família a todos os utentes em particular às mulheres grávidas e às crianças e jovens;
– A efectivação dos direitos sexuais e reprodutivos;
– O acesso a cuidados de saúde para as crianças e jovens, assegurando a saúde infantil, a inclusão das vacinas antipneumocócica, antipneumocócica tipo B e antirotavírius no Plano Nacional de Vacinação, a promoção de saúde e da saúde mental;
– A acessibilidade aos tratamentos de infertilidade através do aumento dos centros públicos de procriação medicamente assistida, assim como da sua capacidade de resposta, com disponibilização gratuita dos medicamentos para o tratamento de infertilidade;
– A gratuitidade dos manuais escolares para todos os estudantes na escolaridade obrigatória e a criação do passe escolar gratuito para os estudantes com acção social escolar e comparticipado a 50 por cento para os restantes estudantes;
– O acesso à habitação para os jovens.
Frases
«A meia jornada de trabalho proposta pelo PSD é uma opção entre ter filhos ou ter salário por inteiro.»
João Oliveira
«As famílias não têm filhos não é porque não queiram, é porque não podem. Nas últimas décadas temos assistido à desvalorização da função social da maternidade e da paternidade, enquanto elemento essencial de substituição de gerações.»
Paula Santos
«No nosso País, passados 41 anos do 25 de Abril, entidades patronais e chefias no sector público e no privado, condicionam, limitam e negam condições de exercício de direitos de maternidade e paternidade nos locais de trabalho.»
Rita Rato
«Como pretendem PSD e CDS-PP incentivar a natalidade quando ao mesmo tempo se estimula a precariedade, se destrói milhares de postos de trabalho e se promove políticas de baixos salários?»
David Costa
«Quem está preocupado com a natalidade não encerra escolas, não despede professores, nem fomenta a contratação de Contratos Emprego Inserção para responder a necessidades permanentes.»
Diana Ferreira
«PSD e CDS passaram assim os últimos quatro anos a implementar políticas anti-família e anti-natalidade, pelo que as lágrimas de crocodilo hoje vertidas pelo PSD e CDS quanto à natalidade já não enganam ninguém.»
Jorge Machado