Fábulas

Henrique Custódio

Passos e Portas empinocaram-se frente aos microfones para anunciar o que o País estava cansado de saber: que o PSD e o CDS iam continuar coligados nas próximas eleições legislativas.

Nem as televisões em peso conseguiram animar o entremez. Que remédio tinham eles: se, mesmo coligados, o aluimento eleitoral que os espera se configura desastroso, separados corriam o sério risco de tombar na insignificância.

É que, por estranho que pareça, às vezes cá se fazem cá se pagam. E a coligação continua a fazê-las – ao povo que agora afaga nos discursos –, pelo que nem a bruxa-dos-quatro-caminhos os livrará da ripada.

É que os povos não costumam esquecer o que sofrem e quem os faz sofrer – veja-se o derrubamento do fascismo, em 25 de Abril de 1974, que agora se comemora e que a dupla do entremez da coligação escolheu para apresentar a sua «renovação de votos» no projecto de rebentar com o Portugal de Abril. O que prova que o oportunismo e a falta de princípios não têm limites, nesta gente.

Mas o facto de estarem lançados na campanha eleitoral não os impede de continuarem a actuar com dolo e má-fé.

Como o fez um tal Fernando Leal da Costa, secretário de Estado da Saúde, que ao ser confrontado pelos jornalistas com uma reportagem mostrando Urgências entupidas com dezenas de doentes em maca, teve o brutal desplante de (mais palavra, menos palavra) «só ver doentes bem acomodados em macas confortáveis e com anteparos a garantir a segurança». Consta que o homem é médico, mas não se deve ter cruzado com o Juramento de Hipócrates.

E os dramas vão por aí adiante, como o ministro da Saúde – que tutela o supracitado –, a responder a perguntas sobre o corte de milhares de milhões de euros no SNS com a garantia de que «os recursos» estão «melhor geridos e aproveitados». Ou o ministro Crato, da Educação, que, segundo o CM, se pôs «ao lado» do agrupamento de escolas de Canelas (V. N. de Gaia) quando este cortou três dias de salário aos 33 professores que se recusaram a «vigiar» colegas no exame de prova específica para docentes, continuando nas escolas a avaliar os seus alunos.

Mas o afã alarga-se com a privatização da TAP a mata-cavalos, a satisfazer ambições onde a vaidade pacóvia do ministro Lima será a única transparência, idem para as «concessões» do Metro e da Carris, que esta gente quer consumar antes que se lhe esgote o tempo de Governo e mandando às malvas (como de uso) o pormenor (realçado por Manuela Ferreira Leite) de que «transporte público» é isso mesmo – público – e existe para transportar multidões e não para dar lucros seja a quem for, incluindo os privados.

É com este pano de fundo que PSD e CDS se encostam um ao outro, como os bêbados da fábula.

É para prosseguir o essencial desta política que o PS, amparado no bordão da demagogia eleitoral, põe na mesa o seu «estudo para a década», a ver como é que o pagode engole.

 



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