Multa lava tudo

Anabela Fino

O banco alemão Deutsche Bank vai pagar uma multa de mais de 2,5 mil milhões de euros às autoridades britânicas e norte-americanas de fiscalização de conduta financeira, soube-se a semana passada. Motivo: durante anos, funcionários da instituição manipularam ilegalmente taxas de juros de referência em todo o mundo, dirigindo os mercados de forma fraudulenta para daí retirar dividendos para si e para os seus clientes.

Georgina Philippou, responsável da agência britânica de fiscalização, disse que a multa – a mais elevada aplicada até à data a uma instituição bancária – resulta do facto de os problemas do Deutsche Bank terem sido ampliados por «nos tentarem enganar repetidamente».

«O banco demorou demasiado tempo a entregar documentos essenciais e moveu-se demasiado lentamente no sentido de solucionar os sistemas e controlos relevantes», afirmou.

Esta história tem vários aspectos curiosos que importa assinalar. Em primeiro lugar, registe-se o facto de a multa milionária resultar de um acordo entre o banco alemão e as autoridades de fiscalização. Pagando a multa, o Deutsche Bank «compra» a garantia de que não lhe são impostas acções penais pelas fraudes cometidas, já que as autoridades renunciam a levar o caso aos tribunais. Em segundo lugar, o pagamento evita que o Deutsche Bank perca a sua licença de operar nos EUA. Em terceiro lugar, reconhecendo a culpa e comprometendo-se a não cometer infracções similares, o banco «limpa» a reputação e assegura que não se fala mais no assunto.

Curiosamente, ou talvez não, nesta história não se fala dos lesados, ou seja, dos milhões de pessoas em todo o mundo que, como sucede através da Libor e da Euribor no caso da Europa, dependem dos «mercados» que alegadamente «ditam» as taxas de juros aplicadas aos empréstimos que são forçados a fazer, seja para financiar estudos, pagar a casa, ou qualquer outro produto da vasta gama. Que confiança merecem o «mercado» e os seus pretensos «fiscais» quando a Justiça é descartada por uma multa lava tudo que remete para o esquecimento os crimes cometidos? Para quem tiver dúvidas na resposta, cabe dizer que não falta companhia ao Deutsche Bank: Barclays, Citigroup, JPMorgan Chase, UBS, Royal Bank of Scotland e HSBC. Tudo gente séria.

 



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