Brasil na encruzilhada

Luís Carapinha

O imperialismo joga forte na desestabilização do Brasil

A barragem de desinformação em torno do Brasil regressou ao apogeu nestes dias. Escassos meses após a reeleição de Dilma Rousseff, a grande burguesia brasileira intensifica a campanha frenética contra a presidente legítima e as forças da esquerda consequente. Tripudiando demagogicamente sobre o fenómeno da corrupção, a direita derrotada nas urnas embarcou na golpada da «terceira volta», aventando já abertamente a «impugnação» de Dilma. As marchas reaccionárias de domingo em diversas cidades do Brasil, desmascarando o ódio visceral e agenda antidemocrática das classes abastadas, chegaram ao ponto de clamar pelo retorno da ditadura e até por uma intervenção militar estrangeira.

Afirmar que o colosso sul-americano se encontra literalmente na mira e que se passou a uma nova fase da contra-ofensiva levada a cabo pelo imperialismo norte-americano no conjunto da América Latina constitui uma verdade que em nada desconhece as raízes internas da confrontação exacerbada que aflora no Brasil.


S
ão genuínas as aspirações do povo brasileiro a uma vida melhor e a rejeição da matriz de pobreza e injustiças legada por décadas de políticas de exploração capitalista e subdesenvolvimento às mãos de governos corruptos e serventuários da oligarquia. Mas por detrás da despudorada instrumentalização dos escândalos e «causa» da corrupção, agora fervorosamente abraçada pela «oposição» brasileira e a cadeia mediática dominante, oculta-se o intento de ajuste de contas com a experiência de mudança progressista iniciada em 2002 com a vitória de Lula. Isto é, o ajuste de classe com o eleitorado pobre e a base popular determinante para os triunfos de Lula e Dilma nos últimos 12 anos. Bradam a espada da «transparência», mas ensejam ver o domínio público da Petrobras desbaratado e as vastas reservas do pré-sal entregues aos interesses do capital privado e das multinacionais. Ademais, num momento em que se avolumam as pressões sobre a economia do Brasil e o PIB entra em contracção (refira-se aliás que com o fim da injecção de liquidez pela Reserva Federal de novo se assiste à tendência de migração sôfrega de capitais das chamadas potências emergentes para os EUA), já não bastam as pressões para forçar o governo brasileiro a recuar e acomodar medidas de recorte neoliberal, merecedoras de críticas, inclusive, desde o interior do PT. Não, a poderosa «elite» brasileira e o capital financeiro transnacional associados exigem quanto antes retomar as rédeas do poder político. Daí o perigoso abalançar para as vias do golpismo que a rabiosa campanha contra Dilma e a esquerda brasileira – que não dispõe de uma maioria no Congresso – evidencia.


A
situação vivida no Brasil não é estranha aos grandes perigos e contradições que avultam no presente contexto internacional. O desenrolar da espiral da crise capitalista ilumina os sinais de esgotamento e limites do modelo redistributivo em que assentaram as conquistas e importantes programas sociais implementados nos últimos anos. Prosseguir a acumulação de forças e a defesa das reivindicações concretas no sentido da soberania e progresso social implicam afrontar as posições da grande burguesia e avançar na senda de profundas transformações democráticas. A conciliação com as exigências do inimigo, regra geral, apenas fortalece o seu assalto.

O imperialismo joga forte na desestabilização do Brasil. Não esquece o papel desempenhado por Brasília na dinâmica dos BRICS e no processo de integração latino-americana, como é o caso saliente da CELAC, que desafiam a sua hegemonia. No Brasil – como na transcendente batalha que tem lugar na Venezuela, ou na crescente ebulição vivida na Argentina – o papel das massas mobilizadas e a unidade do campo patriótico e popular são determinantes para derrotar as ameaças antidemocráticas e travar o passo às forças ao serviço do grande capital.




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