Regime de concessão de «vistos gold»

Opções injustas e erradas

A maioria PSD/CDS-PP e o PS aprovaram, dia 12, na generalidade, a proposta de lei que altera o regime de Autorizações de Residência para a actividade de Investimento, também conhecidos como «vistos gold». É mudar alguma coisa para que o essencial fique na mesma, acusa o PCP.

O País precisa é de vencer a dependência externa, não de a acentuar

As alterações alargam à ciência e cultura, bem como à reabilitação urbana, a possibilidade de aplicação de investimento, até agora confinada à compra de imobiliário e transferência de capitais.

De acordo com as novas regras, expostas no debate pelo vice-primeiro-ministro Paulo Portas, quem invista a partir de 350 mil euros em ciência tem direito a autorização de residência, o mesmo acontecendo a quem transfira capitais em montante igual ou superior aplicado em «manutenção do património, ou seja, cultura».

Num debate onde PS e Governo convergirem no fundamental em defesa do modelo, mostrando-se ambos disponíveis para «trabalhar em conjunto» (Ana Catarina Mendes), com vista a «melhorar o sistema» (Paulo Portas), as críticas ao diploma vieram dos quadrantes mais à esquerda do hemiciclo, em particular do PCP que expressou de forma clara a sua oposição à existência deste mecanismo dos «vistos gold».

Para o líder parlamentar comunista, João Oliveira, a opção do Governo é «injusta enquanto política de imigração, errada enquanto política económica e uma opção preocupante no plano da Justiça».

«Injusta no que toca à política de imigração porque mantém política de portas fechadas para quem vive só do seu trabalho e uma porta de vistos dourados para quem tem dinheiro», sustentou, lembrando que quem só quer trabalhar acaba condenado à ilegalidade, mas quem tiver um milhão de euros nem precisa de vir a Portugal para ter autorização de residência, basta passar uma semana por ano no nosso País.

Por outro lado, é errada no plano da política económica na medida em que o País o que precisa é de vencer a sua dependência externa, não de a acentuar.

«O que precisamos é de políticas económicas com verdadeiro impacto económico na criação de emprego e na criação de riqueza, apostando particularmente nos nossos sectores produtivos», sublinhou João Oliveira, constatando que os «vistos gold» – pelos resultados obtidos e pelos pressupostos em que assenta – vão exactamente em sentido contrário. A confirmá-lo, exemplificou, está o facto de em 1700 vistos apenas três serem justificados com a criação de postos de trabalho.

Por último, é preocupante no plano da Justiça, na perspectiva do PCP, porque a criação deste mecanismo cria condições propícias à ocorrência de casos de corrupção, de branqueamento de capitais, de procuradoria ilícita.

E o problema, realçou João Oliveira, é que o diploma do Governo «não afasta nenhuma destas preocupações, não contém nenhuma das medidas necessárias para evitar a ocorrência desses fenómenos criminais, não dá resposta a problemas identificados como o que se relaciona com o processo crime que envolve altos titulares de cargos públicos».

«Em vez de tomar medidas de integração social e laboral dos trabalhadores imigrantes em Portugal, em vez de se preocupar do ponto de vista económico em acertar a prioridade numa política económica que recupere os sectores produtivos, crie emprego e riqueza, o Governo o que faz é optar por uma medida de política que contraria todos estes objectivos», concluiu o presidente do Grupo Parlamentar do PCP.


Fachadas

Alvo de crítica no diploma do Governo não é apenas o facto de nele se manter o essencial do modelo original. Para o líder parlamentar do PCP, também as novidades da proposta de lei não dão motivo para descanso. É o caso, por exemplo, da aplicação de investimento na investigação científica. Ao invés de «estancar a sangria de recursos humanos» (particularmente investigadores, que estão a sair para o estrangeiro), de estancar a sangria da capacidade científica instalada e romper com a actual dependência externa (sobretudo no plano científico), a aposta do Governo vai no sentido de que possa haver alguns investimentos em matéria de ciência e cultura por parte daqueles que até hoje só quiseram investir na compra de imóveis e na transferência de capitais.

O problema é que tais investimentos são frequentemente «fachadas de beneficência que ocultam infelizmente actividades menos meritórias», advertiu João Oliveira, pondo assim em evidência a necessidade de adoptar eficientes mecanismos de controlo.

 

Corrupção

Os «vistos gold» têm andado na boca do mundo e, é sabido, pelas piores razões. Recorde-se que foi em Novembro passado que a investigação policial «Operação Labirinto» levou à prisão preventiva cinco de 11 arguidos, entre eles vários altos quadros do Estado, como o presidente do Instituto dos Registos e Notariado, António Figueiredo, o director nacional do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), Manuel Jarmela Palos, e da ex-secretária-geral do Ministério da Justiça, Maria António Anes, suspeitos de diversas práticas ilícitas como corrupção.

Este foi ainda o caso que levou à demissão de Miguel Macedo do cargo de ministro da Administração Interna.

 



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