Ser coerente e não errático
A Assembleia da República aprovou, na generalidade, um conjunto de oito propostas de lei do Governo para reforçar as medidas de combate ao terrorismo.
Nos anos 80 Bin Laden era um combatente pela liberdade e o terrorista era Nelson Mandela
LUSA
Trata-se de adaptar a actual legislação à Estratégia Nacional de Combate ao Terrorismo, que cria novos tipos de ilícitos, abrangendo, entre outros domínios, a apologia do terrorismo na Internet, o regime de entrada, permanência e saída de estrangeiros, a concessão da nacionalidade, a criminalidade organizada económica-financeira, as viagens para adesão a organizações terroristas.
«Detectar, prevenir, proteger, perseguir e responder a este fenómeno em todas as suas frentes» são as razões que justificam este pacote legislativo anti-terrorismo, segundo a ministra da Administração Interna. A titular da pasta da Justiça, por seu lado, adiantou que as novas medidas não são «securitárias».
Em resposta à dúvida colocada pelo deputado comunista António Filipe sobre a forma como vai ser feita a monitorização do acesso aos sítios na Internet onde se incita ao terrorismo, e das viagens para adesão a organizações terroristas – «algo que é difícil de criminalizar», considerou, tocando num dos pontos que mereceram reparo da sua bancada –, Paula Teixeira da Cruz admitiu que «não há qualquer especificidade nesta matéria», adiantando apenas que a investigação será feita nos mesmos moldes em que é realizado actualmente o controlo dos ‘sites’ de pedofilia e pornografia.
António Filipe chamou entretanto a atenção para a necessidade, em matéria de combate ao terrorismo, de «ser coerente», já que os estados que mais têm legislado supostamente para combater o terrorismo têm sido os menos coerentes e, em alguns casos, têm-se comportado verdadeiramente como o dr. Frankeinstein, ou seja, criar criaturas que depois se viram contra o criador». E referiu não faltarem testemunhos disso mesmo, como nos anos 80 em que «Bin Laden era um combatente da liberdade e o terrorista era Nelson Mandela».
Por outro lado, para que este combate seja eficaz, há que «evitar derivas erráticas», alertou António Filipe, sublinhando que houve muitas desde 2001: «Guantanamo, «Patriot act», prisões secretas na Europa, os voos secretos da CIA, as guerras no Iraque, na Líbia e na Síria, a criação do Estado Islâmico, inseparável das consequências dessas guerras». Em suma, «há que ser coerente e há que não ser errático», enfatizou o parlamentar do PCP.
Sobre o conteúdo das propostas, afirmou que «não merecem qualquer objecção», embora haja algumas merecedoras de uma discussão mais aprofundada em sede de especialidade.
As alterações ao Código de Processo Penal para actualizar a definição de terrorismo, à lei de combate à criminalidade organizada e económico-financeira e à lei de organização da investigação criminal foram aprovadas com o voto favorável de todas as bancadas.
Já as alterações à lei da nacionalidade, à lei de combate ao terrorismo e ao regime jurídico de entrada, permanência, saída e afastamento de estrangeiros do território nacional mereceram a oposição do PCP, que votou contra a proposta de alteração ao regime jurídico das acções encobertas para fins de prevenção e investigação criminal, abstendo-se na alteração à lei de segurança interna. Todos estes diplomas tiveram os votos favoráveis dos deputados do PS e da maioria.