A ética do capitalismo

Anabela Fino

É pos­sível al­guém ser si­mul­ta­ne­a­mente uma pessoa ética e ban­queiro? A questão foi res­pon­dida há meia dúzia de anos por uma pessoa que ma­ni­fes­ta­mente sabe do as­sunto: Stephen Green, ou para quem gosta de tí­tulos, o Barão Green de Hurst­pi­er­point.

Para quem nunca ouviu falar de lord Green po­demos avançar que também é padre an­gli­cano, já foi mi­nistro de Sua Ma­jes­tade nas fi­leiras do Par­tido Con­ser­vador, e entre ou­tras fun­ções que não vêm ao caso pre­sidiu ao Con­selho de Ad­mi­nis­tração do banco HSBC entre 2006 e 2010. Pre­ci­sa­mente, o HSBC de que tanto se fala de­vido ao es­cân­dalo de bran­que­a­mento de ca­pi­tais e evasão fiscal através de contas se­cretas na Suíça, en­vol­vendo cli­entes de todo o mundo e verbas de mais de 180 mil mi­lhões de euros.

Pois o se­nhor Green deu à es­tampa, em 2009, um in­te­res­sante livro com o tí­tulo Good Value: Re­flec­tions on Money, Mo­ra­lity and an Un­cer­tain World (Valor Se­guro: Re­fle­xões sobre o Di­nheiro e a Moral num Mundo In­certo), onde entre ou­tras coisas con­si­dera que são ne­ces­sá­rios bons ho­mens de ne­gó­cios que po­nham os seus prin­cí­pios à frente das mar­gens de lucro. Ao re­co­nhecer a pre­ce­dência dos va­lores mo­rais e es­pi­ri­tuais sobre o lucro ime­diato, diz Green, temos a opor­tu­ni­dade de re­fazer o ca­pi­ta­lismo, para além de ajudar os menos afor­tu­nados e en­con­trar um sig­ni­fi­cado para as nossas pró­prias vidas.

Nesta sua versão do «novo ca­pi­ta­lismo» Green deixa-nos, como se lê na apre­sen­tação da obra, a «pos­si­bi­li­dade ani­ma­dora de através da boa ética vir um bom ne­gócio, e através de um bom ne­gócio vir um mundo me­lhor e mais prós­pero para todos».

Seria co­mo­vedor não fora dar-se o caso de Green ter es­tado à frente do HSBC entre 2006 e 2010, jus­ta­mente o pe­ríodo a que se re­porta o es­cân­dalo no HSBC. E de em 2005, se­gundo o jornal bri­tâ­nico The Guar­dian, pre­sidir à hol­ding suíça de bancos pri­vados do grupo. Quando deixou o cargo, há cinco anos, re­cebeu uma in­dem­ni­zação de 19 mi­lhões de li­bras (25,6 mi­lhões de euros).

Hoje, ques­ti­o­nado sobre a sua res­pon­sa­bi­li­dade no es­cân­dalo do HSBC, o nosso lord – ou será me­lhor dizer pastor? – que prega no seu livro que a res­pon­sa­bi­li­dade das em­presas co­meça nos con­se­lhos de ad­mi­nis­tração, li­mita-se a res­ponder que por uma «questão de prin­cípio» não co­menta tal as­sunto. Es­tamos con­ver­sados.




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