Governo cai no Chipre
O governo cipriota demitiu-se em bloco, na sexta-feira, 28, após a ruptura da coligação e o chumbo do projecto de privatização de três empresas semi-públicas.
Luta popular abre brecha na coligação pró-troika
Trabalhadores e população iniciaram em meados de Fevereiro um movimento de greves e protestos que culminou na semana passada com concentrações massivas frente ao Parlamento cipriota, exigindo o chumbo da proposta de lei que determinava a privatização da empresa pública de telecomunicações CYTA, da companhia estatal de electricidade EAC e da autoridade portuária (CPA).
O clamor da rua, que não era ouvido com tal intensidade desde a entrada da troika, faz agora um ano, precipitou a ruptura da coligação governativa, dia 27, com a demissão dos quatro ministros centristas do DIKO.
Os líderes do DIKO justificaram a decisão com discordâncias sob a forma como o presidente cipriota, Nikos Anastasiades, está a conduzir o processo de reunificação com a parte Norte da ilha.
Porém, no mesmo dia, ficou claro que as divergências iam além da questão da reunificação. Cinco dos nove deputados do DIKO abstiveram-se na votação da lei das privatizações, retirando a maioria ao governo liderado pelos conservadores do DISY.
Desde a primeira hora, os comunistas do AKEL foram os principais opositores ao projecto. Os seus 19 deputados votaram contra, juntamente com os cinco deputados sociais-democratas do EDEK e um deputado ecologista. Do outro lado, os partidos da direita conseguiram um empate técnico com 25 votos, ficando aquém da maioria simples de 29 sufrágios.
Sem outra opção, o governo apresentou a sua demissão ao presidente da República, que decidiu manter os ministros em funções até meados deste mês.
Uma vitória popular
O AKEL congratulou-se com a rejeição do diploma privatizador, exigindo que o governo respeite o resultado da votação. Os comunistas cipriotas consideram que é preciso «ser firme com a troika e não permitir nenhuma privatização».
Contra os planos do governo, que pretendia arrecadar 1,4 mil milhões de euros com a venda das três empresas, os trabalhadores da eléctrica EAC realizaram uma série de greves. No dia 24, frente ao parlamento, os protestos terminaram em violentos confrontos com as forças da ordem, de que resultaram dois feridos.
No dia da votação, uma nova greve paralisou as três empresas atingidas e milhares de trabalhadores desfilaram pela capital Nicósia até ao parlamento.
A actividade portuária tem sido também fortemente afectada pela greve de zelo dos trabalhadores. No fim-de-semana a maioria dos navios não foram descarregados
Entretanto, a situação social e económica continua a degradar-se. O Produto Interno Bruto caiu seis por cento em 2013, e as previsões apontam para um novo recuo de 4,8 por cento este ano.
A taxa de desemprego disparou dos oito por cento em 2011 para 19,2 por cento este ano, segundo prevê a própria Comissão Europeia, acenando com o crescimento lá para 2015.
Este quadro é agravado por uma espiral de deflação: Em Janeiro, os preços caíram 1,6 por cento em termos homólogos e 1,1 por cento em relação ao mês de Dezembro.
O sector bancário continua sob custódia do BCE e mantêm-se restrições ao acesso aos depósitos.
Os alegados benefícios da austeridade são cada vez menos consensuais nos diferentes sectores da sociedade cipriota.
Ao mesmo tempo, o reinício das negociações com vista à reunificação da ilha, dividida desde 1974, também não tem surtido efeito.