A palavra degrau é muito curiosa. Deriva do latim degradu e designa cada uma das partes da escada em que se põe o pé para subir ou para descer; em sentido figurado, traduz um meio para alguém se elevar ou atingir certos fins.

Nada disto parece muito especial, mas se se atentar bem na palavra é quase inevitável pensar que integra uma outra – grau – que embora sendo tão pequena tem múltiplas utilizações, desde o grau de temperatura ao grau de corrupção, só para citar dois exemplos. Insistindo no exercício – por alguma razão se diz que as palavras são como as cerejas – repara-se que é muito parecida com uma outra, bastando para tal substituir o «de» por «dis», o que faz que em vez de degradu se chegue a disgradu, o que já nos remete para alguém ou alguma coisa degradada. E podíamos ir por aí fora neste sobe e desce dos degraus linguísticos ou nos avanços e recuos das palavras que outras mais haveríamos de achar: de graduado a retrógado a dificuldade está na escolha e é tudo uma questão de grau.

Temos pois que isto de degraus tem que se lhes diga e não apenas porque servem para as opostas funções de subir e descer. Pelo que é dado apreciar, há por aí quem, tendo subido, não só não pensa mais em descer – em sentido figurado, obviamente – como tende a cultivar a estranha tendência de proibir a subida – em sentido literal, claro – a quem, em ambas as asserções do termo, ficou em baixo. Chama-se a isto, no dicionário do poder, perímetro de segurança. Perímetro, como toda a gente sabe, é a medida do comprimento de um contorno. Quando se lhe acrescenta a segurança, do que se trata é de traçar o limite entre os que ficam de fora e os que se acoitam dentro do perímetro. É uma outra espécie de degrau, ou de grau na amplitude do espaço que separa duas realidades. Também aqui, curiosamente, a cultura dominante tem vindo a impor o alargamento dos perímetros ditos de segurança, a tal ponto que num destes dias, em Borba, nem a planura alentejana permitiu vislumbrar Passos Coelho e o seu séquito numa visita oficial com área demarcada num quilómetro de distância.

Com tanto degrau e tanto perímetro, um destes dias ainda alguém cai ou fica encurralado.