O que cinco motoristas podem fazer

António Santos

Image 14384

Esta é uma das leis inabaláveis da história: não é possível pôr fim à luta de classes enquanto elas existirem. Mesmo nos EUA, onde a correlação de forças é avassaladoramente favorável ao capital, a luta dos trabalhadores freme, abre fendas no cimento e insiste em voltar a florescer. Após mais de um século de chumbo contra todas as organizações e a ideologia da classe operária, continuam a despontar e a resistir inspiradores exemplos de abnegação e consciência de classe.

O Steelworkers Local 8751 é o sindicato dos motoristas do transporte escolar de Boston e conta com um património de décadas de luta, de solidariedade com outros trabalhadores e dedicação a temas como a paz e o anti-racismo. Ao contrário da maioria dos sindicatos norte-americanos, o Steelworkers Local 8751 não é uma correia de transmissão do Partido Democrata e nunca renunciou à luta de massas como instrumento. Talvez por isso os motoristas se possam orgulhar de contar com um contrato colectivo de trabalho que lhes confere o direito a um emprego estável, com um salário decente e uma reforma segura. Pelo menos até no passado mês de Junho o serviço ser privatizado e oferecido de bandeja à Veolia, uma das mais sinistras multinacionais de que há memória.

A Veolia emprega mais de 300 mil trabalhadores em 48 países e dedica-se a actividades como o perigosíssimo fracking na América Latina, a recolha de lixo de cidadãos não-árabes no Estado de Israel, a privatização da água na Europa ou o transporte de crianças em Boston. Desde que pôs mãos ao trabalho, a Veolia violou literalmente todos os artigos do convénio de trabalho colectivo, reduziu brutalmente os salários e impôs trajectos perigosos ou irrealizáveis.

Primeiro, o sindicato exigiu uma reunião à administração para discutir estes problemas, pedido que a Veolia decidiu peremptoriamente ignorar. Então, no dia 8 de Outubro, os trabalhadores responderam com astúcia: como no Estado de Massachusetts a greve é ilegal para a maioria dos trabalhadores, os motoristas picaram o ponto e declararam formalmente o seu interesse em trabalhar depois de falar com a administração sobre assuntos urgentes. Nesse dia, mais de 600 trabalhadores aderiram ao protesto e não trabalharam porque a Veolia se recusou a ouvi-los. Preferiu pedir uma ordem de tribunal para obrigar os trabalhadores a pôr fim à greve e regressar ao trabalho. Também não resultou: o juiz que analisou o caso concluiu que os moldes do protesto não configuravam, tecnicamente, uma greve.

Como não foi possível vergar os trabalhadores com a lei, experimentaram os cassetetes: no dia seguinte, o mayor de Boston decretava o lockout da empresa privada e enviava a polícia para impedir os trabalhadores de regressar ao trabalho. Os trabalhadores responderam com um caudal de luta que parecia engrossar a cada novo dia. Para a administração, tornou-se então claro que para derrotar o sindicato havia que começar pelos seus dirigentes.

Assim, a Veolia escolheu os cinco dirigentes sindicais mais destacados e decidiu fazer deles um exemplo. Impôs um processo disciplinar contra os cinco e ameaçou com despedimento. Os «School Bus Union 5», como ficaram conhecidos, eram os responsáveis pela gestão das pensões e das reformas, dos conflitos laborais e pela representação legal dos trabalhadores. Contra o seu injusto despedimento, ergueu-se uma muralha de indignação e protesto que até hoje não se calou. E a prova de que o exemplo heróico dos «School Bus Union 5» é eficaz é que a Veolia ainda não conseguiu reunir condições políticas para os despedir.




Mais artigos de: Internacional

Escândalo global

Milhares de pessoas protestaram em Washington contra o programa de espionagem dos EUA, iniciativa que ocorreu no final de uma semana em que foram revelados novos dados sobre a escandalosa vigilância global.

Síria colabora e cumpre

A maioria das instalações passíveis de produzirem armas químicas na Síria foram já visitadas pela missão mandatada pelas Nações Unidas, a qual também recebeu o inventário do arsenal e a localização dos depósitos.

Paquistão nega colaboração

Antigos responsáveis governamentais paquistaneses negam ter autorizado e muito menos colaborado com os EUA nos bombardeamentos com aviões não-tripulados no país. O Ministério dos Negócios Estrangeiros de Islamabad também desmentiu as informações...

Confrontos prosseguem

Homens armados atacaram, na manhã de anteontem, uma coluna de viaturas de passageiros escoltada por militares na província de Sofala, no centro de Moçambique. De acordo com a radioemissora pública, o motorista de um dos autocarros morreu e uma dezena de passageiros sofreu ferimentos...

Consequências da guerra imperialista

Pelo menos 65 pessoas morreram e 110 ficaram feridas, domingo, em resultado da vaga de atentados bombistas no Iraque que atingiram, sobretudo, a maioria xiita. Segundo os dados divulgados pelas autoridades de Bagdad, citados pela France Press, ataques semelhantes já provocaram, este mês, mais de 650...