O grotesco
Desde 1976 que PS, PSD e o penduricalho CDS têm espalhado o grotesco na governação, começando nas alianças de Mário Soares com os EUA e a RFA para financiarem a sua contra-revolução e continuando nos repolhudos dislates de Cavaco Silva enquanto ia desmantelando o aparelho produtivo nacional («eu nunca tenho dúvidas e raramente me engano», os «pelotões da frente» ou o desconhecimento de que Os Lusíadas têm dez Cantos).
Em 2004, o grotesco excedeu-se com o Governo de Santana Lopes. Ao bisonho Santana tudo aconteceu: na tomada de posse trocou as folhas e o discurso, enquanto o seu aliado Portas se arregalava ao ouvir que também era «ministro do Mar». Seguiu-se um fartote, como a criação de uma secretaria de Estado na Chamusca ou a realização de conselhos de ministros «volantes» (incluindo no navio-escola Sagres, com todos embonecados de marinheiros de água-doce).
O resultado desta paródia foi a maioria absoluta do PS/Sócrates que, afanosamente, elevou a um patamar superior os ataques ao Estado social, seja na Saúde (onde «inventou» os hospitais-empresa e desmantelou todos os sub-sistemas – jornalistas, bancários, militares, etc.), na Educação (onde a sua ministra Lurdes Rodrigues fechou centenas de escolas e desarticulou as carreiras docente e auxiliar), na Segurança Social (onde os cortes de pensões e subsídios ganharam «novo impulso»), no esquartejamento do Código do Trabalho e dos direitos e salvaguarda dos trabalhadores, a par de outras políticas ruinosas, como a das agora famosas PPP (Parcerias Público-Privadas).
Aliás, o PS de Sócrates lançou, fundo, as raízes do desastre que o Governo de coligação de Passos Coelho aproveitou para tentar a liquidação do próprio regime. Convém não esquecer que os «PEC» sucessivos (antecâmara do resgate) são obra do PS/Sócrates e que a entrada da troika foi por ele subscrita.
Mas o paroxismo do grotesco não pertencia a Santana Lopes – a dupla governamental Coelho/Portas ultrapassou-o à vara larga, nesta última semana. O que aconteceu é inacreditável: o ministro das Finanças demite-se, declarando que a sua política falhou, no dia seguinte o presidente do CDS Paulo Portas, 2.ª figura da coligação e ministro dos NE demite-se numa decisão declarada «irrevogável», paralelamente o PR dá posse à nova ministra das Finanças quando o Governo acabara de ficar sem aliado, e no mesmo dia o primeiro-ministro «recusa» a demissão de Portas sem ter para isso poder ou mandato, seguindo-se o «regresso» do «irrevogável» Portas e o atamancamento de uma coligação em «novos moldes». A rematar, Cavaco Silva permite esta bandalheira e achincalho institucional, que denigre toda a gente e expõe a Presidência tutelada por aventureiros.
Se não demitir esta gente e convocar eleições antecipadas, o PR afunda-se no imenso grotesco em que – irrevogavelmente – este triste episódio ficará na história.