Soberania agro-alimentar
Elemento central da luta por uma política patriótica e de esquerda é a luta pela soberania agro-alimentar do nosso País, entendida como o direito a produzir e a decidir o que produzir, a níveis adequados e conformes com as nossas condições edafoclimáticas (relação planta-solo-clima para plantio), para alimentar o nosso povo.
Objectivo que se confronta com as consequências das políticas de direita – agro-rurais e de mercados – definidas e aplicadas em Portugal e na União Europeia nas últimas três décadas e meia, agora amplificadas pela concretização do pacto de agressão, e que prosseguirão com a reforma da PAC e com o Orçamento Comunitário em debate na UE, que produziram o elevado nível de dependência agro-alimentar da população do nosso País em relação ao estrangeiro, que se situou, em 2011, nos 3,7 mil milhões de euros, ou seja 22% de todo o défice da balança comercial.
Dependência que decorre da redução da produção/transformação/comercialização no mercado interno de bens alimentares essenciais (ditos «estratégicos») como cereais, carne, leite, oleaginosas e protoleaginosas e outros. Nos cereais, o nosso País produz menos de 20% do consumo (que está distante do nível das necessidades reais…), sendo que, nas componentes de rações para alimentação animal, o défice produtivo e a dependência são ainda maiores. A dependência quase extrema nos cereais compromete mesmo a própria segurança nacional.
Dependência que decorre de, nos últimos 20 anos, terem sido extintas mais de 300 mil explorações, enquanto aumenta a concentração da terra, numa linha de secundarização da produção ago-alimentar de base familiar e mais tradicional e do mercado interno.
Dependência resultante da extrema desigualdade na distribuição das ajudas públicas ao sector, com a parte de leão a ir parar ao bolso do «clube dos ricos», o restrito grupo constituído pelos latifundiários, pela grande agro-indústria e pelo negócio agrícola, suportando a chamada «competitividade» desses grandes beneficiários das ajudas públicas, nacionais e da PAC.
Dependência para a qual contribui a grande distribuição que, numa estratégia de garrote, arruína a produção nacional, o sector cooperativo, o pequeno e médio comércio agro-alimentar.
Dependência, dificuldades e problemas, que não são apagados pela propaganda governamental que pretende fazer crer que a agricultura portuguesa está em contra-ciclo na «crise»; que está na moda; que os jovens agricultores se instalam às centenas; que nos aproximamos da «auto-suficiência», traduzida no equilíbrio entre os valores das exportações-importações, suportados nos derivados florestais e pelo desenvolvimento intensivo e desproporcionado de certas produções (eucalipto, azeite).
As políticas agro-alimentares necessárias
para uma Política Patriótica e de Esquerda
O Programa do Partido, «Democracia Avançada, os valores de Abril no futuro de Portugal», aprovado no nosso XIX Congresso, assume que «a política agrícola e de desenvolvimento rural deverá ter como objectivos centrais o desenvolvimento e a modernização da agricultura portuguesa, a melhoria da vida nos campos, o aumento da produtividade e da produção agrícola, pecuária e florestal, a melhoria do grau de auto-abastecimento de produtos alimentares essenciais, visando garantir a soberania e segurança alimentares, o máximo incremento das produções em que Portugal possa dispor de vantagens comparativas e a manutenção do mundo rural».
A política patriótica e de esquerda que o PCP propõe ao País, e que se integra nesses objectivos, assume como um dos seus eixos centrais «a defesa dos sectores produtivos e da produção nacional, com o desenvolvimento de uma política de Estado em defesa (…) da agricultura e das pescas, garantindo a soberania e segurança alimentares».
Tal exige, no quadro da ruptura com a política de direita e da rejeição do pacto de agressão, a defesa das seguintes linhas e medidas concretas:
No plano da acção do Governo:
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produzir, mais e melhor, prioritariamente para alimentar o nosso povo, mantendo a atenção às nossas exportações, e abandonando a prioridade absoluta da «competitividade»;
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garantir preços justos à produção, dinamizando mercados de proximidade e controlando a actividade das grandes superfícies, e combater os aumentos especulativos dos preços dos factores de produção;
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considerar estratégica a produção de cereais, carne, leite e oleaginosas, e a produção de componentes para rações;
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desenvolver a indústria agro-alimentar numa perspectiva de fileira com a produção agrícola e baseada predominantemente em matéria-prima nacional;
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dar preferência, nas escolas portuguesas, bem como na generalidade das cantinas públicas, à aquisição de produtos nacionais, e da região;
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garantir meios técnicos e humanos no Ministério da Agricultura, para apoiar os agricultores, contrariando o seu esvaziamento;
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apoiar-se a criação ou reactivação de organismos públicos (laboratórios) de pesquisa, ciência e tecnologia agro-industriais e defender os que existem;
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dinamizar planos nacionais de emergência no quadro da sanidade animal e da fitossanidade, capaz de prevenir e dar combate a doenças e pragas do gados, vinha, pomares e floresta;
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garantir a defesa da floresta nacional, investindo nas espécies autóctones e valorizando o preço das madeiras, designadamente de pinheiro bravo;
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apoiar o movimento cooperativo, garantindo meios para a recuperação e dinamização das cooperativas que se encontram em situação de dificuldade.
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completar, e garantir o aproveitamento para a produção de alimentos e forragens dos diversos sistemas de regadio;
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defender mais serviços públicos no mundo rural – escolas, centros de saúde, repartições de finanças, transportes públicos, como forma de garantir a fixação de populações e particularmente de jovens.
No plano da UE e da Reforma da PAC:
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defender a saída da agricultura da Organização Mundial do Comércio;
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combater o caminho ruinoso de desregulamentação dos mercados, no quadro da PAC, e o fim das quotas leiteiras e dos direitos de plantação da vinha. Assegurar uma quota de beterraba açucareira de 120 mil toneladas, recuperando a produção de açúcar com essa origem e a quantidade suficiente de ramas para a indústria de refinação;
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defender um Programa de Desenvolvimento Rural forte, dotado, pelo menos, dos mesmos meios que teve até ao actual quadro comunitário, e que dê prioridade ao apoio a projectos da agricultura familiar e dos pequenos e médios agricultores, à produção nacional e ao consumo interno;
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distribuir as ajudas públicas, ligadas à produção, de forma social e económica mais justa, com prioridade para as pequenas e médias explorações e para a pequena e média agro-indústria e garantindo uma ajuda mínima de 1000€.
No plano do uso e posse da terra:
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garantir a utilização acautelada dos recursos naturais e o respeito pelo património colectivo e individual dos pequenos e médios agricultores e dos compartes dos baldios;
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assegurar a transformação e racionalização da estrutura fundiária através de uma reforma agrária nos campos de Sul e do desenvolvimento do livre associativismo no Norte e centro do País;
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agarrar as potencialidades produtivas de milhares de hectares que hoje ou estão a monte ou mal aproveitados, designadamente nas zonas de regadio.
Estas são linhas/objectivos que se inserem na defesa dos sectores produtivos e da produção nacional, incontornáveis para assegurar a soberania e independência nacionais.