Chama-se capitalismo

João Frazão

«Chama-se ca­pi­ta­lismo. Nós somos or­gu­lho­sa­mente ca­pi­ta­listas. Não faço qual­quer con­fusão sobre isto». Pa­la­vras de Eric Sch­midt, pre­si­dente exe­cu­tivo da Go­ogle, a pro­pó­sito do es­quema criado pela em­presa para não pagar cen­tenas de mi­lhares de mi­lhões de euros em im­postos, co­lo­cando o di­nheiro em pa­raísos fis­cais.

Sch­midt afirmou mesmo estar «muito or­gu­lhoso da es­tru­tura» que aquela que é uma das mai­ores, senão mesmo a maior em­presa mun­dial da In­ternet, montou con­fir­mando que o fi­zeram «com base nos in­cen­tivos que os go­vernos» lhes ofe­re­ceram.

Se­gundo as no­tí­cias, a em­presa (e não foi a única) res­guardou, di­gamos assim, 7,7 mil mi­lhões de euros das re­ceitas de 2011 no di­nâ­mico ar­qui­pé­lago das Ber­mudas, evi­tando o pa­ga­mento de cerca de 1,5 mil mi­lhões de euros em im­postos no Reino Unido, país onde as re­ceitas foram ge­radas.

Sch­midt ainda brincou com a si­tu­ação, di­zendo estar a «de­fender os in­te­resses dos ac­ci­o­nistas», e que é mesmo «capaz de haver al­guma lei contra» não apro­veitar esses bu­racos para fugir aos im­postos.

O pre­si­dente da em­presa pro­pri­e­tária do motor de busca na In­ternet mais usado em todo o mundo tem razão. Isto é, de facto, o ca­pi­ta­lismo, na sua versão crua e mo­derna. Um pu­nhado de ho­mens busca o lucro má­ximo, por todos os meios, le­gí­timos ou ile­gí­timos. Com o Es­tado ao seu ser­viço, para lhe ga­rantir os meios (os in­cen­tivos dirá Sch­midt!), para essa acu­mu­lação de ri­queza.

Um sis­tema ir­ra­ci­onal, em que os go­ver­nantes, lá como cá, ao ser­viço dos grandes grupos eco­nó­micos trans­na­ci­o­nais, de­pois de os isen­tarem de quan­tias mi­li­o­ná­rias que se­riam in­dis­pen­sá­veis para ga­rantir as fun­ções que aos es­tados estão co­me­tidas, pondo em causa a pró­pria so­bre­vi­vência dos es­tados que di­rigem, sem qual­quer pejo, dirão a am­plas ca­madas po­pu­lares que terão que pagar mais im­postos, e mais pela saúde e pela edu­cação e que vão so­frer cortes nos sa­lá­rios e nas pen­sões, e que isto tudo é ine­vi­tável, porque... não há di­nheiro, e porque os tra­ba­lha­dores vivem acima das suas pos­si­bi­li­dades.

Um sis­tema que não he­si­tará em con­denar mi­lhões de seres hu­manos à mi­séria, para ga­rantir a uns poucos a ri­queza sem fim.

Um sis­tema a que, como fica evi­dente, é ne­ces­sário pôr fim.



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