Crimes impunes
A decisão mina a credibilidade dos EUA para criticar outros países
O ministro da Justiça, Eric Holder, justifica a decisão, anunciada quinta-feira, 31 de Agosto, com a carência de «provas admissíveis para obter e sustentar uma acusação para lá da dúvida razoável», disse, citado pela AFP.
Conclui-se, assim, as investigações iniciadas em 2008 pelo procurador federal John Durham na sequência da destruição de registos vídeo de interrogatórios da CIA. Em Agosto de 2009, o processo foi ampliado a 101 interrogatórios sob tortura efectuados nas prisões secretas geridas pelos serviços secretos dos EUA em países estrangeiros. Quase dois anos depois, Durham recomendou que apenas dois casos prosseguissem, fazendo, aliás, eco das palavras do então procurador-geral federal, que garantiu que «ninguém que tivesse agido de boa fé e dentro da orientação legal [instituída pela administração Bush]» seria processado.
Os dois casos que agora se encerra sem qualquer acusação, decretando-se, desta forma, a impunidade de operacionais e responsáveis militares e políticos, referem-se aos assassinatos pela CIA de Gul Rahman e Manadel al-Jamadi. O primeiro morreu algemado a uma janela do cárcere de Abu Ghraib, no Iraque, em 2003, e o segundo em circunstâncias semelhantes, em 2002, numa prisão da CIA em Cabul, no Afeganistão, conhecida como Poço de Sal. A autópsia de al-Jamadi confirma que morreu em resultado da tortura a que foi sujeito.
As chamadas «técnicas avançadas de interrogatório» instituídas ao abrigo do intitulado «combate ao terrorismo» incluíam espancamentos, humilhações sexuais e outras, choques eléctricos, privação de sono, colocação de detidos em posições stressantes, simulação de afogamento, etc.
Só o alegado mentor dos ataques de 11 de Setembro, Khalid Sheikh Mohammed, foi sujeito a mais de 180 sessões de simulação de afogamento, entre 2003 e 2006, numa prisão da CIA na Polónia.
Escandaloso
O actual director da CIA, o general David Patreus, manifestou-se satisfeito com a decisão, mas a União Americana das Liberdades Civis (ACLU, na sigla inglesa), considerou-a «um escândalo» que transmite um sinal de impunidade face à prática de tortura.
A Humans Rights First, por seu lado, sublinha que «as torturas e os abusos foram generalizados e sistemáticos após o 11 de Setembro» e que os casos «estão bem documentados», por isso o encerramento dos processos é «decepcionante».
Opinião semelhante tem a Humans Right Watch, para quem «este é um desenvolvimento desastroso» que «mina a autoridade e a credibilidade dos EUA para criticar outros países», frisou Laura Pitter, de acordo com a Inter Press.