Obscurantismo na Lituânia

Quando a verdade é crime

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Al­girdas Pe­leckis, pre­si­dente da Frente Po­pular So­ci­a­lista da Li­tuânia, tornou-se a pri­meira ví­tima da le­gis­lação an­ti­co­mu­nista, ao ser cons­ti­tuído ar­guido por ques­ti­onar a versão ofi­cial dos acon­te­ci­mentos de Ja­neiro de 1991 na ca­pital do país.

Pre­sente ao Tri­bunal de Vil­nius, nos dias 6 e 7, Al­girdas Pe­leckis é acu­sado de vi­olar a lei, em vigor desde Agosto do ano pas­sado, que proíbe a «ne­gação dos crimes co­me­tidos pelo re­gime so­vié­tico». Ter­mi­nadas as pri­meiras au­di­ên­cias, o juiz de­cidiu adiar o jul­ga­mento para dia 13 de Se­tembro. Pe­leckis ar­risca-se a ser con­de­nado a dois anos de prisão.

E porquê? Por ter alu­dido à ver­dade, afron­tando o dogma do re­gime bur­guês, sobre um epi­sódio ocor­rido há 20 anos, na sequência da saída uni­la­teral da Li­tuânia da União So­vié­tica.

Os factos pas­saram-se na noite de 13 de Ja­neiro de 1991, quando um grupo de na­ci­o­na­listas li­tu­anos se lançou na to­mada das ins­ta­la­ções e da torre de te­le­visão, de­fen­dida por sol­dados so­vié­ticos. Treze ­pes­soas então foram mortas num ti­ro­teio.

Em­bora os au­tores dos dis­paros nunca te­nham sido ofi­ci­al­mente iden­ti­fi­cados, o novo poder apressou-se a ins­crever o su­ce­dido no rol dos «crimes» so­vié­ticos, de­cla­rando as ví­timas como he­róis da luta pela in­de­pen­dência, tom­badas às mãos do Exér­cito Ver­melho.

Ora, em No­vembro pas­sado, num pro­grama de rádio, Al­girdas Pe­leckis afirmou que «como agora se es­cla­receu, foram li­tu­anos que dis­pa­raram contra li­tu­anos». E mais não con­se­guiu dizer porque de ime­diato o in­ter­rom­peram. Mas foi o su­fi­ci­ente para cair na al­çada do pro­cu­rador.

To­davia, a de­cla­ração de Pe­leckis não re­pre­senta pro­pri­a­mente uma no­vi­dade. Poucos meses após os acon­te­ci­mentos, o pro­cu­rador-geral da URSS, N. Tru­bine, ba­se­ando-se nos dados das au­tóp­sias re­a­li­zadas pela me­di­cina legal da Li­tuânia, re­velou que seis das ví­timas ti­nham sido al­ve­jadas com vá­rios tiros nas costas, a partir de pontos di­fe­rentes si­tu­ados num plano ele­vado. Por­tanto, os dis­paros não po­diam ter par­tido dos sol­dados so­vié­ticos, que es­tavam cara a cara com os ma­ni­fes­tantes, mas por trás, a partir de te­lhados cir­cun­dantes e do pró­prio edi­fício da es­tação de te­le­visão, en­tre­tanto já ocu­pado por grupos ar­mados na­ci­o­na­listas.

Esta ex­pli­cação, re­jei­tada pelo go­verno li­tuano, foi no en­tanto con­fir­mada por an­tigos lí­deres dos grupos de re­beldes na­ci­o­na­listas que, em me­mó­rias pu­bli­cadas em livro e em vá­rias en­tre­vistas, re­la­taram como mon­taram as pro­vo­ca­ções ar­madas.

Uma destas fi­guras, Au­drius But­ke­vi­cius, foi cha­mada a prestar de­cla­ra­ções como tes­te­munha no jul­ga­mento de Pe­leckis. No tri­bunal não só de­clarou que a sua or­ga­ni­zação en­viou cerca de 200 ele­mentos para a torre de te­le­visão, como con­firmou que as ope­ra­ções re­a­li­zadas nessa época eram pre­pa­radas com a ajuda de An­drius Eiva, um an­tigo ofi­cial do exér­cito norte-ame­ri­cano, co­la­bo­rador dos ser­viços se­cretos dos EUA, que antes havia trei­nado grupos es­pe­ciais no Afe­ga­nistão.

Além disso, quatro ou­tras tes­te­mu­nhas de­cla­raram ter visto ati­ra­dores dis­parar de te­lhados sobre a mul­tidão, as­se­gu­rando que se tra­tava de civis e não de mi­li­tares.

Por seu turno, o ar­guido Al­girdas Pe­leckis man­teve todas as afir­ma­ções: «Disse e man­tenho que, ana­li­sando o pe­ríodo de in­de­pen­dência da Li­tuânia, não de­víamos riscar a época so­vié­tica». É caso para dizer que mesmo sob ameaça de prisão, a ver­dade his­tó­rica acaba por vir ao de cima.



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