CHAMEM A POLÍCIA!
Nos melindrosos tempos que correm, quando os da «troika» do FMI/BCE/CE se passeiam como pretores medievais por este velho País de quase nove séculos, os actuais poderosos do torrão pátrio esforçam-se notoriamente por «salvar o dia», como diria o Dirty Harry.
Indo ao topo, vemos Soares dos Santos, o segundo «homem mais rico de Portugal» e presidente do Grupo Jerónimo Martins, a juntar-se ao seu parceiro no ranking dos arquimilionários e no comércio a retalho, Belmiro de Azevedo, para, em conjunto, tentarem obrigar os seus «colaboradores» nas suas cadeias de hipermercados («trabalhadores» é designação que perturba estes novos-ricos, pela sua proximidade sinonímica a «operários») a trabalhar pela primeira vez no 1.º de Maio desde que a democracia foi instalada pela Revolução de Abril, há 37 anos.
Pois Soares dos Santos e Belmiro de Azevedo atreveram-se a tentá-lo, invocando «a crise», evidentemente. Perante a oposição de «colaboradores» e sindicatos, Soares e Belmiro fizeram o costume: negaram, como se os milhares de trabalhadores que haviam chantageado fossem um bando de mentirosos.
Quanto a Soares dos Santos, esta chantagem, pelos vistos «imaginada», terá sido o que ele de melhor «imaginou» para responder à preocupação por si próprio manifestada à RTP de que, com tanto desemprego, venha aí uma «convulsão social». Por isso, nada melhor que retirar aos «colaboradores» o Dia do Trabalhador – talvez assim fiquem menos dados à «convulsão».
Também já tivemos «o mais rico de Portugal», o corticeiro Amorim, a mostrar como é que se combate a crise: mal ela estalou lá fora, ele cá dentro tratou logo de despedir 200 dos seus operários corticeiros, não por necessidade... mas por mera «prevenção».
Como se vê, os nossos arquimilionários estão de peito-feito à crise: ora procuram tirar direitos a quem trabalha, ora despedem como medida de prevenção.
No escalão seguinte dos poderosos – os que, a partir das governações, zelam pelos interesses dos primeiros – temos o actual confronto entre o PS/Sócrates e o PSD/Coelho, ambos disputando a possibilidade de, a partir do próximo governo, porem em prática o roubo generalizado de salários, subsídios, reformas, direitos sociais e serviços públicos que, meticulosamente, a «troika do resgate» anda por aí a ultimar, sob o aplauso dos «partidos do arco do poder» e do seu exército de «comentadores». E, cumprindo-se tão vasto roubo, é caso para toda a gente gritar pela polícia.
Mas nada disto é estranho ao velho Portugal: os poderosos do burgo sempre se bandearam pelos invasores, viessem eles das «espanhas» de antanho ou das «europas» de agora.
O que – é da História – desembocará nas ruas e praças do País, inexoravelmente atulhadas da indignação popular.
Nessa altura, o povo já não chamará pela polícia por não aguentar mais roubos, enquanto o governo destes vampiros ordenará à polícia que carregue sobre o povo... para lhe calar os protestos.
Chegará então o tempo em que só os poderosos do País desatarão, de novo, a gritar CHAMEM A POLÍCIA! – e a fugir para os brasis e as europas...