Em Maio, unidos para defender Abril

Ângelo Alves (Membro da Comissão Política do PCP)

«Que todo o povo se una e lute para que o fas­cismo seja li­qui­dado para sempre e sejam ins­tau­radas as li­ber­dades de­mo­crá­ticas! (…) Para que Por­tugal se li­berte dos mo­no­pó­lios e do im­pe­ri­a­lismo es­tran­geiro!» Foram estas al­gumas das pri­meiras pa­la­vras do co­mu­ni­cado da Co­missão Exe­cu­tiva do Co­mité Cen­tral do PCP emi­tido no dia 25 de Abril de 1974 e que na sua parte final afir­mava: «A classe ope­rária, todos os tra­ba­lha­dores, os jo­vens e as mu­lheres, os es­tu­dantes e os in­te­lec­tuais, os sol­dados e os ma­ri­nheiros, os sar­gentos e ofi­ciais an­ti­fas­cistas, todos são cha­mados, nesta hora tão im­por­tante na vida do nosso País, a unir-se e a lutar de­ci­di­da­mente pelas grandes as­pi­ra­ções po­pu­lares.»

No 25 de Abril o povo as­sumiu a con­dução dos des­tinos do País

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Contou-nos o sau­doso ca­ma­rada Jo­a­quim Gomes que, quatro dias de­pois do 25 de Abril, num en­contro entre o PCP e a Junta de Sal­vação Na­ci­onal, o ge­neral Spí­nola de­sa­fiou o PCP ques­ti­o­nando a exi­gência da le­ga­li­zação do Par­tido. Dizia Spí­nola que «no 1.º de Maio é que se vai ver se o Par­tido Co­mu­nista tem a in­fluência e a força que diz ter entre os tra­ba­lha­dores», re­ma­tando que «da forma como de­correr este 1.º de Maio é que se vai ver se o Par­tido Co­mu­nista me­rece ou não a li­ber­dade que re­clama»1.

Estas duas re­fe­rên­cias his­tó­ricas – o co­mu­ni­cado do PCP e o in­so­lente de­safio de Spí­nola – re­metem-nos para os dias de hoje pela com­pre­ensão de vá­rios prin­cí­pios que têm na ac­tu­a­li­dade uma im­por­tância cen­tral.

Desde logo porque nos fazem com­pre­ender que a Re­vo­lução de­mo­crá­tica e na­ci­onal do 25 de Abril não foi um acto iso­lado, foi um pro­cesso em que o povo, em ali­ança com o Mo­vi­mento das Forças Ar­madas, as­sumiu nas suas mãos a con­dução dos des­tinos do seu País e a con­quista e de­fesa dos seus di­reitos e as­pi­ra­ções. Foi, assim, um pro­fundo acto de pa­tri­o­tismo e de exer­cício da so­be­rania po­pular – va­lores e di­reitos que, como a His­tória prova, foram e são partes in­te­grantes da luta eman­ci­pa­dora dos tra­ba­lha­dores e dos povos e in­dis­so­ciá­veis da so­li­da­ri­e­dade in­ter­na­ci­o­na­lista. Ou seja, de­fender hoje a so­be­rania na­ci­onal contra a in­ge­rência ex­terna da troika im­pe­ri­a­lista é de­fender os di­reitos do nosso e de ou­tros povos.

De­pois porque nos mos­tram que o des­fecho da­queles pri­meiros dias, se­manas e anos ia ser di­tado pela ca­pa­ci­dade de or­ga­ni­zação, par­ti­ci­pação, luta e uni­dade dos tra­ba­lha­dores e do povo. E assim foi. O 25 de Abril foi «cons­truído» nas ruas e nas fá­bricas, em duras e tensas ba­ta­lhas. E foi aí, com as massas po­pu­lares em mo­vi­mento e cons­ci­entes do seu real poder, que a cor­re­lação de forças foi de­ter­mi­nada e que o factor sub­jec­tivo da luta se de­sen­volveu. Esta é uma lição im­por­tan­tís­sima para os dias de hoje quando, à ofen­siva anti-so­cial e de sub­missão aos mo­no­pó­lios e ao im­pe­ri­a­lismo, se somam as mais di­versas ma­no­bras para se­mear o medo, o con­for­mismo, o di­vi­si­o­nismo e a podre tese do «afas­ta­mento dos ci­da­dãos da po­lí­tica», ten­tando-se dessa forma im­pedir um maior grau de uni­dade das ca­madas an­ti­mo­no­po­listas e travar a sua to­mada de cons­ci­ência so­cial, po­lí­tica e de classe.

 

Tempos exi­gentes

 

Tal como na­quele tempo, é hoje de cru­cial im­por­tância com­pre­ender que o de­sen­vol­vi­mento do factor sub­jec­tivo da luta é al­can­çado com a luta so­cial de massas e no seio delas, e mais forte será quanto mais os tra­ba­lha­dores e o povo to­marem plena cons­ci­ência do real poder que têm para trans­formar, re­vendo-se por isso nas forças que – como o PCP – de­fendem a sua par­ti­ci­pação efec­tiva numa real rup­tura e mu­dança, ele­mento es­sen­cial para a der­rota da contra-re­vo­lução e para a re­toma do ina­ca­bado pro­cesso re­vo­lu­ci­o­nário de Abril.

Por úl­timo, estes dois apon­ta­mentos his­tó­ricos re­cordam-nos a tese de que 25 de Abril e 1.º de Maio são in­se­pa­rá­veis. A Re­vo­lução de Abril tomou uma opção de classe que está plas­mada na Cons­ti­tuição da Re­pú­blica. Spí­nola não queria esse 25 de Abril e por isso disse o que disse ao PCP, mas teve a res­posta ade­quada nas gran­di­osas ac­ções do 1.º de Maio. Se Abril de­mons­trou que era pos­sível der­rubar o fas­cismo, Maio e tudo o que ele re­pre­senta deu-lhe corpo e força para ca­mi­nhar em frente, der­rotar as obs­curas cons­pi­ra­ções e se fazer Re­vo­lução.

Vi­vemos tempos muito exi­gentes. Os danos, as fe­ridas, a des­truição e as con­sequên­cias de mais de três dé­cadas de re­van­chista contra-re­vo­lução e de pau­la­tina en­trega do País ao grande ca­pital e ao im­pe­ri­a­lismo estão à vista. Mas a His­tória de­monstra-nos que é pos­sível en­frentar o poder dos mo­no­pó­lios e do im­pe­ri­a­lismo e que é no povo que re­side – sempre – a força, a ca­pa­ci­dade e a cri­a­ti­vi­dade para operar pro­fundas mu­danças na vida de um País. Valeu e vale a pena lutar! No pró­ximo do­mingo, todos ao 1.º de Maio! Unidos como os dedos da mão, vamos dar a res­posta ne­ces­sária, para con­ti­nuar Abril!

 

Uma pe­quena his­tória sobre o 1.º de Maio de 1974 in o Mi­li­tante n.º 239, Março/​Abril 1999



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