Comentário

Rapinar, rapinar sempre

Maurício Miguel

Apro­vei­tando as ce­ri­mó­nias dos aten­tados de 2001 contra as «torres gé­meas», em Nova Iorque (EUA), os meios de co­mu­ni­cação so­cial do im­pe­ri­a­lismo vol­taram, uma vez mais, a in­sistir na versão ofi­cial dos acon­te­ci­mentos. Novos dados e di­fe­rentes ver­sões têm vindo a ser co­nhe­cidos, mas a versão ofi­cial não pa­rece poder ser con­tes­tada. Ai de quem ouse co­locar em causa o «acto fun­dador» da dou­trina da «luta contra o ter­ro­rismo»! Não é ques­ti­o­nável impor ao mundo as guerras pre­ven­tivas – Afe­ga­nistão, Iraque, So­mália... – e os ata­ques aos di­reitos li­ber­dades e ga­ran­tias que vão sendo le­vados a cabo nos EUA, na União Eu­ro­peia e em muitos ou­tros países por pressão destes. É para o nosso bem, para «nos de­fender», dizem! Nesta versão mo­derna da In­qui­sição, todo aquele que co­locar em causa a versão ofi­cial é ime­di­a­ta­mente acu­sado de ser um ter­ro­rista, ou de ter li­ga­ções com «or­ga­ni­za­ções sus­peitas». Há fe­liz­mente quem não se re­signe a en­golir pa­tra­nhas, quem ana­lise as coisas pelo que elas são e pelos efeitos prá­ticos que têm.

O ac­tual in­qui­lino da Casa Branca, Ba­rack Obama, segue, com ajustes tác­ticos, a po­lí­tica se­guida por Ge­orge Bush, em nada con­tri­buindo para dis­sipar o ne­vo­eiro que paira sobre esses acon­te­ci­mentos. A co­missão do con­gresso ame­ri­cano en­car­regue de in­ves­tigar o que acon­teceu em 11 de Se­tembro de 2001, afirmou que a CIA tinha «obs­truído» o de­sen­vol­vi­mento das suas in­ves­ti­ga­ções. En­volto numa cam­panha de pro­pa­ganda muito forte que o levou até ao Prémio Nobel da Paz, Obama acen­tuou a mi­li­ta­ri­zação das re­la­ções in­ter­na­ci­o­nais: ame­a­çando o Irão, en­vi­ando mais tropas para o Afe­ga­nistão, en­ce­nando uma re­ti­rada de tropas do Iraque, man­tendo nesse país 50 mil sol­dados, ins­ta­lando mais bases mi­li­tares na Amé­rica La­tina, de­sen­vol­vendo pro­gramas de novas armas, pre­pa­rando-se para as­sinar pro­gramas da «maior ajuda mi­litar de sempre» à Arábia Sau­dita, nova ajuda mi­litar a Is­rael e a ou­tros ali­ados árabes. Estas são al­gumas das con­sequên­cias do 11 de Se­tembro que põem a nu, através dos seus efeitos a sua na­tu­reza.

 
«Ver um crime e não fazer nada, é ser-se cúm­plice»

 
Os EUA contam com a UE como sua aliada numa po­lí­tica de con­cer­tação es­tra­té­gica do eixo tran­sa­tlân­tico. EUA e UE são hoje res­pon­sá­veis di­rectos ou in­di­rectos por muitos crimes e sa­ques em muitas re­giões do mundo. Vale tudo: aqueles que ontem eram amigos para des­truir no Afe­ga­nistão um re­gime pro­gres­sista, como os ta­libãs, são hoje con­si­de­rados os mai­ores «ini­migos» e alvo a abater.

O eixo tran­sa­tlân­tico conta também com uma ONU cada vez mais ins­tru­men­ta­li­zada. Ainda re­cen­te­mente o jornal francês Le Monde re­feria a exis­tência de um re­la­tório da ONU sobre os «crimes sis­te­má­ticos» que podem ser clas­si­fi­cados de «ge­no­cídio» co­me­tidos na Re­pu­blica De­mo­crá­tica do Congo entre 1993 e 2003 pela Frente Pa­trió­tica do Ru­anda, par­tido do ac­tual pre­si­dente desse país, Paul Ka­game. Poucos dias de­pois de al­guma im­prensa ter re­fe­rido a exis­tência deste re­la­tório, o go­verno ru­andês ame­a­çava com a re­ti­rada das suas tropas de mis­sões da ONU caso esse re­la­tório fosse tor­nado pú­blico. Ka­game é mais um dos muitos pro­dutos made in EUA, um velho aliado que o im­pe­ri­a­lismo uti­lizou para a sua es­tra­tégia de do­mi­nação das enormes ri­quezas na­tu­rais do Congo e de toda a re­gião afri­cana dos Grandes Lagos. Os te­le­mó­veis e os com­pu­ta­dores que uti­li­zamos têm com­po­nentes feitos a partir de mi­ne­rais vindos dessa re­gião. Para isso servem os mi­lhões de mortos que contam os con­flitos fi­nan­ci­ados e es­ti­mu­lados a partir do ex­te­rior na re­gião. Não sa­bemos se o re­la­tório será efec­ti­va­mente tor­nado pú­blico e que con­sequên­cias daí ad­virão, não seria a pri­meira vez que os EUA e a UE aban­do­na­riam um aliado, quando ele deixa de ser vá­lido para a sua es­tra­tégia. Nem seria a pri­meira vez que um re­la­tório como este da ONU seria dei­xado na ga­veta.

No Congo, no Afe­ga­nistão, no Ru­anda ou em qual­quer outro lugar, a es­tra­tégia do im­pe­ri­a­lismo é sempre a da ra­pina. Pode ser a «luta contra o ter­ro­rismo», pode ser a in­ter­venção para parar «con­flitos ét­nicos» ou re­li­gi­osos, pode ser o «com­bate à pi­ra­taria» – para o im­pe­ri­a­lismo toda a men­tira é vá­lida.



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