Paternidades

José Casanova

O anunciado roubo de parte do subsídio do Natal aos trabalhadores e aos reformados e pensionistas – na sequência de um sem número de medidas de igual sentido que o Governo PS/Sócrates tem vindo a perpetrar – é bem o exemplo da natureza de classe evidenciada pela política de direita ao longo dos seus longos 34 anos de existência.

Essa natureza de classe - presente em todos os governos dos três partidos pais dessa política – expressa-se ao sabor de um esquema de grande simplicidade: os trabalhadores, o povo e o País são, sempre, o alvo a flagelar; o grande capital é, sempre, o alvo a favorecer.

O anúncio dessas medidas de classe conta, sempre e desde logo, com o aplauso entusiástico dos propagandistas de serviço à política de direita – os quais, como se sabe, ocupam a quase totalidade do espaço de «opinião» dos média dominantes.

Assim aconteceu neste caso do anúncio do roubo do subsídio de Natal: os propagandistas apressaram-se a concluir que sim senhor, essa é a forma mais fácil, expedita e rápida de resolver o problema do défice e de cumprir a ordem da senhora Merkel e dos restantes patrões da União Europeia, ou seja, o roubo é a solução.

Mário Soares, que ocupa lugar destacado nessa acção propagandística, e que alia a essa tarefa a função complementar de defensor maior, em Portugal, do capitalismo (democrático, é claro...), saltou a terreiro em defesa do roubo, como lhe competia, e aproveitou para lembrar (antes que lho lembrassem), que também ele, quando foi primeiro-ministro, roubou parte do subsídio de Natal aos trabalhadores portugueses.

É claro que, assumindo a paternidade do roubo, Soares demonstrou igualmente o conteúdo democrático do acto praticado.

Tratou-se, Soares o diz, de um roubo não apenas democrático mas essencialmente salvador da pátria, de acordo, obviamente, com os conceitos de democracia e de pátria do autor do roubo – que é, por isso mesmo e como estamos fartos de ouvir dizer, o «pai da democracia».

E que é, como estamos fartos de saber e de sofrer, o pai da contra-revolução e da política de direita - paternidade esta inequívoca e abundantemente confirmada pelo ADN do progenitor e da cria.



Mais artigos de: Opinião

O dogma

Não, apesar de o Avante! se publicar a 13 de Maio, em plena visita do Papa a Portugal, este texto não é sobre os dogmas da Igreja católica. É sobre alguns dos dogmas da União Europeia. Diz o dicionário que, além do sentido religioso do termo, um dogma é uma...

A fotografia

Na passada sexta-feira, não vi Francisco Louçã na primeira fila do Parlamento. E eu, que já aqui assinalei o seu estatuto de omnipresente líder do BE, pus-me a pensar o que se teria passado para se ter remetido, assim, a uma discreta segunda linha neste bate boca parlamentar. A ...

«Tolerâncias»

Esta semana, o primeiro-ministro José Sócrates decidiu exibir duas medidas à sua medida. Primeiro, determinou «tolerância de ponto» na Função Pública para os dias 11 (concelho de Lisboa), 13 (em todo o País) e 14 (concelho do Porto) em honra do Papa...

A falsa liberdade de escolha

Sistematicamente, nos discursos do grande capital, especialmente nos sectores sociais e no da saúde em particular, surge a ideia da liberdade de escolha. Associando a ideia de liberdade à de autonomia individual da escolha procuram convencer-nos de que cada cidadão deve poder ter acesso a um serviço de acordo exclusivamente com a sua vontade, independentemente de ser público ou privado.

Uma imensa Vitória!

Bastaria verificar a forma como (não) foram comemorados os 65 da Vitória sobre o nazi-fascismo, para confirmar que o multifacetado aparelho ideológico do imperialismo tem oscilado entre o mais completo silenciamento e as mais indignas tentativas de falsificação da história...