Saber toda a verdade
O negócio dos submarinos está envolto numa densa nebulosa, crescendo os indícios de gestão danosa dos recursos públicos e de grave lesão dos interesses nacionais.
Estão em jogo muitos milhões
Com o assunto a ganhar maior visibilidade depois de ter vindo a público a existência de investigações na Alemanha e em Portugal, apontando para a existência de ilícitos criminais, o PCP defendeu na passada semana no Parlamento que tudo seja cabalmente esclarecido e que se apurem responsabilidades, nomeadamente no plano judicial e no plano político. «O que se exige de todas as autoridades portugueses é uma total colaboração com as investigações em curso. O que se espera é que a Justiça funcione, sem pressões nem ingerências, que investigue tudo o que tiver de investigar, que acuse quem tiver de ser acusado, que julgue quem deva ser julgado e que condene quem deva ser condenado. Doa a quem doer», sublinhou o deputado comunista António Filipe numa declaração política onde expressou a convicção de que «é isso que os portugueses esperam». Em causa está, recorde-se, a falta de transparência que rodeou todo o processo de aquisição dos submarinos, em todos os planos, desde os contratos de aquisição às respectivas contrapartidas, passando pelos mecanismos de financiamento. E o problema não está hoje na importância da compra daquele equipamento militar, sempre passível de discussão, no entender do PCP, que nunca teve nesta matéria uma recusa de princípio mas passou a questionar essa opção a partir do momento em que ficou claro que o recurso ao leasing significaria duplicar os custos dos submarinos. Ora a verdade é que são avultadissímas as somas que estão em jogo, ascendendo, de acordo com a revisão da Lei de Programação Militar de 2003, a mais de mil milhões de euros de encargos directos e a compromissos de centenas de milhões de euros de contrapartidas. Perante valores tão elevados, para a bancada do PCP não pode haver outra conduta que não seja a de «total lisura, transparência e responsabilidade», tanto mais que este é um esforço gigantesco para o erário público que está a ser pago pelos portugueses, os mesmos que vêem os salários congelados, que vêem diminuídas as prestações sociais e que vão ter de pagar mais IRS. Daí que o PCP considere que, para além das investigações com vista a apurar matéria criminal relacionada com este dossier, existem «questões políticas muito sérias» que devem ser tratadas pela Assembleia da República (ver caixa). «O que importa agora é que, com rigor e sentido de responsabilidade, a AR tome medidas para apurar todos os elementos relevantes sobre a compra dos submarinos, sobre as contrapartidas que foram contratualizadas e o respectivo grau de execução, e sobre as medidas concretas a tomar para que todos os compromissos assumidos sejam integralmente cumpridos», sustentou António Filipe, para quem urge pôr fim ao «secretismo e à opacidade», «a bem da transparência e a bem da mais elementar decência na gestão dos recursos públicos». Responder aos porquês Estando em causa importantes questões políticas no negócio de aquisição dos submarinos, o PCP entende que o Parlamento não pode deixar de agir em conformidade e proceder ao apuramento dos factos. Cumpre-lhe, nomeadamente, como fez notar o deputado António Filipe, «obter informações detalhadas e rigorosas sobre todos os aspectos que envolvem os contratos de aquisição» daquele equipamento militar. Importa saber, por exemplo, como se processou a escolha da empresa que os construiu, bem como o conteúdo das cláusulas contratuais assumidas por ambas as partes. Conhecer os mecanismos de financiamento adoptados, identificar quem os concebeu e que «encargos concretos foram assumidos pelo Estado Português e perante quem», constituem outros tantos itens a esclarecer pela AR que, do ponto de vista do PCP, deve igualmente diligenciar no sentido de apurar que «contratos de contrapartidas foram celebrados, quem os negociou, quais os seus beneficiários e que cláusulas foram estabelecidas em caso de incumprimento». A bancada do PCP defende, por outro lado, que deve chegar ao conhecimento da Assembleia qual o companhamento feito por sucessivos Governos do dossier das contrapartidas e quais as medidas que foram tomadas para garantir o seu cumprimento. Por último, para os deputados comunistas, não pode deixar de haver um esclarecimento por parte do Governo sobre o que este pensa fazer para exigir o cumprimento das contrapartidas ou a sua renegociação em termos que não prejudiquem o interesse nacional. Fim ao secretismo O ministro da Defesa Nacional e o presidente da Comissão de Contrapartidas foram ouvidos anteontem na Assembleia da República no âmbito das diligências que a comissão parlamentar de Defesa Nacional tem em curso sobre o negócio dos submarinos. Os trabalhos decorreram à porta fechada depois da recusa do PSD e CDS/PP em aceder ao pedido formalizado na véspera pelo deputado António Filipe para que tivessem carácter público. «A regra deve ser a transparência e nunca o secretismo», salientara o parlamentar do PCP na declaração política por si proferida na semana transacta, onde deixou claro o repúdio da sua bancada por qualquer tentativa de fazer cair «um manto de silêncio» sobre uma questão que envolve tanto dinheiro dos contribuintes.