Toda a Função Pública está em luta

Repúdio geral contra a «mobilidade especial»

Por via da reforma do PRACE, o Governo PS pôs mais de dois mil funcionários públicos na «mobilidade especial», para os despedir. Destes, «revoltados e indignados», mais de duzentos protestaram em Lisboa, dia 13, diante do Ministério das Finanças. Como os professores e os enfermeiros, que têm acções nos próximos dias, comprometeram-se a lutar até à reintegração.

«O Governo está a tratar-nos como se fossemos lixo»

Ao início da tarde de dia 13, chegaram ao Terreiro do Paço duas camionetas com a maior parte dos manifestantes que se concentraram diante do Ministério das Finanças e se juntaram a mais algumas dezenas de trabalhadores e representantes sindicais. Maioritariamente, pertenceram, até agora, ao quadro do Ministério da Agricultura, aquele onde mais funcionários públicos têm passado ao quadro da «mobilidade especial», mas também estiveram trabalhadores da ex-Direcção-Geral de Viação, do IFAP e até de viveiros de trutas, todos especializados e atirados para a inactividade, depois de décadas ao serviço do Estado, agora substituídos por trabalhadores sem qualquer qualificação para o mesmo desempenho.
«Viemos a Lisboa, em nome dos mais de dois mil trabalhadores que estão como nós, para que não se esqueçam do que o Governo nos está a fazer e alertar a comunicação social para a nossa situação, que ninguém fala de nós», afirmou ao Avante!, Maria Teresa Lourenço, há 33 anos ao serviço da Direcção-Regional Norte, na região de Entre Douto e Minho, do Ministério da Agricultura, departamento que foi esvaziado de 63 trabalhadores, por via do Programa de Reforma da Administração Central e da supressão de postos de trabalho públicos.
Da Direcção-Geral de Florestas, outros 200 trabalhadores foram atirados para a mesma situação,
todos em vésperas de fim-de-ano, no dia 30 de Dezembro, «enquanto o primeiro-ministro passava férias em Veneza», recordou da tribuna, a trabalhadora Maria Isabel, lembrando que nem os recibos do vencimento, já cortado, recebem a horas. «Nunca houve Governo que nos tenha desprezado tanto», acrescentou.
Veio com colegas que, como ela, estavam afectos ao Instituto de Apoio aos Agricultores, em Braga. Com o «falso argumento» de que não estavam a trabalhar no serviço de origem, foram «postos em casa, em pouco mais de dois dias», depois de sete anos de formação específica, para se valorizarem e poderem ali trabalhar. Agora, são substituídos por trabalhadores de outros sectores, «quando ainda decorria o período de análise à nossa reclamação».
A situação é de enorme gravidade na unidade de controlo e parcelário daquele departamento, uma vez que, com a nova mão-de-obra sem qualificações ou aptidões estão comprometidos, inclusivamente, programas de ajudas aos agricultores, podendo daí resultar a «devolução de avultadas verbas à União Europeia», devido a incumprimentos de prazos no controlo das produções, como referiu a resolução aprovada na acção.
Estes dois mil trabalhadores são, apenas, «uma pequeníssima percentagem da totalidade dos afectados», salienta-se na resolução, lembrando-se que uma boa parte preferiu aposentação antecipada, mesmo perdendo compensações.

Formação prometida não existe

Quando anunciou a «mobilidade especial», o Governo tinha garantido que os trabalhadores afectados seriam submetidos a formação profissional e, posteriormente, absorvidos em serviços onde faltassem funcionários. «Estamos há quase dois anos nesta situação de ficarmos um mês ao serviço, e entre sete e oito em casa, a receber menos, mas mais do que auferem os que não recorreram. «Interpusemos uma providência cautelar que o evitou», recordou Maria Teresa, que tem feito concursos de candidatura a outros ministérios, mas continua sem garantias de regresso ao trabalho, nem de formação. Os salários, para quem não recorre são reduzidos em um ou dois sextos, conforme fiquem na «mobilidade» mais de dois meses, ou mais de doze, havendo uma terceira fase em que os salários são cortados quase em metade.
«Se não tivéssemos avançado com a providência cautelar auferíamos, agora, apenas 290 euros mensais, como os colegas que não recorreram, tiveram de entregar carros, casas e vivem da ajuda de familiares, quando podem», recordou a mesma funcionária.
À providência, o tribunal deu razão e decretou a reintegração dos queixosos, mas, desde essa data, estão «impedidos, até, de abrir a porta ou de atender telefonemas». «Ficamos sentados a uma mesa, numa sala, a olhar uns para os outros e o Governo ainda diz estar preocupado com a produtividade», revelou uma outra trabalhadora que não se quis identificar.
Como salientou Maria Teresa, mais tarde, da tribuna da concentração de protesto, «não é só o trabalhador a ser afectado mas também todos os agregados familiares».

Situações revoltantes

Em «revoltante» situação de desemprego, há dois anos, com a consequente diminuição de vencimento está também a auxiliar técnica Elvira, 49 anos de idade, 30 deles dedicados à Função Pública que desempenhava funções de grande polivalência. O seu departamento manteve-se, mas as funções que desempenhava não são cumpridas, por falta de funcionários.
As consequências da inactividade «foram desastrosas a todos os níveis, pessoal, familiar e também da saúde», afirmou, salientando que a situação mexeu «com toda a família». Tem filhos a estudar e já não pode dar-lhes o nível de vida que tinham. «O Governo está a tratar-nos como lixo, desprezando a nossa dignidade», afirmou, garantindo que lutará sempre e enquanto puder, pelos seus direitos e dos seus colegas.
No mesmo departamento, nas oficinas de reparação e manutenção de carros e máquinas agrícolas de apoio à produção na região, havia seis trabalhadores, revelou o trabalhador Luís Costa, há 33 anos naquelas oficinas. Agora, estão apenas dois. Os outros quatro foram atirados para «aquela mobilidade». Quem ficou, passou a trabalhar com trabalhadores de empreitadas privadas, alternativa pela qual optou o Governo PS, e que acarreta «acrescidos encargos» ao erário público.
«Os carros, agora, são enviados para reparação, de Braga para oficinas em Mirandela», revelou.
Secção também entregue à ganância dos privados foi a criação de cavalos, em Barcelinhos.
Norberto Gonçalves referiu ao Avante! que era encarregado do viveiro de trutas do Marão, o maior posto de reprodução desta espécie no País. Era o único a desenvolver trabalho respeitante ao regulamento de rios, ao fornecimento de pisciculturas e à garantia do cumprimento de toda a regulamentação respeitante a esta actividade. Todos os trabalhadores especializados passaram à «mobilidade especial» e foram substituídos por funcionários sem formação, notando-se já quebras na qualidade do desempenho e da produção, confirmou o encarregado, salientando que entre os dispensados está um casal. «É uma pena que o Estado destrua um recurso que dá resultados para o País e as nossas vidas», considerou, recordando que aufere, actualmente, quase metade do salário que ganhava antes.
António Simões também subiu à tribuna, de onde alertou para a grave situação social em que se encontram ele, os seus familiares e os colegas que trabalhavam na Direcção-Geral de Viação, desde que passaram à «mobilidade especial» e foi extinta aquela entidade.
Entretanto, prosseguem lutas por toda a Administração Pública contra estas reformas, a avaliação de desempenho, o contrato de trabalho para funções públicas e o novo regime de vínculos, carreiras e remunerações.
Na segunda-feira, cerca de cem trabalhadores da Direcção Regional de Economia do Centro cumpriram uma greve com manifestação pelas ruas de Coimbra, em protesto contra a transferência daqueles serviços, desta cidade para Aveiro.

Todos fazem falta

Reforçando o tom das intervenções de trabalhadores, interveio, no fim da acção, o dirigente do Sindicato dos Trabalhadores da Função Pública do Sul e Açores, Manuel Ramos, que garantiu o apoio da Federação Nacional dos Sindicatos da Função Pública à prossecução da luta pelo direito à dignidade de quem sempre serviu o Estado e é, agora, maltratado pelo executivo de José Sócrates.
O dirigente sindical recordou a constante actividade da FNSFP/CGTP-IN, «sindical e juridicamente, em defesa dos direitos todos os trabalhadores». Ao alertar para a eventualidade de o problema vir a agravar-se, ainda mais, nos próximos anos, Manuel Ramos lembrou que, para isso, basta o Governo prosseguir com a destruição de serviços públicos, e fabrique mapas de pessoal, nesse sentido.
Salientando que todos estes trabalhadores fazem falta ao Estado e às populações mais carenciadas, terminou a intervenção com um forte apelo à continuação da luta e à participação de todos na manifestação nacional da CGTP-IN, agendada para 13 de Março, em Lisboa.
Na resolução aprovada durante a acção e posteriormente entregue a dois adjuntos do secretário de Estado das Finanças é exigido o fim imediato do processo de mobilidade especial; o regresso à actividade de todos os trabalhadores; a continuação da luta através de acções de protesto, a curto prazo, de âmbito regional e nacional, e o envio da resolução aos órgãos de soberania.

Professores preparam cordão humano

A Federação Nacional dos Professores vai realizar, dia 7 de Março, um cordão humano de protesto, em Lisboa, que ligará o Ministério das Educação à residência oficial de José Sócrates, em São Bento, no propósito de isolar, simbolicamente, «os responsáveis pela situação que se vive no ensino, da ministra ao primeiro ministro».
Esta foi uma das acções anunciada na conferência de imprensa de dia 13, onde a Fenprof reafirmou a intenção de prosseguir a luta pela suspensão do actual modelo de avaliação.
Entre 26 deste mês e 27 de Março, a federação entregará um pré-aviso de greve à observação de aulas.
A federação também garantirá uma «grande participação» na Manifestação Nacional da CGTP-IN, de 13 de Março «contra as políticas do Governo», classificadas como a origem de tudo quanto se tem abatido sobre a Educação, a escola pública e os seus trabalhadores».
Entre 20 e 24 de Abril decorrerá uma «semana de consulta» à classe docente.
Lembrando o forte empenho dos professores nas lutas contra as políticas do Ministério da Educação, e reafirmando o combate contra o actual modelo do Estatuto da Carreira Docente, a Fenprof reafirmou que recusará «qualquer acordo que não contemple os objectivos da luta».
No dia 12, em Ponta Delgada, Açores, meia centena de docentes, segundo a Lusa, concentraram-se em protesto contra a burocratização da carreira docente no arquipélago, e estavam previstas acções idênticas para anteontem, na Horta e em Angra do Heroísmo.

Enfermeiros param amanhã

Quatro sindicatos de enfermeiros e a Ordem destes profissionais apelam à participação de toda a classe na greve nacional agendada para amanhã, contra a perda do vínculo de nomeação e a passagem ao contrato de trabalho para funções públicas, contra a precariedade e os contratos individuais de trabalho, entre outras matérias respeitantes à sobrecarga horária e às condições de trabalho agravadas pelo Governo PS.
O Sindicato dos Enfermeiros Portugueses tinha acusado, numa nota de dia 3, o Ministério da Saúde de não cumprir os compromissos assumidos com os sindicatos, relativamente à negociação colectiva.
Segundo o SEP/CGTP-IN, a tutela tinha-se comprometido a apresentar a sua contra-proposta até ao fim de Dezembro, mas não o fez. Nos recibos de Janeiro apareceram, entretanto, discriminados, níveis e sub-níveis de vencimento «ilegais», e a transição de trabalhadores para contratos individuais de trabalho a termo, ao abrigo do Contrato Administrativo de Provimento, sem que os trabalhadores tenham sido notificados, como a Lei obriga.


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