Uma questão de metros

Jorge Cordeiro
Os esforçados reconstrutores da credibilidade perdida do PSD, a começar pela numerosa legião dos que se dedicam à promoção da alternância, navegam entre a frustração e o desconsolo. Pelo que dizem e escrevem, a nova líder fala pouco, não atina com o pensamento, e as propostas que haveriam de fazer a desejada diferença para com o partido no Governo teimam em não ver a luz do dia. Por este andar, confessam, não há jeito de Ferreira Leite e o partido que lidera apresentar-se como «alternativa». Percebe-se a incomodidade dos que sabem residir o problema em bem mais do que problemas de estilo. Como os últimos anos vêm provando o problema está no espaço, no caso na ausência dele, de afirmação de uma política diferente à que PS e Sócrates vem prosseguindo. Pela simples e verificada razão que aquilo que PSD poderia propor está o PS a fazer. Ao que se poderá ainda acrescentar que o está fazendo sem particular desagrado por parte daquele partido e da sua líder. Se dúvidas ainda tivessem resistido após a o desejo manifestado por Ferreira Leite no penúltimo congresso do PSD, quando da tribuna deixou uma clara recomendação para que deixassem o PS governar, elas terão ficado dissipadas com a sua última intervenção na reunião de balanço da sessão legislativa com o seu grupo parlamentar. A clareza com que Ferreira Leite enunciou, a propósito do que deveria ser a conduta parlamentar do seu partido, o objectivo dela ser desenvolvida sem comprometer as condições para poder ser dada continuidade – a expressão é dela – à actual política diz tudo sobre o seu pensamento. Difícil ficará assim a vida dos que, procurando construir à força uma imagem de «alternativa» onde só se identificam semelhanças, se têm que conformar a fazê-lo não na base das políticas mas sim de divergências medidas em função de quilómetros a construir, ou deixar de construir, de auto-estradas, vias rápidas ou ferrovia. Divergências que, apesar de medida em quilómetros, não iludem a proximidade, bem mais da escala do metro, entre as políticas dos que assim criticam e dos que são criticados.


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