A estátua

Henrique Custódio
O congresso do PSD-Madeira, realizado no último fim-de-semana, produziu o arraial do costume à volta de Alberto João Jardim.
Passando por cima de descabelamentos flagrantes - como Jardim a perorar «contra tudo o que é colonialismo» ou o deputado regional Gabriel Drumond, ex-membro confesso da Flama dos atentados bombistas, a propor a «declaração unilateral da independência» se «patriotas» como ele não gostarem da próxima revisão constitucional -, outras afirmações houve, por parte dos mais altos responsáveis nacionais do PSD, que não se distinguiram do delírio local.
Rui Gomes da Silva, actual vice-presidente do grupo parlamentar do PSD, não esteve com meias medidas e declarou Jardim um «paladino da democracia», «paradigma da liberdade» e «grande timoneiro» o que, talvez pela deriva maoista do «grande timoneiro», parece indicar que o homem já não vê necessidade do contraditório nas apreciações ao «paladino da Madeira», como acaloradamente exigia quando, no Governo de Santana Lopes, se armou em censor furioso dos comentários televisivos do correligionário Marcelo Rebelo de Sousa.
Quanto ao presidente do partido, Luís Filipe Menezes, prometeu dar três coisas: «autonomia sem limites» à Madeira, uma «nova Constituição ao País» e «um PSD nacional à moda da Madeira».
Quem parece já não ter limites é o próprio Menezes: duma assentada, promete seccionar o País, o regime democrático e o partido que dirige. O homem é verdadeiramente ilimitado.
É claro que tanto louvor ao chefe desembocou num «voto de congratulação», que irá ser aprovado com fragor pela assembleia regional. Nele, e inevitavelmente, ganham particular relevo os elogios proferidos há dias por Jaime Gama a João Jardim, a quem deixou de apontar como um segundo Bokassa para o considerar, agora, um «político notável» com uma «obra ímpar» na Madeira, deixando perplexos e indignados os próprios correligionários PS madeirenses.
A «obra ímpar» de Jardim ficou bem patente no voto de censura do PCP ao seu governo e apresentado à assembleia regional (mas logo chumbado, evidentemente), onde a par de uma política social e económica com «danos incalculáveis para o interesse público», avulta a existência de 61 mil pessoas (24,9% da população) com «rendimentos miseráveis» abaixo dos 365 euros, de 17 mil reformados com pensões médias de 141 euros ou de 33% de madeirenses à beira da pobreza monetária.
Isto apesar dos rios de dinheiro a afluir continuamente dos cofres do Estado para o caciquismo generalizado da gestão Jardim. Quanto aos ditirambos a este «paradigma da liberdade», só por anedota se podem aplicar ao desavergonhado e ditatorial demagogo que Jardim se habituou a ser, ao longo de 30 anos de impunidade venal.
A rematar, nada melhor que a proposta «urgente» do deputado regional do PND (o partido confidendial de Manuel Monteiro, que assim obteve os seus cinco minutos de fama) para a construção de «uma estátua de João Jardim com 50 metros e fundida em cobre», a colocar na entrada do porto, com «uma escada interior que permita aos visitantes a subida até à altura da cabeça para observar o Funchal através dos olhos do seu amado líder» e ainda «com um mecanismo» que «permita que a estátua acompanhe o movimento do sol», e emita do cimo «um forte silvo que simbolize os imortais dotes oratórios» de Jardim.
No meio de tanto absurdo, escolhemos este na enxurrada: um Jardim de 50 metros a rodar ao sol e a apitar ao porto. Seria tão ridículo como o original, mas com a enorme vantagem de já não aldrabar ninguém.


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