Natal da Precariedade
Com Dezembro, e agora, por decisão e interesse do grande comércio, inaugura-se cada vez mais cedo a época oficial do Natal.
A precariedade é transversal a todos os sectores e camadas etárias
Em miúdo, habituei-me a ouvir os tons de um disco, «Os operários do Natal», que retratava, em música, o contributo dos trabalhadores para o Natal de todos.
Revisitar esse disco transporta-nos para a questão central dos que trabalham e produzem, dos que vendem a sua capacidade física ou intelectual, desempenhando o papel insubstituível na produção, sejam eles o carteiro, a costureira ou o pasteleiro ou tantos outros, operários, técnicos de informática, trabalhadores intelectuais, independentemente de estarem aqui ao lado ou nos longínquos países do oriente, de utilizarem instrumentos de trabalho muito diferentes, de trabalharem isolados ou em linhas de produção.
Mas hoje seria necessário dedicar uma canção aos trabalhadores precários.
Esta realidade, que marca profundamente o mundo do trabalho, inclui os contratados a prazo, à peça, os falsos recibos verdes, a quase generalidade dos trabalhadores das empresas de aluguer de mão de obra, o trabalho clandestino, num total de quase um milhão de trabalhadores, atingindo o seu valor mais elevado de sempre.
A este respeito importará, ainda que brevemente, fazer algumas anotações.
A precariedade é transversal a todos os sectores e camadas etárias. Este tipo de relação laboral deveria responder a exigências necessariamente temporárias de acréscimo de trabalho. Seria assim no turismo, com as suas características sazonais, ou, no sector do comércio, em períodos como o Natal.
Entretanto, os vínculos precários envolvem agora os jovens à procura do primeiro emprego, mas também os menos jovens, vítimas de processos de despedimento, que ocupam postos de trabalho permanentes, sendo regra tanto para operários da construção civil, como para as chamadas profissões liberais, e uma realidade comum na Administração Pública. Afecta em primeiro lugar os com menos formação e qualificação, mas envolve crescentemente licenciados e quadros técnicos de todos os sectores.
A precariedade é contrária ao desenvolvimento das empresas. Um chavão muito usado como solução das soluções para os problemas do país é a formação e a qualificação dos portugueses. Ora não há qualificação que resista ao permanente saltitar de profissão em profissão ou que substitua o processo de aprendizagem que é permitido pela estabilidade num posto de trabalho, em que cada um vai conhecendo as suas tarefas e o processo produtivo.
Nem se pode exigir que alguém que tem sucessivos contratos de um mês, estando portanto na iminência de ser posto a mexer, tenha o mínimo de motivação para novas aprendizagens ou aperfeiçoamentos.
Fica assim posto em causa o combate pela chamada competitividade e produtividade, tão caro às forças que são responsáveis pela precariedade.
A incerteza do amanhã
A precariedade impede o desenvolvimento da vida pessoal. Como é que, perante a incerteza no dia de amanhã, alguém pode decidir constituir família, comprar ou mesmo alugar casa própria ou decidir ter filhos? Que perspectiva pode ter alguém, se, com 40 ou 50 anos, atirado para o desemprego por algum «processo de reestruturação», não tem qualquer outra hipótese que não seja saltar de emprego para emprego mudando de uma máquina de soldar para a caixa de um supermercado, ou para a venda de televisão por cabo de porta em porta?
A precariedade não é um problema dos precários. Há quem queira afastar os trabalhadores precários dos restantes trabalhadores. Isso corresponde a uma concepção de que cada camada se deve valer por si mesma, pondo em contraponto os direitos de uns contra os outros. Nada mais errado. A estratégia do capital, apoiada pelo Governo PS, é fazer nivelar os direitos, designadamente os salariais, dos trabalhadores permanentes pelos dos precários. Não poucas vezes põem a nu os seus objectivos, utilizando expressões mais cruas, como a de que «para quem não quiser assim, estão lá fora os outros à espera». Querendo pressionar direitos e deitar por terra conquistas alcançadas à custa da unidade forjada em muitas lutas, o capital exibe a capacidade de dispor da vida de vastas camadas de trabalhadores, usando para isso o imenso exército de desempregados disponíveis para aceitar piores condições de trabalho, para terem alguma coisa.
O envolvimento dos trabalhadores precários na luta geral dos trabalhadores, a inclusão dos seus objectivos específicos nas reivindicações gerais e os esforços para a sua organização sindical são, assim, indispensáveis para a resolução dos problemas de todos.
A significativa participação de trabalhadores precários na Manifestação de 18 de Outubro é, a este respeito, um excelente sinal.
No quadro da grave ofensiva política, social e ideológica que impende em primeiro lugar sobre a classe operária e os trabalhadores, estas são notas de valorização e de profunda solidariedade com aqueles que, mesmo trabalhando todos os dias, acordam cada dia sem a certeza de continuar a ter trabalho. Milhares de trabalhadores que, como diz a canção, também «fazem a diferença do Natal».
Revisitar esse disco transporta-nos para a questão central dos que trabalham e produzem, dos que vendem a sua capacidade física ou intelectual, desempenhando o papel insubstituível na produção, sejam eles o carteiro, a costureira ou o pasteleiro ou tantos outros, operários, técnicos de informática, trabalhadores intelectuais, independentemente de estarem aqui ao lado ou nos longínquos países do oriente, de utilizarem instrumentos de trabalho muito diferentes, de trabalharem isolados ou em linhas de produção.
Mas hoje seria necessário dedicar uma canção aos trabalhadores precários.
Esta realidade, que marca profundamente o mundo do trabalho, inclui os contratados a prazo, à peça, os falsos recibos verdes, a quase generalidade dos trabalhadores das empresas de aluguer de mão de obra, o trabalho clandestino, num total de quase um milhão de trabalhadores, atingindo o seu valor mais elevado de sempre.
A este respeito importará, ainda que brevemente, fazer algumas anotações.
A precariedade é transversal a todos os sectores e camadas etárias. Este tipo de relação laboral deveria responder a exigências necessariamente temporárias de acréscimo de trabalho. Seria assim no turismo, com as suas características sazonais, ou, no sector do comércio, em períodos como o Natal.
Entretanto, os vínculos precários envolvem agora os jovens à procura do primeiro emprego, mas também os menos jovens, vítimas de processos de despedimento, que ocupam postos de trabalho permanentes, sendo regra tanto para operários da construção civil, como para as chamadas profissões liberais, e uma realidade comum na Administração Pública. Afecta em primeiro lugar os com menos formação e qualificação, mas envolve crescentemente licenciados e quadros técnicos de todos os sectores.
A precariedade é contrária ao desenvolvimento das empresas. Um chavão muito usado como solução das soluções para os problemas do país é a formação e a qualificação dos portugueses. Ora não há qualificação que resista ao permanente saltitar de profissão em profissão ou que substitua o processo de aprendizagem que é permitido pela estabilidade num posto de trabalho, em que cada um vai conhecendo as suas tarefas e o processo produtivo.
Nem se pode exigir que alguém que tem sucessivos contratos de um mês, estando portanto na iminência de ser posto a mexer, tenha o mínimo de motivação para novas aprendizagens ou aperfeiçoamentos.
Fica assim posto em causa o combate pela chamada competitividade e produtividade, tão caro às forças que são responsáveis pela precariedade.
A incerteza do amanhã
A precariedade impede o desenvolvimento da vida pessoal. Como é que, perante a incerteza no dia de amanhã, alguém pode decidir constituir família, comprar ou mesmo alugar casa própria ou decidir ter filhos? Que perspectiva pode ter alguém, se, com 40 ou 50 anos, atirado para o desemprego por algum «processo de reestruturação», não tem qualquer outra hipótese que não seja saltar de emprego para emprego mudando de uma máquina de soldar para a caixa de um supermercado, ou para a venda de televisão por cabo de porta em porta?
A precariedade não é um problema dos precários. Há quem queira afastar os trabalhadores precários dos restantes trabalhadores. Isso corresponde a uma concepção de que cada camada se deve valer por si mesma, pondo em contraponto os direitos de uns contra os outros. Nada mais errado. A estratégia do capital, apoiada pelo Governo PS, é fazer nivelar os direitos, designadamente os salariais, dos trabalhadores permanentes pelos dos precários. Não poucas vezes põem a nu os seus objectivos, utilizando expressões mais cruas, como a de que «para quem não quiser assim, estão lá fora os outros à espera». Querendo pressionar direitos e deitar por terra conquistas alcançadas à custa da unidade forjada em muitas lutas, o capital exibe a capacidade de dispor da vida de vastas camadas de trabalhadores, usando para isso o imenso exército de desempregados disponíveis para aceitar piores condições de trabalho, para terem alguma coisa.
O envolvimento dos trabalhadores precários na luta geral dos trabalhadores, a inclusão dos seus objectivos específicos nas reivindicações gerais e os esforços para a sua organização sindical são, assim, indispensáveis para a resolução dos problemas de todos.
A significativa participação de trabalhadores precários na Manifestação de 18 de Outubro é, a este respeito, um excelente sinal.
No quadro da grave ofensiva política, social e ideológica que impende em primeiro lugar sobre a classe operária e os trabalhadores, estas são notas de valorização e de profunda solidariedade com aqueles que, mesmo trabalhando todos os dias, acordam cada dia sem a certeza de continuar a ter trabalho. Milhares de trabalhadores que, como diz a canção, também «fazem a diferença do Natal».