Comentário

Tambores de guerra

Pedro Guerreiro
Com a conclusão do acordo entre as forças que estão no cerne da integração capitalista na Europa quanto à forma de imposição do conteúdo da rejeitada «constituição europeia», reapresentando-o sob a forma de «tratado reformador», e apesar deste ainda não estar assinado ou, sequer, ratificado, sucedem-se o anúncio de objectivos e de medidas que traduzem, antecipadamente, o que significaria a concretização desta inaceitável manipulação e proposta de tratado.
É o que tem acontecido no quadro da preparação da presidência francesa do Conselho da União Europeia, que tem lugar no segundo semestre de 2008. Uma das «prioridades absolutas» definidas pelo governo francês é o avanço na denominada «Europa da Defesa», apontada como tão importante para a «integração europeia» como o é a moeda única, o Euro.
Proclamando eufemisticamente o objectivo do «crescimento de uma consciência europeia» que dê resposta à pergunta: «Queremos defender os nossos valores com armas?» - vão sendo avançadas uma panóplia de «ideias» para a promoção da ingerência e do intervencionismo militar, incluindo a necessidade do aprofundamento e actualização da dita «estratégia europeia de segurança» à medida das ambições das grandes potências da UE.
Significativamente, foi na intervenção proferida no Congresso dos EUA que Sarkozy explicitou de forma mais genuína os seus intentos para a UE.
Depois de afirmar o seu alinhamento, a sua parceria estratégica e os seus compromissos com os EUA, nomeadamente no Afeganistão (isto num momento em que os EUA se defrontam com um crescente isolamento internacional e com o fracasso da sua estratégia agressiva, nomeadamente no Iraque), Sarkozy centrou-se nas relações entre os EUA e a UE e no objectivo de «relançar a grande construção das suas capacidades militares».
A «ambição» que Sarkozy propõe aos seus parceiros parte de uma «simples constatação»: «há mais crises que capacidades para as enfrentar. A NATO não pode estar em todo o lado. A União Europeia deve ter capacidade de agir nos Balcãs ou no Congo ou, amanhã, no Sudão ou no Chade.» Por isso valoriza a «constituição europeia», perdão, o «mini-tratado», perdão, o «tratado simplificado», perdão, o «tratado reformador»,... Ufa, com quantas peles já vestiram o lobo!
Assegurando os seus tutores norte-americanos de que a sua abordagem «não é ideológica», mas «puramente pragmática», Sarkozy persuade que «todos os nossos aliados, a começar pelos Estados Unidos, com os quais partilhamos habitualmente os mesmos interesses e os mesmos adversários, têm o interesse estratégico de que a Europa se afirme como um parceiro credível e forte quanto à segurança».
Por isso, depois de asseverar a «sua dedicação à NATO», da qual a França «é membro fundador e já um dos seus primeiros financiadores», Sarkozy predispõe-se a que o seu país «tome o seu lugar pleno na renovação dos instrumentos e dos meios de acção» da NATO e «faça evoluir, neste contexto, a sua relação com a Aliança paralelamente com a evolução e reforço da Europa da Defesa», prevenindo que quanto mais a «Europa da Defesa» for concretizada, mais a França retomará o seu pleno lugar na NATO.
E para o caso de a ideia estar a ser mal entendida pelos «burros» (democratas) e pelos «elefantes» (republicanos), Sarkozy explica: a «União Europeia e a Aliança devem andar de mãos dadas» em nome de «uma Europa da Defesa credível e forte no seio de uma Aliança renovada».

Não ao imperialismo!
Não ao tratado!


Um dos objectivos do tratado «reformador», que concebe a personalidade jurídica da UE, é institucionalizar e dar um novo ímpeto à sua militarização, como pilar europeu da NATO. Basta lê-lo!
As grandes potências, assegurando o domínio e a instrumentalização da UE, ambicionam alcançar uma nova relação com os EUA, com base numa parceria mais equilibrada, com divisão de tarefas e partilha de regiões de influência e de domínio do mundo no quadro das relações interimperialistas. Aí está a demonstrá-lo, num quadro de rivalidades e de concertação, a Bósnia-Herzegovina, o Kosovo, o Líbano, o Chade e a República Centro-Africana, o Afeganistão, o Iraque, etc.
É para esta política, contrária aos interesses do povo português e do País e que contraria a Constituição da República Portuguesa, que o Governo PS quer arrastar Portugal.
É sobre estas importantes questões para o nosso futuro colectivo que se exige a realização de um amplo, plural e esclarecedor debate nacional e de uma consulta popular que dê ao povo português a possibilidade de se pronunciar sobre o tratado através de um referendo vinculativo convocado especialmente para o efeito.


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