Orçamento do Estado para 2008

Agravar as injustiças e as desigualdades

A Assembleia da República conclui hoje, em plenário, o debate e votação na generalidade do Orçamento do Estado para 2008. À crítica consistente e frontal que se lhe conhece desde a primeira hora, alicerçada na convicção de que as linhas de orientação e prioridades vertidas no OE não servem os trabalhadores nem o País, o PCP soma agora o correspondente e inequívoco voto contra do seu Grupo Parlamentar.

O Go­verno des­va­lo­riza o com­bate ao de­sem­prego e des­preza as ques­tões so­ciais

As razões dessa avaliação profundamente negativa ao documento foram expostas com profundidade no decurso do debate pelos deputados comunistas. Delas falou, em particular, o Secretário Geral do PCP, Jerónimo de Sousa, dirigindo-se ao Primeiro-Ministro na fase inicial do debate, para concluir que com este OE o Governo «acentua as desigualdades sociais e agrava o atraso relativo do País face à União Europeia».
Também o deputado comunista Honório Novo, em intervenção proferida no primeiro dia do debate, pôs em evidência o facto de o OE ser um «mero instrumento de continuidade ao serviço das políticas de direita e dos grandes interesses económicos e financeiros».
Confirmados na proposta de lei de Orçamento do Estado para 2008 OE são assim os traços mais negativos da política de um Governo que continua a pautar o essencial das suas opções pela obediência cega à redução do défice orçamental, «transformado
num fim em si mesmo que compromete o desenvolvimento e o crescimento económico, que desvaloriza o combate ao desemprego, a defesa do poder de compra e a qualidade de vida dos trabalhadores e que despreza as questões sociais num país cada vez mais desigual e com uma parte crescente da população no limiar da pobreza».
Foi o que disse aos jornalistas o líder parlamentar comunista Bernardino Soares, falando na passada semana do OE em conferência de imprensa onde procedeu a uma avaliação pormenorizada dos seus aspectos nucleares.

Ob­sessão pelo dé­fice

Enfatizada pelo PCP como transversal ao OE é a questão do défice (ver caixa), onde o Governo obtém resultados, sim, mas à custa da imposição de violentos sacrifícios aos trabalhadores e aos portugueses mais desfavorecidos, obsessão orçamental que está na origem de profundas e muito negativas consequências económicas e sociais para o País.
É o caso do crescimento do PIB, cuja previsão (2,2%), não obstante ser optimista face às opções em que o Governo a sustenta, «vai voltar a ser insuficiente e incapaz de promover qualquer aproximação à média de desenvolvimento comunitária».

Fla­gelo do de­sem­prego

Outra área encarada com muita preocupação pelos comunistas é a que se refere ao desemprego, que não pára de crescer, o que só confirma, na sua perspectiva, que o «Governo não só parece ter desistido do combate ao desemprego como abandonou de vez a promessa eleitoral de criar 150 000 novos postos de trabalho».
Convém referir, a este propósito, que o Executivo previra no Programa de Estabilidade e Crescimento (aprovado há menos de um ano) taxas de desemprego de 7,5%, em 2007 e de 7,2% em 2008. Contra as suas próprias previsões, agora, no OE para 2008, revê em alta os dois valores, corrigindo-os para 7,8% em 2007 e para 7,6% em 2008.

In­ves­ti­mento aquém das ne­ces­si­dades

Alvo de severas críticas da bancada comunista é também a política fiscal (ver caixa), onde se mantêm as injustiças, tal como são verberadas, noutro plano, as opções governativas no capítulo do investimento.
«Com os dados disponíveis no OE não é possível concluir da existência de qualquer aumento do investimento público em 2008 porque foram excluídas a REFER e as Estradas de Portugal», observou o presidente da formação comunista, muito crítico ainda quanto ao facto de o Governo não ter disponibilizado qualquer dado sobre o investimento previsto para estas empresas em 2008.
Certo é que o Plano de Investimentos e Desenvolvimento da Administração Central (PIDDAC) para o próximo ano revela uma inaceitável desorçamentação, com a retirada daquelas duas importantes empresas das contas públicas, «operação cuja conformidade legal está ainda por apurar» mas que, independentemente desse facto, na opinião do PCP, confirma a «utilização de mais um artifício para reduzir o défice».

Ali­enar pa­tri­mónio

Outra matéria onde os comunistas não poupam críticas ao Governo é a que se refere às privatizações. Acusam-no, nomeadamente, de insistir na delapidação da património público, inscrevendo mais cerca de 900 milhões de euros de novas privatizações a efectuar durante o ano de 2008. Ainda que o Governo se recuse a dizer quais as empresas que tenciona privatizar, para o PCP é evidente que o propósito é alienar empresas determinantes na prestação de serviços públicos essenciais, passando para as mãos de grupos privados empresas altamente rentáveis, muitas delas em sectores e áreas onde a inexistência de concorrência levará à constituição de monopólios ao serviço de interesses privados.



Quanto aos sa­lá­rios, as no­tí­cias não são me­lhores. As verbas afectas a re­mu­ne­ra­ções certas e per­ma­nentes dos tra­ba­lha­dores da ad­mi­nis­tração pú­blica con­ti­nuam a so­frer cortes bru­tais. Em 2006 es­tavam pre­vistos 11 869 mi­lhões de euros e, para 2008, o Go­verno prevê apenas 10 888 mi­lhões de euros, o que sig­ni­fica uma re­dução de 991 mi­lhões de euros. Um corte que, na pers­pec­tiva do Grupo co­mu­nista, só pode tra­duzir os mi­lhares de tra­ba­lha­dores que o Go­verno pre­tende des­pedir ou co­locar na si­tu­ação de mo­bi­li­dade es­pe­cial.
Si­mul­ta­ne­a­mente, a verba ins­crita no Or­ça­mento para pes­soal con­tra­tado a termo passa de 200 para 240 mi­lhões de euros, um acrés­cimo de 20%, que é in­ter­pre­tado pelos de­pu­tados co­mu­nistas como um in­di­cador de que o Go­verno tem em vista au­mentar a pre­ca­ri­e­dade do tra­balho na ad­mi­nis­tração pú­blica.
A me­recer a com­pleta dis­cor­dância do PCP está também a pro­posta de au­mentos sa­la­riais para os fun­ci­o­ná­rios pú­blicos em 2,1 por cento, o mesmo valor que o OE atribui à in­flação es­pe­rada para 2008, o que não ga­rante ne­nhuma re­cu­pe­ração do poder de com­para dos tra­ba­lha­dores.

Má gestão dos re­cursos

Re­ve­lador da ver­da­deira face do que con­si­dera ser a «ina­cei­tável po­lí­tica de gestão de re­cursos e meios da ad­mi­nis­tração pú­blica deste Go­verno», se­gundo o PCP, é ainda o facto de o OE in­cluir um total de 1 200 mi­lhões de euros em aqui­si­ções ge­né­ricas de ser­viços (190 mi­lhões em es­tudos, pro­jectos e con­sul­to­rias; 92 mi­lhões em as­sis­tência téc­nica ex­terna; 535 mi­lhões em ou­tros tra­ba­lhos es­pe­ci­a­li­zados; 383 mi­lhões em ou­tros ser­viços). Re­curso ao ex­te­rior que re­pre­senta, entre 2006 e 2008, uma su­bida de mais de 13 por cento das verbas para esse efeito, en­quanto, no mesmo pe­ríodo, as re­mu­ne­ra­ções certas e per­ma­nentes descem quase 10 por cento.


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