Assassinado outro militante no Paraná

Sem-terra reclamam justiça

O ataque de um grupo armado contra um acampamento de trabalhadores rurais brasileiros causou mais uma vítima. A reforma agrária e a luta contra as sementes geneticamente modificadas estão no centro do conflito.

Valmir Mota foi baleado à queima-roupa com dois tiros no peito

Valmir Mota de Oliveira, 34 anos, militante da organização Via Campesina em Santa Tereza do Oeste, no estado do Paraná, é a mais recente vítima das milícias a soldo dos agrários e das multinacionais, dispostos a usar todos os meios ao seu alcance para travar a democratização do solo no Brasil e imporem o uso de sementes trangénicas nos campos de cultivo.
Na manhã do passado dia 21, um grupo de cerca de 150 trabalhadores rurais sem-terra reocupou um campo de experiências agrícolas da multinacional Syngenta Seeds. Depois de uma invasão tão pacífica quanto imparável, um grupo de 40 homens chamados pelos seguranças da Syngenta respondeu violentamente à iniciativa dos assalariados rurais.
Valmir Mota foi baleado à queima-roupa com dois tiros no peito. Outros cinco trabalhadores, Gentil Viera, Jonas de Queiroz, Domingos Barretos, Hudson Cardin e Isabel de Souza, ficaram gravemente feridos e tiveram que ser transportados para os hospitais da região.
Isabel de Souza esteve em coma durante alguns dias, mas informações divulgadas pelo Movimentos dos Sem-Terra (MST) indicam que a activista superou o estado crítico em que se encontrava fruto dos múltiplos ferimentos infligidos pelos atacantes e já não corre perigo de vida.

Mercenários à solta

A Syngenta alija responsabilidades no sucedido pelo facto do ataque ter sido perpetrado por homens não identificados como funcionários da empresa de segurança contratada pela multinacional, mas as estruturas representativas dos sem-terra afirmam que sociedades como a NF são apenas uma fachada dos latifundiários organizados um pouco por todo o país.
A Sociedade Rural da Região Oeste (SRO), o Movimento dos Produtores Rurais (MPR), a União Democrática Ruralista (UDR) ou o Primeiro Comando Rural (PCR), formam grupos de paramilitares que actuam à margem da lei e na quase completa impunidade, dizem os sem-terra.
Expulsões violentas, ataques de dia e de noite contra acampamentos, ameaças de morte e execuções sumárias são cada vez mais recorrentes nas regiões rurais do Brasil.
Os sem-terra acrescentam que uma das responsáveis da NF foi presa este mês pelas autoridades federais na sequência de uma operação de busca à empresa, da qual resultou a apreensão de diversas armas e munições ilegais. O proprietário da NF encontra-se fugido à justiça.

Historial de violência

O MST esclarece que ainda recentemente funcionários afectos à Syngenta entraram no acampamento vizinho, chamado «Olga Benário», disparando vários tiros como forma de intimidação. O falecido Valmir Mota, Celso Ribeiro e Célia Lourenço, outros dois militantes do MST do mesmo acampamento, foram por diversas vezes ameaçados de morte por seguranças da multinacional, continuam os sem-terra.
Este não é no entanto caso único no estado do Paraná. Em 2006, a luta pela reforma agrária cobrou a vida a 76 pessoas, e entre 1994 e 2002, 16 trabalhadores rurais foram assassinados, 31 foram alvo de atentados, 47 receberam ameaças de morte, 7 foram torturados e mais de 300 foram feridos nos conflitos com os latifundiários absentistas.
A acontecimentos como o ocorrido no passado dia 21, juntam-se massacres como o de Eldorado dos Carajás ou Felisburgo, por isso o MST exige justiça e punição para os executores e mandantes dos crimes.

«Agromilhões»

A disputa entre os trabalhadores rurais e a Syngenta Seeds tem um longo historial. O campo que a empresa utiliza para efectuar experiências na área da modificação genética de sementes havia sido ocupado pelos assalariados rurais em Março de 2006, mas após 16 meses de resistência, as cerca de 70 famílias mudaram-se para o vizinho acampamento de «Olga Benário», isto apesar dos 127 hectares em disputa terem sido expropriados, em Novembro de 2006, por decreto do governador do Paraná, decisão que a Syngenta tem conseguido travar com inúmeras diligências nos tribunais.
O objectivo da expropriação é a substituição das actuais pesquisas por um centro de reprodução de sementes destinadas à agricultura familiar e à reforma agrária.
Mas a expropriação da terra não é a única disposição que a Syngenta insiste em não cumprir em nome dos «agromilhões», denuncia o MST. O ano passado, a companhia efectuou experiências com sementes transgénicas na área que circunda o Parque Nacional do Iguaçu, desrespeitando a Lei da Biossegurança que determina uma distância de dez quilómetros para as áreas protegidas.
A Syngenta chegou a ser multada em cerca de um milhão de reais pelas autoridades, mas não só não pagou a coima como continuou a levar por diante projectos que colocam seriamente em causa a biodiversidade local.


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