Escalada anticomunista
Jornalistas, universitários, advogados e directores de escola são alguns dos grupos profissionais que estão obrigados, desde dia 15, a fazer uma profissão de fé anticomunista ou a pedir perdão pelo seu passado.
Nova lei exige certificados de «inocência» a 700 mil polacos
A lei da «lustração» (purificação), que acaba de entrar em vigor na Polónia, alargou a um universo estimado de 700 mil cidadãos a obrigação de entregar declarações sobre o seu passado político e suas convicções ideológicas.
Este requisito já era exigido aos deputados, ministros, altos funcionários e magistrados por força de um diploma de 1997.
Agora, todos aqueles cuja data de nascimento é anterior a Agosto de 1972 (isto é, maiores de idade na altura da derrota do regime socialista, em 1990), e exerçam as profissões abrangidas (cerca de meia centena), devem revelar os pormenores da sua eventual colaboração com os órgãos de segurança do país.
Nesse sentido, dispõem de um prazo de dois meses para entregar a declaração ao inquisitório Instituto da Memória que a confrontará com os arquivos da polícia (SB) da antiga República Popular da Polónia e divulgará os resultados na Internet.
Quem se recusar a tal humilhação ou prestar falsas informações ficará impedido de exercer a sua profissão durante dez anos.
Hipocritamente, a lei promete «perdão» aos que confessarem e renegarem o seu passado «colaboracionista», embora os estigmatizados fiquem com o seu futuro pessoal e profissional irremediavelmente comprometido.
Ajuste de contas
Apesar de a Polónia se debater com gravíssimos problemas de natureza social e económica, (é o país com a taxa de desemprego mais elevada da União Europeia e regista uma emigração maciça), a «descomunização» da sociedade tornou-se a principal prioridade política desde que os gémeos Kaczynski chegaram ao poder.
O presidente Lech e o primeiro-ministro, seu irmão Jaroslaw, insistem na urgência de ajustar contas com o passado, procurando e afastando da vida pública aqueles que trabalharam com o estado socialista, cuja ideologia caracterizam como «da chusma para a chusma».
Sedentos de vingança, os Kaczynski são críticos tenazes da transição negociada do poder (cujas condições, agora letra morta, foram acordadas no final da década de 80 entre o Partido Operário Unificado Polaco e o movimento Solidariedade). O clima de histeria colectiva contra «o perigo comunista» tem permitido aos implacáveis irmãos efectuar as purgas à medida das suas conveniências políticas, servindo de cobertura ideal para atacar os mais elementares direitos democráticos e acentuar a deriva autoritária. «A rede [comunista] existe e é mais forte do que pensávamos», garantiu recentemente o primeiro-ministro Jaroslaw Kaczynski.
Lamentavelmente, a versão polaca da caça às bruxas conta com o apoio activo da generalidade dos meios de comunicação públicos e privados, boa parte dos quais é controlada pela igreja católica.
Todavia, algumas vozes têm-se levantado contra a aberrante lei e apelam ao seu boicote.
O principal centro de contestação está reunido em torno do jornal Wyboreza, órgão criado por antigos dissidentes comunistas, que, como relata a agência France Press (15.03), tem denunciado a lei e apelado ao veto do tribunal constitucional (TC).
Em sua defesa, colocou-se o procurador Janusz Kochanowski, que considera a lei inconstitucional. O TC deverá pronunciar-se no início de Maio.
UE lamenta mas não condena
A Comissão Europeia «lamenta profundamente» a nova lei polaca que exige certificados sobre o passado dos cidadãos, mas não pode considerá-la «discriminatória».
Como explicou, dia 16, a porta-voz do executivo comunitário, Cristina Arigho, as disposições do referido diploma não figuram entre os motivos de discriminação reconhecidos pela correspondente directiva europeia, a qual apenas contempla aspectos como a idade, deficiência, orientação sexual e crenças religiosas. A legislação comunitária «não cobre as convicções políticas», disse a porta-voz, frisando que tal assunto «ultrapassa as nossas competências».
De resto, o «silêncio» da Comissão tem sido a regra em relação a outras discriminações ideológicas que continuam a vigorar em vários estados-membros.
Depois da queda do muro de Berlim, e a absorção da RDA pela RFA, muitos milhares de funcionários do Estado, professores universitários, pessoal diplomático, entre outros, foram simplesmente expulsos pelo governo alemão. Até Dezembro passado, muitos cidadãos alemães, acusados de terem colaborado com os órgãos de segurança (Stasi), tinham o acesso vedado aos quadros da função pública. Esta interdição mantém-se para os cargos de ministro, deputado, juiz e de dirigente desportivo.
Na Estónia, os candidatos a altos cargos do Estado eram obrigados, até ao ano 2000, a declarar sob juramento não terem colaborado com o KGB (órgãos de segurança da URSS) ou a reconhecer publicamente a sua «culpa».
A Bulgária acaba de aprovar uma lei que visa apurar o passado de 28 grupos profissionais, entre os quais estão os políticos e os jornalistas, enquanto que a Roménia exige uma declaração de honra aos funcionários públicos, sancionando os que prestam falsas informações. Entretanto, o parlamento nacional prepara-se para aprovar uma lei mais severa.
Na Checoslováquia, desde 1991 que os antigos colaboradores da polícia estão impedidos de ingressar na administração pública.
Nesta matéria, a única excepção a leste parece ser a da Hungria, onde o actual primeiro- ministro, Peter Medgyessy, foi eleito para o cargo apesar das revelações sobre o seu passado de agente dos serviços secretos.
Este requisito já era exigido aos deputados, ministros, altos funcionários e magistrados por força de um diploma de 1997.
Agora, todos aqueles cuja data de nascimento é anterior a Agosto de 1972 (isto é, maiores de idade na altura da derrota do regime socialista, em 1990), e exerçam as profissões abrangidas (cerca de meia centena), devem revelar os pormenores da sua eventual colaboração com os órgãos de segurança do país.
Nesse sentido, dispõem de um prazo de dois meses para entregar a declaração ao inquisitório Instituto da Memória que a confrontará com os arquivos da polícia (SB) da antiga República Popular da Polónia e divulgará os resultados na Internet.
Quem se recusar a tal humilhação ou prestar falsas informações ficará impedido de exercer a sua profissão durante dez anos.
Hipocritamente, a lei promete «perdão» aos que confessarem e renegarem o seu passado «colaboracionista», embora os estigmatizados fiquem com o seu futuro pessoal e profissional irremediavelmente comprometido.
Ajuste de contas
Apesar de a Polónia se debater com gravíssimos problemas de natureza social e económica, (é o país com a taxa de desemprego mais elevada da União Europeia e regista uma emigração maciça), a «descomunização» da sociedade tornou-se a principal prioridade política desde que os gémeos Kaczynski chegaram ao poder.
O presidente Lech e o primeiro-ministro, seu irmão Jaroslaw, insistem na urgência de ajustar contas com o passado, procurando e afastando da vida pública aqueles que trabalharam com o estado socialista, cuja ideologia caracterizam como «da chusma para a chusma».
Sedentos de vingança, os Kaczynski são críticos tenazes da transição negociada do poder (cujas condições, agora letra morta, foram acordadas no final da década de 80 entre o Partido Operário Unificado Polaco e o movimento Solidariedade). O clima de histeria colectiva contra «o perigo comunista» tem permitido aos implacáveis irmãos efectuar as purgas à medida das suas conveniências políticas, servindo de cobertura ideal para atacar os mais elementares direitos democráticos e acentuar a deriva autoritária. «A rede [comunista] existe e é mais forte do que pensávamos», garantiu recentemente o primeiro-ministro Jaroslaw Kaczynski.
Lamentavelmente, a versão polaca da caça às bruxas conta com o apoio activo da generalidade dos meios de comunicação públicos e privados, boa parte dos quais é controlada pela igreja católica.
Todavia, algumas vozes têm-se levantado contra a aberrante lei e apelam ao seu boicote.
O principal centro de contestação está reunido em torno do jornal Wyboreza, órgão criado por antigos dissidentes comunistas, que, como relata a agência France Press (15.03), tem denunciado a lei e apelado ao veto do tribunal constitucional (TC).
Em sua defesa, colocou-se o procurador Janusz Kochanowski, que considera a lei inconstitucional. O TC deverá pronunciar-se no início de Maio.
UE lamenta mas não condena
A Comissão Europeia «lamenta profundamente» a nova lei polaca que exige certificados sobre o passado dos cidadãos, mas não pode considerá-la «discriminatória».
Como explicou, dia 16, a porta-voz do executivo comunitário, Cristina Arigho, as disposições do referido diploma não figuram entre os motivos de discriminação reconhecidos pela correspondente directiva europeia, a qual apenas contempla aspectos como a idade, deficiência, orientação sexual e crenças religiosas. A legislação comunitária «não cobre as convicções políticas», disse a porta-voz, frisando que tal assunto «ultrapassa as nossas competências».
De resto, o «silêncio» da Comissão tem sido a regra em relação a outras discriminações ideológicas que continuam a vigorar em vários estados-membros.
Depois da queda do muro de Berlim, e a absorção da RDA pela RFA, muitos milhares de funcionários do Estado, professores universitários, pessoal diplomático, entre outros, foram simplesmente expulsos pelo governo alemão. Até Dezembro passado, muitos cidadãos alemães, acusados de terem colaborado com os órgãos de segurança (Stasi), tinham o acesso vedado aos quadros da função pública. Esta interdição mantém-se para os cargos de ministro, deputado, juiz e de dirigente desportivo.
Na Estónia, os candidatos a altos cargos do Estado eram obrigados, até ao ano 2000, a declarar sob juramento não terem colaborado com o KGB (órgãos de segurança da URSS) ou a reconhecer publicamente a sua «culpa».
A Bulgária acaba de aprovar uma lei que visa apurar o passado de 28 grupos profissionais, entre os quais estão os políticos e os jornalistas, enquanto que a Roménia exige uma declaração de honra aos funcionários públicos, sancionando os que prestam falsas informações. Entretanto, o parlamento nacional prepara-se para aprovar uma lei mais severa.
Na Checoslováquia, desde 1991 que os antigos colaboradores da polícia estão impedidos de ingressar na administração pública.
Nesta matéria, a única excepção a leste parece ser a da Hungria, onde o actual primeiro- ministro, Peter Medgyessy, foi eleito para o cargo apesar das revelações sobre o seu passado de agente dos serviços secretos.