Mandamentos
Quem persiste em construir presépios ou se lembra de quando os fez e usava a imaginação para arquitectar um mundo onde cabiam montes e vales de musgo frescamente colhido nas pedras dos arrabaldes da cidade ou logo ali no campo, lagos de espelho e céus de papel de seda azul, devidamente «estrelados» com a «prata» dos maços de tabaco, vaquinhas de barro modeladas a preceito ou compradas na capelista, mais os magos de camelo – Baltazar, Gaspar, Melchior – há-de recordar-se da legenda que encimava o estábulo onde sorria um menino Jesus nas palhinhas. Rezava assim: «Glória a Deus nas alturas e paz na Terra aos homens de boa vontade».
Tirando-lhe o misticismo, a mensagem de paz continua a dizer-nos a todos algo de fundamental. Mas, como em tudo o que a realidade desmente, a mensagem já não leva o comum dos mortais a acreditar muito quer isto vá lá com boas palavras. Embora não haja bicho-careto que não afirme a pés juntos que o que pede para o mundo seja paz, o certo é que deve estar a pensar sobretudo nas necessidades mais próximas e prementes e, já agora, que a paz reine por estes lados e que a guerra fique longe, mas bem ao alcance das notícias televisivas. Quando, nos estupidificantes programas de Natal que nos mostram nas TVs, com os doentinhos a aplaudirem as vedetas de sempre, ou com as senhoras a mostrarem sonhos, azevias e filhós sobre a toalha branca das mesas, com Sócrates a desfiar sucessos que ninguém viu e os bispos a vociferarem contra a hipótese de um SIM no referendo do aborto, a gente pensa na maré de hipocrisia que vem cobrindo tudo e degradando as mensagens mais importantes que a humanidade dedica a si própria.
Não há paz, quando presidentes e primeiros ministros suavizam as vozes mas se submetem aos ditames do imperialismo que decreta a guerra nas terras dos outros e envia tropas para prosseguir a agressão. Não há paz quando os sacerdotes declaram guerra às mulheres e às crianças a fim de beneficiarem uma ideia de vida e não a vida ela própria, nascida e vinda a lume neste mundo carregado de incertezas, de misérias e de opressões.
Todas as grandes religiões deixaram para o futuro dos povos que as engendraram, regras e preceitos que, mais do que glorificar deuses, fixaram verdadeiras constituições para a vida concreta. Porém, «Não matarás», cedo se tornou um mandamento obsoleto. Se fores infiel, subversivo, comunista ou, de algum modo, um dos que não se verga à exploração, bem podes morrer já. De morte matada. Com a bênção de quem manda.
Tirando-lhe o misticismo, a mensagem de paz continua a dizer-nos a todos algo de fundamental. Mas, como em tudo o que a realidade desmente, a mensagem já não leva o comum dos mortais a acreditar muito quer isto vá lá com boas palavras. Embora não haja bicho-careto que não afirme a pés juntos que o que pede para o mundo seja paz, o certo é que deve estar a pensar sobretudo nas necessidades mais próximas e prementes e, já agora, que a paz reine por estes lados e que a guerra fique longe, mas bem ao alcance das notícias televisivas. Quando, nos estupidificantes programas de Natal que nos mostram nas TVs, com os doentinhos a aplaudirem as vedetas de sempre, ou com as senhoras a mostrarem sonhos, azevias e filhós sobre a toalha branca das mesas, com Sócrates a desfiar sucessos que ninguém viu e os bispos a vociferarem contra a hipótese de um SIM no referendo do aborto, a gente pensa na maré de hipocrisia que vem cobrindo tudo e degradando as mensagens mais importantes que a humanidade dedica a si própria.
Não há paz, quando presidentes e primeiros ministros suavizam as vozes mas se submetem aos ditames do imperialismo que decreta a guerra nas terras dos outros e envia tropas para prosseguir a agressão. Não há paz quando os sacerdotes declaram guerra às mulheres e às crianças a fim de beneficiarem uma ideia de vida e não a vida ela própria, nascida e vinda a lume neste mundo carregado de incertezas, de misérias e de opressões.
Todas as grandes religiões deixaram para o futuro dos povos que as engendraram, regras e preceitos que, mais do que glorificar deuses, fixaram verdadeiras constituições para a vida concreta. Porém, «Não matarás», cedo se tornou um mandamento obsoleto. Se fores infiel, subversivo, comunista ou, de algum modo, um dos que não se verga à exploração, bem podes morrer já. De morte matada. Com a bênção de quem manda.