A concorrência

Leandro Martins
Uma das ideias feitas que há muito o capital tenta impingir – como se a sua natural crença não fosse a concentração monopolista – é a de que a concorrência dá saúde e faz crescer. Qualquer papagueador das teses liberais – nem é preciso recorrer ao termo neoliberal que parece querer passar um atestado de novidade ao capitalismo mais agressivo e à solta – nos dirá que a concorrência faz baixar os preços, aumentar o consumo, acrescentar desenvolvimento e riqueza nos bolsos de todos. E mesmo o cidadão comum, em cujos ouvidos e olhos entram toneladas de ideologia avulso, aceitará como boa a ideia de que a «estatização» é má para a economia, de que as privatizações são a receita milagrosa que mete tudo nos eixos. Serviços públicos? O que é isso?, perguntará o menos avisado, com tendência para o esquecimento de que quase tudo o que estrutura a vida da sociedade pode e deve ser considerado serviço público e ficar sob o controlo do Estado, que é, como quem diz, em democracia verdadeira, sob o controlo do cidadão que contribui e vota.
Mas depressa o esquecimento se desvanece quando o cidadão é atingido no seu bolso ou, como quem diz, nos seus direitos. E antes que venha a pagar uma taxa a uma multinacional pelo ar que respira – por enquanto fica pela «ecotaxa» de que nem dá conta –, a gente vai avisando: a concorrência não baixou um único preço e, por mais que a Alta Autoridade que a tutela, faça mascaradas de inquéritos, a gente paga o mesmo em todas as gasolineiras; por mais que o Governo propagandeie as virtudes dos privados, sabe-se quem paga a diferença, através dos impostos que cobram aos trabalhadores, das ajudas aos privados para a destruição dos serviços públicos – sejam eles universidades ou hospitais.
Agora a grande novidade é a chamada «liberalização eléctrica». De repente, a poucos dias do fim de Agosto, anuncia-se que a EDP vai passar a ser apenas «mais uma» das empresas a distribuir – a vender – electricidade em Portugal. Após um escuro processo de desmantelamento da empresa, o mercado abre-se aos privados, nacionais e estrangeiros – é o caso da Iberdrola, para onde se passou um ministro que usou a pasta para preparar o terreno à sua carreira de lacaio bem pago do capitalismo multinacional.
Mas eis que os privados que se anunciam – por exemplo as espanholas Iberdrola, Union Fenosa, Viesgo e Sodesa – torcem o nariz e mostram prudência, É que, dizem elas, os preços são baixos de mais, por cá, para que os negócios lhes interessem. Vem aí a liberdade de pagar a electricidade mais cara!


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