A AMEAÇA NUCLEAR

Jorge Cadima

O Ministro da Defesa britânico « pede para que sejam re-escritas as Convenções de Genebra

Os tambores de guerra fazem-se ouvir de novo. Os cânticos entoados são semelhantes aos que se faziam ouvir há pouco mais de três anos: uma nação do Médio Oriente (detentora de grandes recursos energéticos) constitui uma “grande ameaça” e quer “desenvolver armas nucleares”. Nem mesmo o facto de as acusações contra o Iraque se terem revelado uma monumental vigarice faz corar de vergonha os fautores duma nova aventura militar do imperialismo, agora contra o Irão. Mas vejamos o que, com bastante menos clamor mediático, vai sendo escrito por estes dias nalguma imprensa norte-americana.

O jornal diário Los Angeles Times de 6.4.06 publicou um artigo com o título: «A Administração Bush revela planos para um novo complexo de armas nucleares». E em subtítulo, lê-se: «Os planos do governo irão modernizar o complexo de laboratórios e fábricas da Nação, bem como produzir novas bombas». A “Nação” são os Estados Unidos, e não o Irão. Os planos incluem «um novo programa de bombas nucleares conhecido como “ogivas de substituição fiáveis”, que teve início no ano passado. Tendo inicialmente sido descrito como um esforço para actualizar armamento existente e torná-lo mais fiável, foi alargado e abrange agora o potencial para a concepção de novas bombas».

O conceituado jornalista Seymour Hersh publicou na revista The New Yorker (17.4.06) um artigo de título «Os planos para o Irão». Conhecido por possuir fontes importantes no seio das estruturas do poder dos EUA, Hersh escreve: «Um dos planos [...] apresentado à Casa Branca pelo Pentágono este Inverno, previa a utilização de armas nucleares tácticas bunker-busters, tal como as B61-11, contra instalações nucleares subterrâneas». Afinal, quem está a considerar a utilização de armas nucleares são os dirigentes político-militares dos Estados Unidos. Não é difícil imaginar os terríveis efeitos da utilização de armas nucleares, e ainda por cima contra centrais de produção de energia nuclear. Seymour Hersh escreve que são os próprios militares norte-americanos que estão assustados com o facto de a sua proposta estar a ser seriamente considerada aos mais altos níveis de decisão em Washington: «A atenção dada à opção nuclear criou sérias preocupações nos gabinetes dos Chefes do Estado Maior General [...] e alguns oficiais já falaram em demitir-se. No final deste Inverno, os Chefes do Estado Maior General procuraram retirar a opção nuclear dos planos de guerra para o Irão – mas sem êxito. [...] A questão poderá dentro em breve alcançar um ponto decisivo [...] porque os Chefes de Estado Maior General concordaram em entregar ao Presidente Bush uma recomendação formal declarando oporem-se veementemente à consideração da opção nuclear contra o Irão». Talvez estejam aqui razões adicionais para o súbito coro de generais na reserva norte-americanos que têm vindo a público exigir a demissão o Ministro da Defesa dos EUA, Donald Rumsfeld (New York Times, 14.4.06).

Entretanto, do lado de cá do Atlântico, o Ministro da Defesa britânico «pede para que sejam re-escritas as Convenções de Genebra», como nos informa o jornal The Guardian (4.4.06). Escreve o jornal: «[o Ministro da Defesa] John Reid exigiu ontem alterações de fundo ao Direito Internacional para libertar os soldados britânicos das limitações impostas pelas Convenções de Genebra e tornar mais fácil ao Ocidente lançar acções militares contra outros Estados. No seu discurso, o Ministro da Defesa abordou três questões chave: o tratamento de prisioneiros, a possibilidade de lançar acções pre-emptivas e a possibilidade de intervir para travar uma crise humanitária. Em todas estas áreas, considerou que o Reino Unido e o Ocidente estão manietados pelas actuais, e desadequadas, leis».

Não são precisas mais palavras para se perceber que o imperialismo em crise, cada vez mais militarista, agressivo, anti-democrático e anti-social, é a verdadeira ameaça dos nossos tempos.


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