Para relançar Abril

Albano Nunes (Membro da Comissão Política do PCP)
Para quantos se revêem nas realizações, valores e ideais de Abril a sua evocação, mesmo se acompanhada de algum travo de amargura por esperanças incumpridas, é sobretudo afirmação de memória, celebração festiva, renovado e confiante compromisso de luta.

Há um partido que faz toda a diferença e esse partido é o PCP

Vivemos tempos marcados por regressões que ninguém, nem mesmo os protagonistas mais esclarecidos da nossa revolução libertadora, podiam sequer imaginar. A situação em Portugal é tal, tão violenta a ofensiva contra conquistas e direitos alcançados por décadas de dura luta, tão difícil o dia a dia de quem vive do seu trabalho, tão escandaloso o favorecimento do grande capital, tão profundas as injustiças e desigualdades sociais, que muitos portugueses, incluindo activos participantes de grandes batalhas da revolução e inúmeras lutas populares, sob o peso de uma ofensiva ideológica violentíssima, vacilam por vezes quanto à importância da organização e à decisiva força da sua luta.
Na verdade «não foi para isto que fizemos o 25 de Abril». A contra revolução avançou muito e a situação que hoje temos está em contradição flagrante com os valores e ideais de Abril e o conceito de democracia – política, económica, social e cultural, num quadro de independência nacional – que o PCP defende e que a Constituição Portuguesa de 1976 consagra em aspectos essenciais.
Regressou o domínio do grande capital e com ele a ofensiva contra os direitos dos trabalhadores, a intensificação da exploração, a submissão nacional ao imperialismo e, de modo crescente, o ataque à própria democracia política. O grande capital é insaciável e, se tiver espaço, não recua perante nenhum crime na corrida ao máximo lucro. Que a taxa do desemprego seja a maior desde o 25 de Abril, que a pobreza aumente a olhos vistos, que a liquidação das funções sociais do Estado esteja a acelerar os processos de desertificação de vastas regiões do País, nada disso lhe tira o sono.
O que importa é que os seus lucros cresçam, como de facto estão a crescer em escala sem precedentes. E para recuperar por inteiro o poder de que a revolução o desapossara, aspira já à construção do seu próprio Estado, liberal, centralista, antidemocrático. Para isso conta com o activo concurso do Governo PS de Sócrates. Depois de se ter aliado às forças da reacção para inverter o processo revolucionário e após mais de trinta anos de alternância/aliança com o PSD e o CDS para a realização de políticas de direita, o PS opta deliberadamente por fazer aquilo que, por falta de base de apoio, a própria direita não teria condições para fazer.

O povo português não irá por aí!

Sim, não foi para isto que o 25 de Abril foi feito. Isso é tão evidente que as forças de direita e extrema-direita procuram cinicamente explorar a desilusão e mesmo o desespero de sectores mais atingidos pelas injustiças sociais para pôr em causa o próprio 25 de Abril e abrir caminho a políticas de «autoridade» e a «salvadores» que todos sabemos onde levariam se por absurdo triunfassem.
Desenganem-se porém conspiradores e profetas da desgraça. O povo português não irá por aí. O seu caminho é defender Abril e, sobretudo junto da juventude e fazendo confiança na sua inteligência e generosidade, situá-lo no seu tempo histórico, nas suas inesquecíveis realizações, nos seus generosos e fraternos ideais de emancipação social e humana.
É esclarecer o que realmente foi a violência do fascismo e a valentia da resistência. É recordar a prolongada e duríssima luta de classes travada em Portugal pelo destino das conquistas revolucionárias. É mostrar que o rumo da alternativa de situa na ruptura com mais de trinta anos de políticas de direita e com o do relançamento dos ideais de Abril. É dar firme combate no plano político e ideológico a essa mistificação mortal para a democracia de que «os partidos são todos iguais». É demonstrar que há um partido que, pela sua acção antes e depois do 25 de Abril, faz a diferença e que esse partido é o PCP. Pela sua posição de classe. Pelo seu projecto de socialismo. Pelo seu incomparável percurso de fidelidade e luta em defesa dos interesses dos trabalhadores, do povo e do País. Pela sua consequente posição internacionalista. Pelo seu papel ímpar na luta pelo derrube do fascismo e em todo o processo da revolução portuguesa. Pela sua coerência e política de princípios.
Para inverter o desastroso rumo do País e relançar Abril é necessário e urgente tornar este Partido ainda mais forte.


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