Que esperança?

José Casanova
Na cobertura feita à cerimónia de formalização da candidatura de Manuel Alegre – só comparável, no espaço e no tom encomiástico que lhe dedica, ao que dedicou a idêntica cerimónia de Cavaco Silva – o jornal de Belmiro de Azevedo, a dada altura, dá a palavra ao «mandatário para a juventude» da dita candidatura. O moço, um jovem músico, explicou as razões, aliás poucas e breves, por que estava ali.
É óbvio - mas sublinhemo-lo desde já para evitar confusões - que, com este comentário, não se pretende, minimamente, contestar o direito de cada um a apoiar a candidatura que muito bem entender e dela ser mandatário se for caso disso, como neste caso é. O que aqui se faz é, tão-somente, exercendo um direito inalienável, comentar a origem e o conteúdo das razões invocadas.
Disse o moço, em resumo, que «muitos jovens», como ele, «não se revêem nos partidos e nos políticos» e que, sendo aquela uma candidatura caracterizada pela sua «independência», por isso transportadora de «algo de novo», era, «uma candidatura de alternativa e de esperança». É claro que, dizendo isto, o jovem músico mais não faz do que repetir o que por aí se diz em matéria de ataque a partidos e a políticos (ataque generalizante, como se percebe que convém aos seus promotores) e o que ouviu dizer, sobre essa matéria e outras, ao candidato que apoia. E não tenho dúvidas de que, dizendo o que diz, o faz cheio de boas intenções. Por isso lhe sugiro, cordialmente, que coloque a si próprio algumas interrogações: 1) - como é que, não se revendo nos partidos, opta pelo apoio à candidatura de um dos mais antigos dirigentes partidários nacionais?; 2) – como é que, não se revendo nos políticos, opta pelo apoio a um político de carreira, com décadas de assento na Assembleia da República na qual cumpre, neste exacto momento, em nome do seu partido, o PS, o lugar de vice-presidente?; 3) – que medida utiliza o candidato para avaliar a «independência» da sua candidatura? 4) – que conceito de novo permite classificar como «algo de novo» uma prática que tem pelo menos trinta anos de idade?; 5) – que «alternativa» é a candidatura que apoia: uma alternativa de facto à política que Alegre tem vindo a apoiar ao longo de trinta anos?, ou a política de alternância de facto que o mesmo Alegre tem ajudado a fazer passar por alternativa nesse mesmo período?; 6) – e, assim sendo – e mais importante do que tudo - que «esperança» transporta a candidatura que apoia?


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