Do «novo centro» à «velha direita»
Pediram ao povo pelo menos mais quinze anos de paciência e sacrifícios
No dia 3 de Outubro, as principais figuras políticas do capitalismo na Alemanha e os chefes da igreja mais rica do mundo celebraram pela décima quinta vez a anexação da República Democrática Alemã. A transmissão directa por um grande número de canais televisivos de tão reaccionário cerimonial e a atmosfera anticomunista que o envolveu, davam a sensação de se estar a assistir ao antigo 10 de Junho, o «dia da raça», no Terreiro do Paço com os altos dignitários civis, militares e religiosos do fascismo a proclamarem a indivisibilidade do império colonial. Sobre as vítimas de outras etnias ou religiões, queimadas vivas por grupos neonazis na euforia da «unificação» em Solingen, Möll, Lübeck, Hoyerswerda... ou como o angolano António Amadeu assassinadas a pontapés na presença passiva da polícia, não se ouviu uma única palavra nem se viu uma só imagem.
Mesmo assim, os cânticos de louvor à liquidação do primeiro Estado socialista alemão, entoados em Potsdam, estavam cheios de dissonâncias. O presidente da República, Horst Köhler, um democrata-cristão ex-funcionário do FMI, afirmou descaradamente não ser possível repor o nível de vida «prometido» no momento da «unificação» e que era «necessário dizer a verdade às pessoas». Dois sociais-democratas, os presidentes do Parlamento e do Conselho Federal, pediram ao povo pelo menos mais quinze anos de paciência e sacrifícios. É visível o receio dos «unificadores» de que se repitam os acontecimentos da campanha eleitoral de 1998, em que a população no Leste, ao lembrar-se das promessas não cumpridas das «paisagens florescentes» perdeu de tal maneira a paciência que Helmut Kohl teve de fugir face a indignação popular.
Mas, decorridos apenas alguns meses sobre a vitória do SPD, os eleitores pensavam estar a ver o filme errado quando Schröder começou repetir a mesma ladainha da «modernização» e das «reformas» do anterior chanceler democrata-cristão. As mentiras do neoliberalismo, de que a diminuição dos salários, o prolongamento do horário de trabalho, as privatizações e a liquidação dos direitos e conquistas sociais conduziriam à criação de mais emprego e à dinamização económica foram desmentidas pelos cinco milhões de desempregados, pela destruição de grande parte da produção industrial e pelo aumento galopante da miséria. Só entre 2004 e 2005, o número de crianças a viverem da assistência social passou de um milhão e cem mil para um milhão e setecentas mil. Hoje, quando os trabalhadores ouvem o governo falar em «reformas» ou em «modernização» já sabem que vão ser assaltados.
As grandes manifestações de protesto das segundas-feiras contra as medidas Hartz IV e a agenda 2010 de Schröder, realizadas no Verão do ano passado, e as derrotas simultâneas infligidas nas últimas eleições ao Governo SPD/Verdes e à chamada «oposição» conservadora e liberal expressam com grande clareza o repúdio popular contra o processo de devastação social, política, económica e cultural que a social-democracia e a democracia-cristã têm vindo a executar conjuntamente. Face ao desmascaramento pelos eleitores da fraude da alternância, o SPD prepara-se para oficializar numa «grande coligação», a «união de facto» que desde há muito já existe entre a social-democracia e a direita mais reaccionária. Está a ficar cada vez mais claro que as retóricas do «novo centro», inventadas por Schröder e Blair, e em Portugal papagueadas por Guterres e Sócrates não passam de um manto de nevoeiro, destinado a encobrir o embarque da social-democracia no comboio da «velha direita».
Mesmo assim, os cânticos de louvor à liquidação do primeiro Estado socialista alemão, entoados em Potsdam, estavam cheios de dissonâncias. O presidente da República, Horst Köhler, um democrata-cristão ex-funcionário do FMI, afirmou descaradamente não ser possível repor o nível de vida «prometido» no momento da «unificação» e que era «necessário dizer a verdade às pessoas». Dois sociais-democratas, os presidentes do Parlamento e do Conselho Federal, pediram ao povo pelo menos mais quinze anos de paciência e sacrifícios. É visível o receio dos «unificadores» de que se repitam os acontecimentos da campanha eleitoral de 1998, em que a população no Leste, ao lembrar-se das promessas não cumpridas das «paisagens florescentes» perdeu de tal maneira a paciência que Helmut Kohl teve de fugir face a indignação popular.
Mas, decorridos apenas alguns meses sobre a vitória do SPD, os eleitores pensavam estar a ver o filme errado quando Schröder começou repetir a mesma ladainha da «modernização» e das «reformas» do anterior chanceler democrata-cristão. As mentiras do neoliberalismo, de que a diminuição dos salários, o prolongamento do horário de trabalho, as privatizações e a liquidação dos direitos e conquistas sociais conduziriam à criação de mais emprego e à dinamização económica foram desmentidas pelos cinco milhões de desempregados, pela destruição de grande parte da produção industrial e pelo aumento galopante da miséria. Só entre 2004 e 2005, o número de crianças a viverem da assistência social passou de um milhão e cem mil para um milhão e setecentas mil. Hoje, quando os trabalhadores ouvem o governo falar em «reformas» ou em «modernização» já sabem que vão ser assaltados.
As grandes manifestações de protesto das segundas-feiras contra as medidas Hartz IV e a agenda 2010 de Schröder, realizadas no Verão do ano passado, e as derrotas simultâneas infligidas nas últimas eleições ao Governo SPD/Verdes e à chamada «oposição» conservadora e liberal expressam com grande clareza o repúdio popular contra o processo de devastação social, política, económica e cultural que a social-democracia e a democracia-cristã têm vindo a executar conjuntamente. Face ao desmascaramento pelos eleitores da fraude da alternância, o SPD prepara-se para oficializar numa «grande coligação», a «união de facto» que desde há muito já existe entre a social-democracia e a direita mais reaccionária. Está a ficar cada vez mais claro que as retóricas do «novo centro», inventadas por Schröder e Blair, e em Portugal papagueadas por Guterres e Sócrates não passam de um manto de nevoeiro, destinado a encobrir o embarque da social-democracia no comboio da «velha direita».