Em conversa no café
Na esplanada o Sol ria contente na luz da manhã lisboeta. O homem sentado a ler foi interrompido por uma sombra sobre o livro:
- Posso sentar-me à sua mesa? É que me desperta curiosidade. Só o vejo por aqui nas manhãs de domingo...
- Hoje estou de folga. Fiquei satisfeito por poder vir gozar o eclipse do Sol desta manhã, observando as mudanças de luz na cidade.
- É pintor? Vejo-o sempre com uma pilha de livros...
- Sou funcionário de uma Junta de Freguesia. E requisito livros na biblioteca da Junta, como qualquer habitante.
- Para uma manhã de folga traz leitura maçuda: «Apologia de Sócrates», o filósofo da Grécia antiga, «Discursos» de Saint Just, um herói da Revolução francesa, «Prometeu Agrilhoado», a tragédia clássica de Ésquilo...Deve ter alguma linha condutora entre estas obras.
- Eu digo. Ontem ao jantar, a propósito das autárquicas, os meus filhos e a minha mulher, sabendo da minha folga, desafiaram-me a preparar o almoço de hoje e, durante a refeição, falarmos de figuras famosas que não pudessem ser acusadas de populismo. Já deixei o almoço preparado e estava a tentar fazer a ligação entre estas figuras que considero heróis do pensamento. Eu vejo sempre o pensamento como um incêndio não circunscrito...
- Falando de eleições, vai votar?
- Voto sempre. Embora ache que não é a única, nem a mais importante arma de mudança, penso que continua a ser essencial expressar opinião pelo voto.
- Não me venha com essa de que o voto é soberano...
Com a manipulação informativa que por aí vai, com os vendedores de promessas a quem as pagará por alto preço, com a desilusão que se segue...
- Mas repare: os resultados eleitorais são também indicador importante de análises políticas, sociais, culturais. E há os que se decidem a outro sentido de voto quando verificam que compraram promessas com irremediável defeito de origem.
É certo que muitos deles poderão nas próximas eleições ficar pela abstenção. Mas eu confio nos actuantes, aqueles que preferem factos a promessas. Sou desses. Gosto de quem cumpre os projectos em que votei. Confio em gente competente no que se propõe realizar. Gente que não encobre interesses, honesta, que trabalha todo o tempo, e não vem ter connosco só em campanhas eleitorais.
- Isso soa-me a um slogan conhecido. Trabalho, honestidade, competência... Posso perguntar-lhe, em quem vai votar?
- Eu nunca fiz segredo que voto CDU, sem nunca me ter arrependido.
- Pois eu ainda me lembro dos palavrões que chamei a mim mesmo depois das últimas eleições.. Mas diga-me: que brincadeira é essa de ter entre os seus livros as «Citações do Américo Thomaz»?
- Olhe, veio-me a propósito da lucidez em algumas escolhas eleitorais... Disse ele num dos seus discursos presidenciais que ficaram famosos pelo disparate: «A minha dificuldade reside somente na dificuldade de compreensão para o que me não é possível compreender. Eu explico...».
Como vê, dá pano para mangas. E agora...
- Viva...a República! - gritaram os dois, alegres, despedindo-se.
- Posso sentar-me à sua mesa? É que me desperta curiosidade. Só o vejo por aqui nas manhãs de domingo...
- Hoje estou de folga. Fiquei satisfeito por poder vir gozar o eclipse do Sol desta manhã, observando as mudanças de luz na cidade.
- É pintor? Vejo-o sempre com uma pilha de livros...
- Sou funcionário de uma Junta de Freguesia. E requisito livros na biblioteca da Junta, como qualquer habitante.
- Para uma manhã de folga traz leitura maçuda: «Apologia de Sócrates», o filósofo da Grécia antiga, «Discursos» de Saint Just, um herói da Revolução francesa, «Prometeu Agrilhoado», a tragédia clássica de Ésquilo...Deve ter alguma linha condutora entre estas obras.
- Eu digo. Ontem ao jantar, a propósito das autárquicas, os meus filhos e a minha mulher, sabendo da minha folga, desafiaram-me a preparar o almoço de hoje e, durante a refeição, falarmos de figuras famosas que não pudessem ser acusadas de populismo. Já deixei o almoço preparado e estava a tentar fazer a ligação entre estas figuras que considero heróis do pensamento. Eu vejo sempre o pensamento como um incêndio não circunscrito...
- Falando de eleições, vai votar?
- Voto sempre. Embora ache que não é a única, nem a mais importante arma de mudança, penso que continua a ser essencial expressar opinião pelo voto.
- Não me venha com essa de que o voto é soberano...
Com a manipulação informativa que por aí vai, com os vendedores de promessas a quem as pagará por alto preço, com a desilusão que se segue...
- Mas repare: os resultados eleitorais são também indicador importante de análises políticas, sociais, culturais. E há os que se decidem a outro sentido de voto quando verificam que compraram promessas com irremediável defeito de origem.
É certo que muitos deles poderão nas próximas eleições ficar pela abstenção. Mas eu confio nos actuantes, aqueles que preferem factos a promessas. Sou desses. Gosto de quem cumpre os projectos em que votei. Confio em gente competente no que se propõe realizar. Gente que não encobre interesses, honesta, que trabalha todo o tempo, e não vem ter connosco só em campanhas eleitorais.
- Isso soa-me a um slogan conhecido. Trabalho, honestidade, competência... Posso perguntar-lhe, em quem vai votar?
- Eu nunca fiz segredo que voto CDU, sem nunca me ter arrependido.
- Pois eu ainda me lembro dos palavrões que chamei a mim mesmo depois das últimas eleições.. Mas diga-me: que brincadeira é essa de ter entre os seus livros as «Citações do Américo Thomaz»?
- Olhe, veio-me a propósito da lucidez em algumas escolhas eleitorais... Disse ele num dos seus discursos presidenciais que ficaram famosos pelo disparate: «A minha dificuldade reside somente na dificuldade de compreensão para o que me não é possível compreender. Eu explico...».
Como vê, dá pano para mangas. E agora...
- Viva...a República! - gritaram os dois, alegres, despedindo-se.